Não bastassem os drones e a lama, os soldados ucranianos na frente de batalha agora têm mais um problema: a neblina

O inverno e a mudança no clima se tornaram um multiplicador de incertezas

Neblina na Ucrânia / Imagem: IDF Spokesperson's Unit
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Victor Bianchin

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Victor Bianchin

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Victor Bianchin é jornalista.

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No começo de novembro, uma cena viralizou nas redes. A chegada das tropas russas a Pokrovs parecia saída de uma distopia, mais um exemplo de que a guerra na Ucrânia parecia ter se transformado definitivamente em um espelho do que serão os conflitos bélicos do futuro.

Agora sabemos que aquela cena também era o prelúdio de uma vantagem.

Nas linhas do leste da Ucrânia, a chegada de um inverno cheio de nevoeiros densos transformou o campo de batalha em um cenário imprevisível, onde a visibilidade — que antes determinava o ritmo dos drones — se converteu em um recurso estratégico por si só.

O véu de umidade que cobre Donetsk, Zaporizhzhia e os acessos a Pokrovsk dificulta o trabalho dos operadores ucranianos, que dependem da vigilância aérea para rastrear os movimentos russos, mas também oferece uma oportunidade para se aproximar silenciosamente, infiltrar-se e atacar a curta distância.

Em zonas como Pokrovsk, onde as linhas se sobrepõem e a frente é porosa, o nevoeiro provocou uma espécie de caos calculado que torna a guerra imprevisível — um tabuleiro onde ambos os exércitos se movem quase às cegas, entre rajadas de tiros que surgem sem aviso prévio, enquanto os comandantes admitem que as condições meteorológicas estão alterando completamente a leitura do terreno e o controle das rotas de aproximação.

A neblina permitiu às forças russas impulsionar avanços pontuais e manobras arriscadas. Aproveitando a falta de vigilância aérea, unidades mecanizadas conseguiram cruzar obstáculos naturais, montar pontes improvisadas e abrir caminho em áreas onde antes eram interrompidas pelo reconhecimento constante desde o ar.

Em regiões do sul, como Zaporizhzhia e Dnipropetrovsk, a baixa visibilidade coincidiu com um aumento de ataques e bombardeios intensivos, os quais obrigaram a Ucrânia a recuar de certas posições em busca de linhas defensivas mais sustentáveis. O acúmulo de tropas sob a proteção da neblina, a concentração de veículos blindados e as infiltrações constantes por equipes pequenas que buscam avançar sem serem detectadas refletem uma estratégia que combina quantidade, pressão contínua e oportunismo meteorológico.

Ao mesmo tempo, o deslocamento de colunas rumo a localidades como Huliaipole e Yablukove confirma que a Rússia tenta transformar cada janela climática em um avanço territorial, ciente de que controlar nós logísticos nesta época do ano pode determinar a tendência de toda a campanha.

Solução: robôs terrestres

Diante da perda temporária dos olhos no céu, a Ucrânia começou a integrar sistemas robóticos terrestres para substituir a vigilância antes garantida pelos drones. O surgimento de UGVs na defesa de Pokrovsk permitiu detectar movimentos inimigos que teriam passado despercebidos na neblina densa e ajudou a orientar ataques posteriores com drones FPV quando a visibilidade permitia. Essas pequenas plataformas, discretas e rápidas, acrescentaram uma camada adicional de reconhecimento em áreas onde até as melhores óticas aéreas falham.

Seu uso mostra que o exército ucraniano está amadurecendo doutrinas híbridas em que robôs terrestres completam o trabalho que antes era dominado exclusivamente por drones. É o prenúncio de como a guerra tecnológica pode evoluir nos próximos anos: uma integração mais estreita entre sensores terrestres autônomos e vetores aéreos, especialmente em climas adversos que estão se tornando mais frequentes e extremos. As unidades que operam em Pokrovsk descrevem cenas de combate em que os ataques surgem da neblina, guiados por máquinas que detectam calor, som ou movimento em condições nas quais o olho humano é praticamente cego.

A pressão sobre Pokrovsk

A piora do clima coincide com o agravamento da situação tática em Pokrovsk, um ponto crítico por seu valor como nó de transporte e elo para a defesa do leste. A Rússia intensificou os ataques, apoiando-se tanto na cobertura climática quanto em um notável desequilíbrio numérico que favorece suas tropas.

As forças ucranianas reconhecem que enfrentam ondas de infantaria em grupos muito pequenos, equipes de dois ou três soldados que buscam saturar as defesas por múltiplos acessos, e que a neblina facilitou o retorno temporário de assaltos mecanizados, inclusive utilizando veículos civis para avançar rapidamente em direção à cidade.

Essa dinâmica obrigou a Ucrânia a combinar recuos táticos, evacuações de civis e reconhecimento terrestre robotizado para evitar surpresas. O clima adverso acelerou a sensação de incerteza em uma frente onde cada metro de terreno é disputado às cegas e onde a falta de visão aérea multiplica o risco de que uma infiltração inimiga se converta em uma ruptura operacional.

O tempo muda tudo

A combinação de neblina persistente, mobilidade limitada e baixa visibilidade criou um ecossistema de combate que recompensa tanto a criatividade quanto a audácia. Nesse ambiente, as táticas de infiltração russa encontram mais espaço para prosperar, mas também as incursões rápidas ucranianas que procuram desorientar o adversário no caos da neblina.

O clima tornou-se um multiplicador de incerteza: degrada a precisão dos drones, distorce sensores, cria lacunas na vigilância e obriga ambos os lados a improvisar soluções tecnológicas e táticas. Os robôs terrestres ucranianos representam uma resposta emergente a essas condições, enquanto os avanços russos sob mau tempo mostram a importância que Moscou concede a qualquer oportunidade de romper a defesa ucraniana.

Imagem | IDF Spokesperson's Unit

Este texto foi traduzido/adaptado do site Xataka Espanha.


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