Ao longo da sua história de mais de um século, a Renault já tomou decisões ruins. A marca chegou a enfrentar sérias dificuldades financeiras há não muito tempo. Mas, no começo dos anos 2000, o losango soube evitar uma armadilha em que vários concorrentes caíram — e hoje pode, com razão, se orgulhar disso.
Ao apostar em um equipamento de segurança mais caro do que o de alguns rivais, a montadora conseguiu escapar de um escândalo que hoje teria sido desastroso tanto para sua imagem quanto para suas finanças.
No setor automotivo, as decisões de corte de custos são quase constantes. Economizar alguns centavos em uma peça produzida em centenas de milhares de unidades pode significar grandes economias. E a Renault não está imune a isso, a queda na qualidade de alguns materiais no facelift do Clio 5 é uma prova disso.
Mas no início dos anos 2000, a montadora teve faro e resistiu à tentação de um fornecedor que oferecia preços mais baixos do que os concorrentes.
Airbags da Takata continuam mortais em 2025

Você com certeza já ouviu falar desse fornecedor. O nome dele tem até aparecido em painéis nas rodovias ultimamente. Trata-se da Takata, tristemente famosa pelos airbags que podem explodir — mesmo após colisões leves — e lançar fragmentos metálicos potencialmente mortais.
Apesar da falência da empresa japonesa em 2017, seus airbags ainda continuam fazendo vítimas em 2025. A culpa é do uso de nitrato de amônio, um composto químico de produção simples e barata, mas que pode se tornar altamente instável com o tempo, especialmente em climas quentes e úmidos.
Esse mesmo composto, aliás, foi o causador das explosões da fábrica AZF, perto de Toulouse, e também da tragédia no porto de Beirute, no Líbano.
Recall caro para as montadoras
O escândalo interminável da Takata não causou apenas tragédias humanas. Para as mais de 30 montadoras envolvidas, também há impactos financeiros pesados.
Como a fornecedora japonesa já faliu, as marcas não têm mais a quem responsabilizar — e agora correm o risco de multas do governo francês caso não resolvam o problema com rapidez.

Só o envio de milhares de cartas registradas aos proprietários afetados pelos diversos recalls já representa um custo considerável. Mas isso é pouco comparado à necessidade de encomendar (ou até mandar refabricar) uma quantidade enorme de airbags e arcar com todos os custos da substituição, que ficam por conta da própria marca.
Algumas oficinas chegaram a contratar funcionários extras para dar conta do volume de veículos que precisam ser corrigidos.
Oferecer carros de cortesia aos clientes que foram orientados a parar de dirigir também não sai de graça — e o governo francês recentemente adotou medidas para tornar essa prática mais comum.
Sem contar o prejuízo à imagem das marcas, algo impossível de calcular, e as indenizações potenciais que poderão ser pagas às vítimas após os processos judiciais, que atualmente têm como alvo principal a Citroën, na França.
Uma recusa bem pensada da Takata por parte da Renault
Nesse cenário, as montadoras que não optaram pelos airbags da Takata têm bons motivos para comemorar. Em alguns casos, dá até pra se perguntar se não houve um pouco de sorte. A escolha de um fornecedor depende de muitos fatores — não só técnicos ou financeiros. Proximidade geográfica, capacidade de produção e até um senso de “solidariedade nacional” fizeram com que várias marcas japonesas escolhessem a Takata.
Mas no caso da Renault, a decisão de rejeitar os airbags da fornecedora foi, sim, motivada por razões de segurança.
Segundo uma grande investigação com participação da L’Automobile Magazine e da equipe de apuração da Radio France, um ex-responsável de segurança da montadora, também ex-militar, teria vetado o uso do nitrato de amônio por conhecer bem seus riscos — e não queria esse composto dentro de um carro.
Esse “benfeitor anônimo”, cuja identidade não foi revelada, pode ter ajudado a salvar vidas e, de quebra, prestado um belo serviço à marca para a qual trabalhava.
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