Ucrânia abriu um drone Shahed russo e descobriram uma mensagem oculta: ele estava sendo controlado via Telegram

A revelação do uso do Telegram como sistema de controle marca um novo capítulo na guerra híbrida que está redefinindo os limites da tecnologia militar

Rússia está controlando drones por Telegram / Imagem: Kyiv City State Administration
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Victor Bianchin

Redator

Victor Bianchin é jornalista.

Na Ucrânia, a captura de armamento inimigo se transformou em uma verdadeira caixa de surpresas. A novidade mais recente: a captura de um drone Shahed trouxe uma nota surpreendente escondida.

A ofensiva aérea russa contra a Ucrânia atingiu um novo nível de brutalidade, com um ataque recente que supera os limites anteriormente considerados excepcionais. A Rússia lançou um ataque massivo sem precedentes que incluiu 298 drones e 69 mísseis em uma única noite — um número recorde que colocou em xeque as defesas antiaéreas ucranianas.

Diante do previsível fracasso das negociações por um cessar-fogo, a Ucrânia se vê obrigada a racionar seus interceptores, o que significa que cada vez mais projéteis russos conseguem atingir seus alvos, impactando cidades, indústrias e civis com uma intensidade crescente.

Mísseis norte-coreanos e drones iranianos

Além disso, desde o início do ano, a Rússia transformou sua campanha aérea, concentrando seus esforços em mísseis balísticos — muitos provenientes da Coreia do Norte — e em uma nova geração de drones Shahed de origem iraniana. Esses drones estão agora em sua sexta versão e utilizam aprendizado de máquina para atacar zonas altamente defendidas, como Kiev, o que resultou em impactos recentes em centros comerciais, áreas residenciais e campos de treinamento militar.

Além disso, a velocidade dos mísseis balísticos os torna virtualmente impossíveis de interceptar sem os escassos e caríssimos mísseis PAC-3 do sistema Patriot, dos quais a Ucrânia possui um número insuficiente. Por sua vez, o ritmo de fabricação dos drones Shahed na Rússia cresceu exponencialmente: se antes eram produzidos 300 por mês, agora essa mesma quantidade é fabricada em menos de três dias. Documentos vazados sugerem que o Kremlin planeja aumentar a produção para até 500 drones por dia, o que poderia gerar enxames de até 1.000 drones em uma única operação.

Telegram e drones

A The Economist revelou com exclusividade um fato sem precedentes. Uma descoberta dentro de um drone Shahed derrubado na Ucrânia revelou uma evolução preocupante na estratégia tecnológica de Moscou: uma nota, supostamente deixada por um engenheiro russo simpatizante, informava que a Rússia está controlando seus drones de ataque por meio de bots no aplicativo de mensagens Telegram.

O motivo? Esse método permite enviar dados de voo e transmissões ao vivo diretamente para operadores humanos, eliminando a dependência do GPS e tornando os drones muito mais resistentes às interferências eletrônicas ucranianas. A implementação de inteligência artificial, somada ao uso de redes móveis ucranianas e, possivelmente, conexões via Starlink, representa um salto qualitativo na letalidade e autonomia dos drones russos — especialmente desses modelos mais recentes dos Shahed, que utilizam aprendizado de máquina para atingir alvos protegidos com precisão.

A resposta do Ocidente foi eliminar a linha vermelha das armas de “longo alcance” para que a Ucrânia possa se defender. As tropas ucranianas continuam derrubando cerca de 95% dos drones lançados contra Kiev, mas os 5% que conseguem passar são suficientes para causar danos devastadores.

As táticas russas evoluíram: os drones voam em baixa altitude para evitar serem detectados e depois sobem bruscamente a altitudes que superam o alcance das armas de curto alcance. Para combater isso, a Ucrânia recorre a F-16, helicópteros e até drones interceptores, mas a defesa contra mísseis balísticos continua sendo seu ponto mais fraco. Apenas alguns poucos países possuem sistemas capazes de interceptá-los, e os Estados Unidos, que produzem os Patriots e seus interceptores PAC-3, têm suas próprias prioridades estratégicas.

O tempo está se esgotando

Apesar da necessidade urgente de mais baterias Patriot (Zelensky estima que seriam necessárias pelo menos dez adicionais para proteger o território), o governo dos Estados Unidos adotou uma postura tímida. Sob a pressão de outros conflitos e da influência da ala dura do Partido Republicano, que prioriza a Ásia, a Ucrânia deixou de ser uma prioridade estratégica.

A produção dos PAC-3 será aumentada para 650 unidades por ano, mas isso continua sendo insuficiente diante dos 500 mísseis balísticos que, segundo Kiev, a Rússia já teria armazenados. Além disso, cada míssil russo costuma exigir dois interceptores para ser derrubado, o que agrava ainda mais a desvantagem.

Nova doutrina

Talvez seja assim que se entendem os últimos movimentos da Ucrânia. Diante da escassez de recursos e da crescente ameaça aérea, Kiev cogita uma mudança em sua estratégia de sobrevivência: não se limitar a interceptar, mas passar a destruir os complexos de lançamento, fábricas e depósitos russos.

Essa postura mais agressiva, defendida por analistas como Kostiantyn Kryvolap, parte da convicção de que, sem uma dissuasão ativa, o ritmo dos ataques só tende a aumentar. Enquanto os sistemas de defesa ocidentais chegam a conta-gotas e suas capacidades levarão pelo menos um ano para serem ampliadas, a Ucrânia se prepara para enfrentar sozinha uma guerra aérea cada vez mais assimétrica e letal. Nesse cenário, cada drone ou míssil derrubado pode oferecer pistas para combater essa desvantagem.

Imagem | Kyiv City State Administration

Este texto foi traduzido/adaptado do site Xataka Espanha.

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