A depressão é uma doença séria caracterizada por provocar alterações expressivas no humor dos indivíduos, como tristeza profunda e desânimo. Durante décadas, o senso comum sustentou a ideia de que a principal causa da doença estaria ligada a um desequilíbrio químico no cérebro, causado pela diminuição nos níveis de serotonina, dopamina e norepinefrina. No entanto, pesquisas recentes trouxeram um novo olhar sobre essa hipótese.
Um estudo conduzido por cientistas da University College London, no Reino Unido, e publicado na revista Molecular Psychiatry, indicou que níveis baixos de serotonina não são a causa da depressão. A conclusão gerou polêmica no meio acadêmico e mais controvérsia do que qualquer outro artigo de neurociência recente. A seguir, entenda quais foram os pontos abordados no estudo e quais seriam as principais causas da depressão:
Estudo revela que depressão pode não ser causada por um desequilíbrio químico cerebral
Durante décadas, a explicação mais aceita para as causas depressão foi a chamada “hipótese da serotonina”, uma teoria que sugere que a depressão está associada a níveis reduzidos de serotonina no cérebro. A hipótese surgiu na década de 1960, baseada na observação de remédios antidepressivos, como Prozac, Zoloft e Paxil. A lógica era: se os Inibidores Seletivos da Recaptação da Serotonina (ISRS) aumentavam os níveis desse neurotransmissor na fenda sináptica e funcionam para muitos pacientes, então a causa da depressão poderia ser explicada pelos níveis baixos de serotonina no cérebro.
Contudo, o estudo da University College London demonstrou que os baixos níveis de serotonina no cérebro podem não ser a única causa da depressão. Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores revisaram uma série de estudos e evidências científicas e concluíram que não há provas consistentes de que pessoas com depressão apresentam menos serotonina no cérebro. Ou seja, a ideia do “desequilíbrio químico” como explicação universal não se sustenta de todas as formas. Para o neurocientista Ben Rein, em uma publicação realizada em seu perfil no Instagram, a descoberta não traz nada de novo, mas expõe um problema sério na comunicação entre a ciência e a sociedade.
Entenda quais foram as principais descobertas do estudo
Ao reunir diferentes estudos, os pesquisadores analisaram décadas de pesquisa científica e encontraram algumas contradições. Veja a seguir um resumo das principais descobertas:
- Níveis de 5-HIAA: a serotonina se decompõe em um subproduto chamado ácido 5-hidroxiindolacético (5-HIAA). A revisão mostrou que pessoas com depressão não apresentam níveis consistentemente mais baixos de 5-HIAA em comparação com pessoas sem o transtorno;
- Receptores de serotonina: a análise de receptores cerebrais (como o 5-HT1A) também não demonstrou diferenças significativas entre indivíduos com e sem depressão;
- Proteína transportadora de serotonina (SERT): essa proteína retira serotonina das sinapses e regula sua disponibilidade no cérebro. Curiosamente, a revisão encontrou níveis mais baixos de SERT em pessoas com depressão, o que deveria aumentar (e não reduzir) os níveis de serotonina, contrariando a hipótese inicial;
- Genética: não há evidências consistentes de que mutações nos genes ligados à serotonina estejam diretamente associadas ao risco de depressão.
Apesar de parecer uma descoberta surpreendentemente nova, os cientistas já sabiam que a baixa serotonina não é a causa principal da depressão. Mas então porque muita gente não sabe dessa informação? Por um motivo muito simples: a falta de comunicação científica acessível, já que grande parte das informações são encontradas em artigos técnicos e de difícil acesso ao público.
Como os ISRS atuam no tratamento da depressão?
O fato de a baixa serotonina não ser a causa direta da depressão não significa que os ISRS, classe de medicamentos antidepressivos, não funcionam. Eles continuam sendo uma dos principais métodos de tratamento da doença, com milhões de pessoas relatando melhora com o uso.
O que acontece é que o mecanismo exato ainda não é totalmente compreendido. Uma explicação possível é que o aumento da serotonina causado pelos ISRS desencadeie mudanças em outros sistemas do cérebro, resultando na melhora do humor do paciente. Outra hipótese é que esses medicamentos favoreçam a neuroplasticidade, que nada mais é do que a capacidade do cérebro de se remodelar e criar novas conexões.
Esse aumento da flexibilidade neuronal pode permitir que pensamentos negativos sejam reinterpretados pelo indivíduo, tornando a mente mais “aberta” a novas perspectivas. Isso explicaria por que os efeitos desses tipos de medicamentos demoram semanas para aparecer.
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