Guerra na Ucrânia mudou mais do que apenas mapas: está levando russos a adotar semana de trabalho de quatro dias

  • Avtovaz anunciou uma semana de trabalho de quatro dias a partir de setembro para sua principal fábrica na Rússia

  • Isso não foi feito por causa da produtividade, mas sim pela queda de 25% nas vendas e pela pressão das importações de carros fabricados na China

Imagem | Lada, Unsplash (Sten Rademaker)
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PH Mota

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Jornalista há 15 anos, teve uma infância analógica cada vez mais conquistada pelos charmes das novas tecnologias. Do videocassete ao streaming, do Windows 3.1 aos celulares cada vez menores.

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O conflito na Ucrânia continua a remodelar não apenas a geopolítica e os orçamentos da Europa, mas também a jornada de trabalho de milhares de trabalhadores russos. A Avtovaz, uma das maiores fabricantes de automóveis da Rússia, anunciou que vai implementar a semana de trabalho de quatro dias a partir de setembro.

Segundo a Reuters, esta não é uma medida voltada para melhorar a produtividade ou reduzir os níveis de estresse de seus funcionários, mas sim uma resposta à forte queda nas vendas de veículos, à crise de consumo provocada pelo desgaste gerado pela invasão da Ucrânia e à crescente pressão das exportações de automóveis chineses.

Rússia não vende carros

A Avtovaz é a fabricante do conhecido Lada. Após os primeiros meses da guerra na Ucrânia, a indústria automobilística russa teve um breve impulso graças aos gastos com defesa e aos subsídios estatais. No entanto, segundo dados da Reuters, essa situação começou a se reverter rapidamente. A Avtovaz explicou, em comunicado enviado à imprensa russa, que suas vendas caíram 25% no primeiro semestre, com apenas 155.481 unidades vendidas, e estima que essa será a tendência para o restante do ano.

A Avtovaz não é a única a considerar a semana de trabalho de quatro dias como alternativa para lidar com a crise no setor. Segundo a imprensa local, a fabricante russa GAZ (Gorkovski Avtomobilny Zavod) também adotará a semana reduzida em sua fábrica de Gorky, pelos mesmos motivos mencionados pela Avtovaz. O próprio Ministro da Economia da Rússia, Maxim Reshetnikov, alertou em junho que o país "está à beira de entrar em recessão". A Avtovaz, refletindo essa crise, quer usar a redução da jornada como forma de manter empregos sem precisar ampliar o número de demissões em tempos difíceis.

Sem dinheiro para fabricar ou comprar

De acordo com o The Moscow Times, "a decisão final sobre a introdução da semana de trabalho reduzida para quatro dias será tomada com base nos resultados de uma análise das tendências de mercado e de fatores econômicos, incluindo o nível da taxa básica de juros e a disponibilidade de produtos de crédito", afirmou a empresa.

O principal fator que agravou essa crise (além de ser um desdobramento do conflito na Ucrânia) foi o aumento das taxas de juros, que desacelera tanto a produção quanto o consumo. "Estamos falando de uma taxa básica elevada e de exigências mais severas por parte do regulador para aqueles que facilitam o financiamento de veículos", explicou a Avtovaz em comunicado.

O impacto das altas taxas não é sentido apenas pela Avtovaz. A gigante siderúrgica russa Severstal observou que "a taxa básica alta e os preços baixos" foram responsáveis por uma queda de 55% em seus lucros no segundo trimestre do ano anterior. Em outras palavras, à medida que o dinheiro se torna mais caro, as empresas perdem lucratividade e os cidadãos perdem poder de compra, dificultando a aquisição dos carros fabricados e provocando um efeito em cadeia que compromete a recuperação econômica.

Carros chineses são imparáveis

Além da já complicada crise econômica do setor automotivo global, há a chegada massiva de carros importados da China, vendidos a preços tão baixos que a Avtovaz acusa diretamente a prática de "dumping". Segundo fontes da empresa, essas montadoras, em sua maioria chinesas, estão aumentando a pressão sobre o mercado com preços muito baixos para escoar mais de 400 mil veículos que mantêm em estoque nas concessionárias e ainda não conseguiram vender.

GAZ começa agora, Avtovaz deixa para setembro

Fontes russas afirmam que a fábrica da GAZ em Gorky implementou a semana de trabalho de quatro dias imediatamente. De 21 de julho a 3 de agosto, os funcionários dessa unidade aproveitaram suas férias normalmente. Durante esse período, várias divisões da fábrica continuarão operando conforme seus horários habituais. Após esse intervalo, a semana de quatro dias será aplicada pelo menos até o final de agosto.

A Avtovaz informa que ainda está avaliando como implementar a medida, para que ela entre em vigor em setembro na fábrica da empresa em Togliatti, onde um em cada 20 habitantes da cidade trabalha.

Você sabe como é trabalhar quatro dias?

Embora esse modelo de jornada de trabalho não esteja sendo adotado com foco em produtividade e bem-estar, esta não é a primeira vez que a Avtovaz recorre à redução de jornada como forma de enfrentar uma crise.

Em 2022, logo após a imposição das primeiras sanções internacionais à Rússia pela invasão da Ucrânia, a empresa aplicou uma semana de quatro dias por três meses. Naquele mesmo ano, as vendas de seu principal modelo, o Lada, caíram 48,2%, para 174.688 unidades, segundo dados publicados pelo The New Voice of Ukraine.

Na ocasião, a semana de trabalho reduzida ajudou a manter um certo nível de produção em meio a um cenário adverso. Hoje, três anos depois, as condições econômicas continuam difíceis, e as empresas voltam a recorrer à mesma estratégia.

Imagem | Lada, Unsplash (Sten Rademaker)

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