Não importa se estamos falando de São Paulo, Madri, Nova York ou Milão. Onde quer que haja uma obra, uma vala aberta, um pedreiro com capacete, um jardineiro podando os ciprestes do parque ou um guindasteiro subindo e descendo carga, provavelmente haverá também um aposentado supervisionando. Sua figura é quase universal, assim como a curiosidade ou o impulso inato de dar conselhos que ninguém pediu. Agora, em uma pequena cidade da Itália, tiveram uma ideia peculiar: por que não aproveitar todo esse talento desperdiçado?
Por isso, eles profissionalizaram seus idosos.
Obra? Quem disse obra?
Quando nos aproximamos de uma obra, esperamos encontrar certos elementos: pedreiros, betoneiras, andaimes, guindastes, escavadeiras… Há tempos, essa extensa lista de profissionais e equipamentos ganhou algo a mais: aposentados que acompanham cada pá de terra, cada remoção ou martelada com a atenção de um maestro. Isso acontece em quase qualquer cidade da Europa, seja grande ou pequena.
Na Itália, tiveram a ideia de que talvez não seja tão absurdo aproveitar esse talento ancião. Criaram até um nome para os aposentados que vão de obra em obra observando e dando conselhos, geralmente nas primeiras horas da manhã, depois do café e em grupo. Eles são chamados de “umarell”, um termo criado em 2005 pelo escritor Danilo Masotti, que o cunhou resgatando uma palavra do dialeto de sua cidade natal, Bolonha: “umarèl” (“homenzinho”). A ideia agradou e foi se popularizando até entrar no dicionário em 2021.

Com o passar dos anos, a figura do umarell passou a fazer parte da cultura popular italiana. Há algum tempo, na cidade de Pescara, decidiram abrir pequenas janelas nas cercas que cobrem as obras para que os idosos pudessem espiar. Em 2016, num gesto que reconhecia sua crescente popularidade, o Burger King os incluiu em um cartaz publicitário. Mas quem se superou foi a Prefeitura de Bolonha, que, em 2018, foi além e lhes dedicou uma praça, a Piazetta degli Umarells.
Por que não aproveitar esse potencial? Diante disso, há alguns meses, Villasanta, uma pequena cidade de 14 mil habitantes na região da Lombardia, no norte da Itália, teve uma ideia: por que não aproveitar a curiosidade, a experiência e o tempo dos umarell? Mais ainda, por que não profissionalizá-los e “contratar” os melhores? Com esse propósito, no fim do ano passado, a prefeitura lançou uma convocação que se encerrou no início de abril e permitiu criar uma pequena patrulha de oito umarell, seis de Villasanta e dois de Monza.
A serviço do povo
Nos balcões dos bares, qualquer um pode dar opinião. No time de umarell de Villasanta, não. As pessoas selecionadas pela prefeitura cumprem certos requisitos: estão aposentadas, têm diploma universitário e acumulam experiência profissional em áreas técnicas, graças aos seus antigos empregos em campos como arquitetura, engenharia e topografia. O objetivo? Que suas orientações sejam, antes de tudo, boas orientações.
O serviço é prestado de forma gratuita, sem remuneração, embora, por estarem inscritos no registro de Voluntários Cívicos, fiquem cobertos por um seguro. Ao se tornarem umarell profissionais, eles também assumem certas responsabilidades. O The Guardian detalha que cada um dos oito aposentados (sete homens e uma mulher) tem uma parte da cidade designada, e o trabalho é organizado em turnos de duas a três horas. Quando alguém falta, há coordenação com os colegas para cobrir a vaga.
Mas… o que eles fazem exatamente?
Basicamente, aumentam o número de olhos e ouvidos que a prefeitura tem para supervisionar determinados trabalhos e serviços municipais. Durante seu turno, cada umarell visita obras públicas, verifica o estado de ruas e calçadas e “supervisiona” a manutenção das áreas verdes, entre outras tarefas. Em abril, a EuroNews informou que a primeira missão atribuída a eles pela prefeitura foi realizar pesquisas sobre o trânsito.
Graças a eles, a prefeitura pode ter um controle mais preciso das obras públicas, da limpeza de ruas e estacionamentos, da conservação dos parques e demais áreas verdes, além de saber se a iluminação pública e o serviço de coleta de lixo estão funcionando corretamente. “Acima de tudo, você se sente útil para a sociedade e para si mesmo: está fazendo algo valioso com seu tempo em vez de ficar sentado em frente à TV ou reclamando, como fazem os verdadeiros umarell”, explica ao The Guardian Roberto Cremona, um dos oito aposentados que patrulham as ruas (e as obras) da cidade.
Imagens | Wikipedia (Wittylama) e Salvatore Capalbi (Flickr)
Este texto foi traduzido/adaptado do site Xataka Espanha.
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