Um grupo de pesquisadores pode ter dado o primeiro passo para reinventar o olfato, ou pelo menos, criar uma alternativa tecnológica para quem perdeu totalmente a capacidade de sentir cheiros. Em um estudo publicado na Science Advances, cientistas testaram um dispositivo experimental que permite a pessoas com anosmia perceberem a presença de determinados odores usando um atalho sensorial pouco explorado: o nervo trigêmeo.
Em vez de tentar reativar o sistema olfativo tradicional, que depende de cerca de 400 receptores trabalhando juntos para decodificar bilhões de cheiros, os pesquisadores apostaram em uma rota paralela. O trigêmeo é responsável por sensações como o ardor da pimenta, o “choque” do wasabi e o frescor da hortelã — estímulos que não são propriamente cheiros, mas sinais químicos percebidos no nariz. A ideia, segundo os autores, era usar esse canal para substituir parte da função perdida.
O dispositivo usa um sensor químico desenvolvido pela empresa Aryballe capaz de identificar alguns cheiros específicos. Cada odor é convertido em um padrão distinto de impulsos elétricos — um tipo de “código Morse nasal”. Esses impulsos são enviados por eletrodos presos à parede interna do nariz, ativando o trigêmeo em vez do sistema olfativo real.
Nos primeiros testes, nove voluntários — cinco com olfato intacto e quatro com disfunções — conseguiram sentir a estimulação, descrita como levemente incômoda. Em seguida, os pesquisadores tentaram algo mais ambicioso: ver se os participantes conseguiam distinguir entre diferentes padrões. O cheiro de lilás virou dois pulsos espaçados; o de framboesa, quatro estímulos rápidos. Alguns participantes notaram a diferença, enquanto outros tiveram dificuldades. Com ajustes no experimento, parte dos voluntários conseguiu identificar dois cheiros com consistência.
Especialistas afirmam que a tecnologia não recupera o olfato — ela cria outra coisa. Não há como reproduzir a imensa variedade de aromas, nem o impacto emocional que cheiros têm no cérebro. Mas o potencial prático é enorme: uma versão miniaturizada poderia alertar pessoas com anosmia sobre perigos como vazamentos de gás, produtos químicos ou alimentos estragados.
Os desafios, porém, ainda são grandes. Sensores de odor continuam limitados e precisam operar de forma rápida, precisa e estável em ambientes variados. Mesmo assim, os pesquisadores acreditam que este pode ser o embrião de uma nova categoria de “próteses sensoriais” — um passo curioso e promissor rumo a um olfato artificial.
Crédito de imagem: Mike Simons/Getty Images
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