A SpaceX mudou a economia espacial; agora, quer fazer o mesmo com o custo dos satélites

O acesso barato ao espaço mudou a forma de construir satélites

Satélites / Imagem: Xataka com Gemini 3
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Victor Bianchin

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Victor Bianchin é jornalista.

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O custo de lançar carga ao espaço foi, durante anos, um dos grandes limites da indústria aeroespacial. A NASA documenta em vários trabalhos, incluindo análises de Harry W. Jones, que, durante as últimas décadas do século 20, muitos lançadores operavam em uma faixa típica entre 10.000 e 20.000 dólares por quilo, com um custo médio em torno de 18.500 dólares/kg em órbita baixa — com o ônibus espacial muito acima disso devido à sua complexidade e custos operacionais.

Não era apenas o preço dos sistemas de lançamento, mas de um modelo baseado em componentes descartáveis, processos manuais e operações altamente especializadas.

A situação permaneceu estável durante décadas, até que a SpaceX decidiu repensar como deveria funcionar a economia dos lançamentos orbitais. Em vez de aceitar esses custos como inevitáveis, a empresa apostou na reutilização de módulos, na otimização de processos e na fabricação própria de motores e sistemas desde o zero.

Essa combinação permitiu reduzir o preço por quilo a níveis inéditos — embora a mudança não tenha acontecido de forma imediata. O relevante é que, pela primeira vez, uma empresa privada demonstrou que os lançamentos podiam ser muito mais baratos e que o preço não precisava ser uma barreira estrutural da indústria.

Quando o lançamento deixa de ser o limite, a atenção se desloca para os satélites

Os preços resultantes começaram a mudar o comportamento do setor. Com o Falcon 9 e o Falcon Heavy, o custo por quilo passou para a faixa de 3.000 a 1.500 dólares, segundo cálculos da NASA baseados nos preços de catálogo. Esses números não apenas representam uma redução, mas um ponto de inflexão: pela primeira vez, empresas, instituições e até governos puderam repensar o desenho de missões sabendo que o lançamento já não era a principal barreira econômica. A partir daí, surgiu uma pergunta: se já era possível baratear a viagem, o que aconteceria com aquilo que estava sendo enviado ao espaço?

O modelo tradicional de satélites foi construído com base na ideia de otimizar cada unidade. Não importava produzir muitos, mas sim fabricar um que pudesse operar durante anos, com alta capacidade e baixa probabilidade de falha. Fabricantes e operadores investiam em sistemas complexos, com ciclos de desenvolvimento longos, testes exaustivos e estruturas especializadas para cumprir missões específicas e duradouras. Essa estratégia fazia sentido em um cenário no qual o lançamento era tão caro e tão raro que era mais rentável priorizar a confiabilidade e a longevidade do que pensar em escalabilidade ou reposição rápida.

Uma das primeiras empresas a ajudar a mudar esse enfoque foi a OneWeb, que introduziu um modelo de fabricação pensado para escala. Em vez de encomendar cada satélite como uma peça única, a empresa projetou uma arquitetura comum e fez parceria com a Airbus para produzir unidades repetíveis, com processos padronizados e tempos de fabricação mais curtos. A fábrica instalada na Flórida em 2019 foi apresentada como a primeira linha de produção em série de satélites em grande escala, com duas linhas capazes de fabricar até duas unidades por dia. Não se tratava de construir um satélite melhor — mas de construir muitos.

A SpaceX pegou a ideia de constelação de satélites e a transformou em um sistema industrial próprio. Com o Starlink, não apenas replicou o uso de satélites fabricados em série, como também integrou essa produção à sua própria capacidade de lançamento com o Falcon 9, operado pela empresa. Essa integração permitiu acelerar a implantação sem depender de janelas de lançamento externas ou de fornecedores comerciais. A constelação começou a crescer com uma cadência sem precedentes e, em poucos anos, superou amplamente em número e ritmo qualquer outro projeto semelhante. A diferença não estava apenas em fabricar satélites, mas em poder lançá-los quando quisesse.

Embora a OneWeb tenha sido uma das primeiras a aplicar a lógica industrial à fabricação de satélites, sua constelação cresceu em um ritmo muito diferente da Starlink. No fim de 2025, a OneWeb tem cerca de 648 satélites em órbita, enquanto a SpaceX supera 8.000 satélites operacionais, segundo os dados mais recentes publicados por empresas de rastreamento orbital.

A diferença não se deve apenas à quantidade de lançamentos, mas também ao modelo de produção. De acordo com uma análise econômica publicada em 2025, o custo estimado de fabricação dos satélites da OneWeb gira em torno de 14.000 dólares por quilo, em comparação com aproximadamente 2.500 dólares por quilo no caso dos satélites Starlink. Esses números refletem uma diferença que tem mais relação com o modelo de integração do que com a tecnologia em si.

A reação do setor não demorou. Com o avanço do Starlink, tanto empresas quanto instituições públicas começaram a considerar projetos semelhantes baseados em constelações com grande número de satélites e implantações contínuas. A Amazon lançou o Kuiper, a Eutelsat e a OneWeb reforçaram sua aliança para manter presença no mercado e a União Europeia aprovou o programa IRIS2 com apoio institucional. A China também trabalha em sistemas próprios de grande escala. Não se trata apenas de competir em números, mas de aceitar que a escala e a capacidade de reposição fazem parte do novo modelo espacial.

Quando o satélite se torna um produto replicável, muda também a forma de planejar a presença em órbita. Já não se trata de lançar uma missão e esperar que ela funcione pelo maior tempo possível, e sim de construir uma estrutura que possa crescer, ser modernizada e substituir unidades regularmente. O satélite passa a ser um componente de uma rede, não o centro da missão. Essa lógica favorece modelos baseados em escalabilidade e reposição contínua, semelhantes aos de outras infraestruturas tecnológicas. O espaço deixa de ser um destino e se converte em uma plataforma.

A SpaceX demonstrou que o custo do lançamento não era um limite técnico, mas sim um limite de modelo. Agora, está tentando aplicar essa mesma lógica aos satélites, com um enfoque baseado em escala, fabricação contínua e integração com seus próprios sistemas de lançamento. O resultado não é apenas uma constelação maior, mas uma forma diferente de entender o que significa operar em órbita. A pergunta já não é quanto custa chegar ao espaço, mas quem consegue manter uma infraestrutura lá. E, nessa conversa, a SpaceX se tornou um ator relevante.

Imagens | Xataka com Gemini 3

Este texto foi traduzido/adaptado do site Xataka Espanha.


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