O que aconteceria se a tecnologia GPS parasse de funcionar ou fosse manipulada? Embora para o usuário comum o GPS seja sinônimo de navegação em carros ou celulares, nos setores industrial, militar e de infraestrutura crítica, a dependência de um único sistema de posicionamento global (GNSS), como o GPS americano ou o Galileo europeu, representa um risco geopolítico e uma fragilidade técnica. Se o sinal for intencionalmente interferido (comum em zonas de conflito) ou falhar por motivos técnicos, milhões de dispositivos IoT em todo o mundo ficam cegos e inoperantes.
Este é o desafio que a empresa espanhola Sateliot enfrenta com um projeto pioneiro em colaboração com a Agência Espacial Europeia (ESA). O objetivo não é substituir o GPS em celulares, mas sim libertar milhões de dispositivos IoT da necessidade de utilizá-lo para saber onde estão, a que horas devem sincronizar ou, em última instância, para poderem operar de forma autônoma.
Trata-se de um grande salto para a conectividade via satélite e um passo estratégico para a soberania tecnológica da Europa, que busca reduzir sua vulnerabilidade a terceiros, especialmente em setores críticos como Defesa e Segurança.
Abandonando a dependência do GNSS: o sistema FreeGNSSNetwork
Até agora, qualquer dispositivo que se conectasse a satélites em órbita baixa (LEO), a mesma órbita onde a Satellite implanta sua rede 5G IoT, precisava de GNSS (como o GPS) para calcular sua própria posição. O curioso é que, para um sensor que precisa enviar apenas alguns dados de temperatura ou localização uma vez por dia, recorrer ao GPS significa maior consumo de energia e um terminal mais caro. É como usar um supercomputador só para enviar uma mensagem de texto.
O projeto FreeGNSSNetwork rompe com essa inércia. Desenvolvido pela Sateliot em conjunto com a GMV e a ESA Engineering, este novo sistema permite que dispositivos IoT calculem sua posição diretamente a partir do sinal recebido dos satélites da própria Sateliot, dispensando os satélites GPS.
Utilizando algoritmos avançados em solo e a bordo dos satélites, a posição é determinada com uma precisão de cerca de 10 metros. Embora não seja tão milimétrica quanto a de outras tecnologias em desenvolvimento, é mais do que suficiente para 99% das aplicações industriais, logísticas e de segurança, como rastreamento de contêineres ou monitoramento de frotas.
A chave para esse avanço é sua resiliência. Em ambientes de conflito ou áreas onde o sinal GPS é intencionalmente bloqueado ou "negado", a conexão da Sateliot permanece estável e precisa, pois utiliza um canal de comunicação totalmente diferente, integrado ao seu próprio serviço. Isso a torna uma tecnologia de "dupla utilização" (civil e militar) que aumenta a autonomia operacional.
Um salto em eficiência e a base da tecnologia 6G
O impacto da eliminação da dependência do GNSS se traduz diretamente no bolso do usuário e na vida útil dos dispositivos. Ao não precisar ativar o GPS ou o chip Galileo para se posicionar, o consumo de energia dos terminais de IoT é drasticamente reduzido. Na prática, isso significa que os dispositivos poderão operar por anos sem a necessidade de trocar a bateria, reduzindo significativamente os custos de manutenção e operação para as empresas.
Mas o que poucos esperavam é que este projeto também estabeleça as bases para o futuro das telecomunicações. A empresa explicou que o FreeGNSSNetwork é um passo fundamental para o desenvolvimento do 6G. A capacidade de fornecer serviços de Posicionamento, Navegação e Tempo (PNT) com total autonomia é um requisito essencial para a próxima geração de conectividade, onde a precisão temporal é crucial. De fato, o sistema oferece sincronização de tempo de 50 nanossegundos – uma precisão tão extrema que é vital para redes de alta velocidade e aplicações que exigem coordenação perfeita.
A aposta da Sateliot não é apenas uma melhoria técnica; trata-se de uma estratégia de mercado. Ao integrar nativamente a funcionalidade PNT (Posicionamento, Navegação e Tempo) ao padrão de rede 5G IoT, a empresa pode oferecer uma solução global de conectividade e posicionamento mais barata, eficiente e segura do que a concorrência tradicional, atraindo novos mercados, incluindo o setor de Defesa, que valoriza acima de tudo a independência e a robustez do sinal.
Com este acordo com a ESA, a empresa espanhola não só reforça a sua posição como referência no padrão 5G IoT via satélite, como também contribui ativamente para a autonomia estratégica da Europa num setor tão crucial como o espacial e o das telecomunicações. A mensagem é clara: a próxima geração de 5G IoT está chegando.
A conectividade global será resiliente, eficiente e não precisará da permissão de ninguém para saber onde está.
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