Durante anos, a China foi vista como a fábrica do mundo. No entanto, enquanto montava milhões de produtos para o Ocidente, outro tipo de revolução de longo prazo estava se formando no país: a dos engenheiros STEM, ou seja, especialistas em ciência, tecnologia, engenharia e matemática.
Hoje, seu investimento em educação científica e tecnológica deu frutos. A China forma mais de 3,5 milhões de graduados nessas áreas a cada ano, quatro vezes mais que os EUA. E entre eles surge uma nova geração: os engenheiros de IA que estão revolucionando a indústria global.
A origem do milagre educacional
O ponto de inflexão ocorreu na era pós-Mao. Após a morte de Mao Zedong, no final dos anos 1970, foi impulsionada uma profunda reforma nacional sob o lema das quatro modernizações, uma das quais foi restabelecer a educação com forte foco em ciência e tecnologia. Em 1988, Deng deixou claro: “A ciência e a tecnologia são as principais forças produtivas”. Essa visão lançou as bases de uma transformação que continua até hoje.
Em meados da década de 1980, o governo lançou um ambicioso programa que enviava milhares de jovens para estudar em universidades dos EUA e da Europa. O plano era simples: aprender, obter doutorado e voltar para casa. Esses estudantes retornavam cheios de conhecimento e ficaram conhecidos como “hai gui”, ou “tartarugas marinhas”, pelo trajeto de ida e volta. Muitos se tornaram professores e dirigentes de universidades chinesas, elevando os padrões acadêmicos locais.
O resultado apareceu rapidamente. Na década de 2010, instituições como Tsinghua e a Universidade de Pequim já competiam com gigantes como Stanford e MIT na produção científica. Segundo a The Economist, entre 2013 e 2016 a Tsinghua foi a universidade com mais pesquisas citadas do mundo. A China havia deixado de ser apenas um país de fábricas: estava se tornando uma potência do conhecimento.

As novas estrelas chinesas da IA
Esse investimento de longo prazo está dando frutos. Hoje, a China gasta mais de 4% do PIB em educação e, apenas entre 2012 e 2022, seu orçamento educacional dobrou. Paralelamente, universidades chinesas ampliaram seus programas para se concentrar nas áreas mais estratégicas, como a inteligência artificial, que já é ensinada até em escolas primárias.
Os resultados dessa política são visíveis na indústria tecnológica global. Quatro engenheiros chineses (Shengjia Zhao, Hongyu Ren, Jiahui Yu e Shuchao Bi) se tornaram recentemente protagonistas do chamado “roubo de talentos” da Meta para a OpenAI, após serem contratados com salários milionários. O interessante é sua formação: todos formados em universidades chinesas de elite e com doutorados em instituições americanas como Stanford, Berkeley ou Illinois.
Na OpenAI, esses engenheiros tiveram papel-chave no desenvolvimento de modelos como ChatGPT, GPT-4 e GPT-4o, as tecnologias mais avançadas de processamento de linguagem natural. Seu sucesso reflete o poder de um sistema educacional que, durante décadas, priorizou ciência e tecnologia. Um relatório do Instituto Paulson, em Chicago, indica que 38% dos especialistas em IA que atualmente trabalham nos EUA se formaram em universidades chinesas.

Uma faca de dois gumes para os EUA
Enquanto isso, os EUA parecem colocar obstáculos a esse mesmo fluxo de talentos que os beneficiou por anos. O governo de Donald Trump anunciou a intenção de “revogar agressivamente” os vistos de estudantes chineses, alegando motivos de segurança nacional. Mas essa medida pode acabar enfraquecendo a própria indústria tecnológica americana, justamente quando a competição pela liderança em IA está mais feroz do que nunca.
A China, por sua vez, segue executando seu plano de longo prazo: formar milhões de engenheiros e cientistas a cada ano, investir em universidades de elite e consolidar uma elite tecnológica capaz de competir com os gigantes do Vale do Silício. Afinal, em um mundo onde a inteligência artificial definirá o rumo econômico e geopolítico, o país que dominar a educação científica dominará o futuro.
Este texto foi traduzido/adaptado do site Xataka México.
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