Depender da ajuda do governo (ou seja, do dinheiro dos franceses) para tentar socorrer o mercado automotivo, que não consegue sair do buraco, é algo sintomático de um setor que vive uma fase complicada. A França não é a única nessa situação na Europa, mas tem um trunfo nas mãos: o leasing social. Ainda assim, isso mais parece um curativo em uma ferida aberta do que uma solução de verdade.
Com um quarto do volume perdido, o mercado automotivo francês está em terreno instável. Mas será que já chegaram ao fundo do poço ou ainda estão afundando? É como no mercado financeiro: às vezes, uma longa sequência de quedas faz parecer que a recuperação está próxima, quando na verdade ainda tem chão pela frente.
Muita gente não acredita em uma virada tão cedo para o setor
No ano passado, o CEO da Mercedes, Ola Källenius, já dizia que não via chances de retomada antes de 2026 — talvez só em 2027. E os números mais recentes da marca confirmam essa leitura: queda de 9% no segundo trimestre de 2025, mesmo com a empresa alegando que os estoques foram impactados por questões ligadas às tarifas alfandegárias.
Na França, a situação é parecida com a do restante da Europa: a tendência ainda é de queda. E ela preocupa. Luc Chatel, presidente da Plataforma Automotiva (PFA), chegou a dizer que “a crise que enfrentamos hoje é muito mais complexa e perigosa, porque pode colocar em risco a própria existência dessa indústria. O setor automotivo pode passar pelo mesmo que outras indústrias viveram no passado”.
O problema é o carro elétrico mesmo?

Para Luc Chatel, o culpado está claro: “A União Europeia decidiu que só havia uma solução, o carro elétrico, mas poucos motoristas realmente aderiram. E agora, estão perdidos. O sistema ficou absurdamente complicado. Os bônus mudaram 17 vezes em cinco anos! É quase meia-noite para a indústria automotiva. É preciso agir rápido”, disse durante o encontro Rencontres du Pneu et de l’Innovation, segundo o Journal du Pneu.
O carro elétrico virou o centro das tensões
Não só entre entidades e associações do setor automotivo, mas também entre os próprios executivos. Porsche, BMW, Stellantis — não faltam exemplos recentes de montadoras que já não sabem se devem seguir adiante com certos projetos 100% elétricos. O caso mais emblemático talvez seja o retorno do Fiat 500 a combustão ao lado da versão elétrica, que simplesmente parou de vender.
Mas há também estudos que apontam o papel das próprias montadoras na disparada dos preços dos carros novos desde 2021. E, nesse cenário, não dá pra colocar toda a culpa na regulação europeia.
Apostar tudo no leasing social é um erro?
Para tentar frear a queda nas vendas e dar novo fôlego aos elétricos em mercados como o francês (mesmo que, em 2025, os números europeus tenham sido mais positivos), um novo discurso tem ganhado força: confiar no leasing social. Mas essa é uma estratégia arriscada e claramente de curto prazo.
O leasing social se parece muito com um modelo de economia controlada, em que o próprio Estado assume o papel de impulsionar as vendas. E não apenas com incentivos fiscais para “facilitar” o acesso, mas com financiamento direto.

O valor pode chegar a mais de R$ 42 mil por veículo em 2025, enquanto no ano passado era de cerca de R$ 78 mil. O leasing social pode, sim, ajudar a impulsionar as vendas a partir de setembro, já que as montadoras estão prontas. Renault e Stellantis, por exemplo, já se posicionaram publicamente sobre o tema.
Mas o que isso realmente representa?
Colocar 50 mil carros elétricos novos nas ruas é um ganho, claro. Mas ainda parece pouco diante do cenário: são 50 mil carros em um mercado que movimenta 1,6 milhão de unidades. Não é com leasing social que o setor automotivo francês vai dar a volta por cima.
Ainda assim, o leasing social tem um ponto positivo: ele coloca mais carros elétricos em circulação, que futuramente vão abastecer o mercado de usados quando os contratos de leasing chegarem ao fim. E hoje, o mercado de seminovos é o principal canal de compra para os motoristas franceses.
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