Uma mina desligou todos os seus motores a carvão, mas conseguiu continuar operando por 84 horas graças às energias renováveis

A mina australiana conseguiu superar 90% de energia renovável em operação diária usando uma microrrede híbrida. A meta é atingir uma média de 80–90% em 2026

Mina de ouro Bellevue / Imagem: ZenithEnergy e Unsplash
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Victor Bianchin

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Victor Bianchin é jornalista.

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Durante 84 horas consecutivas, uma mina de ouro remota na Austrália desligou completamente seus motores a gás e diesel e funcionou apenas com vento, sol e baterias. Não se trata de um experimento de laboratório, mas de uma operação subterrânea real. A história surge em um contexto dourado: o ouro bateu recordes históricos acima de 3.600 dólares (R$ 19,1 mil) por onça, impulsionado pela busca de refúgio diante da incerteza geopolítica e monetária. Essa valorização e o renovado apetite pelos lingotes servem como pano de fundo para o relato do “ouro limpo”.

A mina subterrânea Bellevue, na Austrália Ocidental, que extrai ouro, afirma que a instalação off-grid funcionou por 84 horas consecutivas em agosto com o “motor desligado” — ou seja, sem geração térmica — demonstrando que o funcionamento à base de 100% de energia renovável é possível para indústrias em locais remotos.

O feito foi possível graças à notável instalação que inclui: 24 MW de energia eólica distribuídos em quatro aerogeradores, 27 MW de energia solar fotovoltaica no local e um sistema de armazenamento de 15 MW/30 MWh. O respaldo é formado por 9 MW de diesel e 15 MW de gás, que atuam como apoio quando a energia renovável ou a bateria não conseguem suprir a demanda.

A Zenith Energy, empresa que opera a planta sob um acordo de compra de energia de longo prazo, detalha que a microrrede híbrida alcança cerca de 90 MW instalados, com capacitores síncronos e um controlador de microrrede projetado para que a mina possa se desconectar completamente dos combustíveis fósseis nos momentos de maior geração renovável.

Uma progressão meteórica

A curva ascendente é clara: em julho de 2024, a participação de renováveis era de apenas 14%. Em junho deste ano, já havia subido para 64%, em julho para 78% e em agosto atingiu 88%, segundo a RenewEconomy. Desde a entrada em operação dos aerogeradores entre maio e junho de 2025, a mina tem operado regularmente com mais de 90% de energias renováveis durante jornadas completas de 24 horas, com vários dias chegando a 100%.

Não se trata de um episódio isolado. Em junho de 2025, pouco depois do início da operação das turbinas eólicas, a mina conseguiu funcionar 58 horas seguidas a 100% renovável, segundo a Stockhead. Assim, ambos os marcos reforçam a ideia de que o uso de energias renováveis é tecnicamente viável mesmo em indústrias intensivas em energia e isoladas da rede.

Um novo mercado: ouro verde

A Bellevue está testando vender parte de sua produção com um prêmio, por meio da refinaria ABC Refinery e do programa Single Mine Origin, voltado a compradores de joias e bancos centrais com sensibilidade ESG. “A Bellevue afirma que agora produz e vende ‘ouro verde’ após alcançar a meta de zero emissões líquidas”, detalha a Stockhead. Além disso, inclui sistemas inteligentes de ventilação sob demanda (VoD) que reduzem até 30% o consumo de eletricidade, e testes com maquinário elétrico subterrâneo.

O selo “Net Zero” não deve ser interpretado de forma leviana. O status foi alcançado nos Escopos 1 e 2, ou seja, emissões diretas e consumo de eletricidade, mas não inclui o Escopo 3 (refino, transporte e uso do ouro). Além disso, parte da neutralidade é obtida por meio da compra de créditos de carbono, como a própria empresa admitiu.

Além disso, o International Energy Forum (IEF) alerta que a mineração ainda enfrenta grandes desafios em água, resíduos e segurança, além da energia limpa. Torná-la sustentável envolve transformar toda a cadeia, não apenas a eletricidade.

Em tempos de incerteza, o ouro volta a ser um refúgio financeiro. Mas a Bellevue Gold quer que ele também seja um símbolo da transição energética. O ouro que compramos em forma de joia ou lingote poderia vir de uma mina que, durante dias inteiros, se alimenta apenas do vento e do sol. A questão é se este caso será a faísca que transformará toda a mineração ou se permanecerá como uma exceção brilhante no meio do deserto australiano.

Imagem | ZenithEnergy e Unsplash

Este texto foi traduzido/adaptado do site Xataka Espanha.


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