Compras canceladas e zombaria na imprensa: está sendo um verão complicado para o F-35 dos EUA

Rivais geopolíticos utilizam incidentes isolados para alimentar narrativas de fragilidade tecnológica

Os caças F-35 estão sob ataque midiático / Imagem: RawPixel
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Victor Bianchin

Redator
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Victor Bianchin é jornalista.

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Recentemente, a Espanha decidiu voltar atrás no pedido de 50 F-35 que havia acertado com a companhia estadunidense Lockheed Martin. A essa negativa, foram se somando países que colocaram em dúvida a compra de novos modelos do caça, como o Reino Unido. Agora, para coroar uma semana trágica, Rússia e China utilizam as redes sociais e a mídia para colocar o dedo na ferida.

O que aconteceu

O porta-aviões britânico HMS Prince of Wales, navio-chefe da Royal Navy e líder do Carrier Strike Group 2025, sofreu pela segunda vez em sua atual missão, Operation Highmast, um incidente com um de seus caças F-35B Lightning II, obrigando desta vez a aeronave a realizar um pouso de emergência em um aeroporto civil estrangeiro.

Nesta ocasião, o aparelho teve que se desviar para o aeroporto de Kagoshima, no sudoeste do Japão, durante um exercício conjunto com a Força Aérea de Autodefesa japonesa, devido a uma avaria que obrigou o fechamento da pista por cerca de 20 minutos e provocou atrasos em voos comerciais. Embora a falha não tenha exigido assistência técnica de urgência como no incidente anterior na Índia (quando outro F-35B permaneceu inoperante por mais de um mês), o novo episódio prejudica uma missão concebida para reforçar a projeção britânica no Indo-Pacífico — e, de pano de fundo, a da Lockheed Martin.

As primeiras reações à falha não demoraram a surgir na Inglaterra. O Telegraph relatou que a raiz do risco não está apenas na confiabilidade do modelo F-35, e sim  na estratégia de aquisições o Ministério da Defesa britânico aplica há décadas. Eles priorizam pequenas quantidades de equipamentos de alta tecnologia em detrimento da massa operacional.

Em outras palavras, falhas mecânicas em sistemas complexos como o F-35B são inevitáveis e fazem parte do ciclo de vida de qualquer tecnologia avançada, mas o que não se pode permitir é que a perda temporária de um único avião represente uma redução de 6% na capacidade de combate, ou que uma avaria naval paralise metade de um grupo de escoltas. Segundo o jornal, a lição desses incidentes não é questionar o valor da aeronave, mas reconhecer que o Reino Unido precisa de mais quantidade de tudo: mais caças, mais navios, mais pessoal e mais resiliência.

Caças

Zombarias e propaganda

A Forbes relata que a natureza das últimas falhas do caça, apesar de sua baixa gravidade técnica, serviu de combustível para propaganda em Pequim e Moscou. Ao que parece, veículos de comunicação e comentaristas na China e na Rússia, como Wang Ya’nan, editor da Aerospace Knowledge, colocaram em dúvida a capacidade britânica de manter em serviço um caça furtivo de quinta geração em um desdobramento prolongado.

Nas redes sociais, contas como a Sputnik India ironizaram dizendo que o HMS Prince of Wales “coleciona pousos de emergência como souvenirs”, enquanto outras ridicularizaram a reputação do F-35 da LM com comentários como “WORLD’S BEST JET… REALLY?”. Analistas como Cliff Lampe alertam que essas narrativas se amplificam quase imediatamente no ambiente digital atual, onde a viralidade e a ausência de moderação permitem que desinformação, zombaria e propaganda se misturem a interesses econômicos ou políticos.

Querala, na Índia, também aproveitou episódio do caça pousado para se promover Querala, na Índia, também aproveitou episódio do caça pousado para se promover

Guerra informativa

O caso do F-35 se soma a um padrão de ataques midiáticos contra sistemas de armas de alto perfil utilizados por potências ocidentais. Exemplos recentes incluem a ofensiva discursiva chinesa contra o Dassault Rafale após o abate de um exemplar indiano por um míssil ar-ar PL-15 de fabricação chinesa, ou a campanha nas redes chinesas contra o caça russo Su-57 antes da feira aérea de Zhuhai.

Essas dinâmicas mostram como os rivais geopolíticos utilizam incidentes isolados para alimentar narrativas de fragilidade tecnológica ou logística, explorando a suscetibilidade do público e da imprensa a histórias de falhas em equipamentos militares avançados.

Para a Lockheed Martin, fabricante do F-35, este novo incidente se soma a um período mais que complicado, após as decisões da Espanha e da Suíça de explorar alternativas e dois acidentes recentes na Califórnia e no Alasca.

Embora o acúmulo de ocorrências possa afetar a percepção pública, o programa F-35 mantém um posicionamento sólido graças à sua profunda integração nas forças aliadas, aos investimentos já realizados, às suas vantagens em interoperabilidade e ao respaldo político que garante sua continuidade. A estratégia imediata passa por devolver o quanto antes o F-35B afetado às operações a partir do Japão ou reincorporá-lo ao porta-aviões, enquanto se controla a narrativa internacional para apresentar esses casos como falhas isoladas, evitando que sejam interpretados como problemas estruturais.

Mais além do impacto na imagem do F-35, os incidentes levantam questionamentos sobre a capacidade do Reino Unido para sustentar confrontos a grande distância com artigos de última geração e sobre a resiliência logística de sua frota aérea embarcada.

O desdobramento no Indo-Pacífico, apenas o segundo de um porta-aviões britânico no século XXI, faz parte de uma estratégia para reforçar alianças e demonstrar presença em uma região marcada pela competição com a China. No entanto, episódios como esses podem ser percebidos por parceiros e rivais como sinais de vulnerabilidades operacionais, reduzindo o impacto dissuasório da missão e oferecendo a potências concorrentes um relato alternativo que explora cada avaria como símbolo de limitações estruturais.

Imagem | RawPixel, RawPixel

Este texto foi traduzido/adaptado do site Xataka Espanha.

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