Aves brasileiras podem ter sido infectadas com vírus para serem usadas como armas biológicas durante a ditadura militar

Documentos revelam que Belém pode ter sido usada como base de experimentos biológicos conduzidos por pesquisadores ligados ao Exército dos EUA

Pássaros voando. Créditos: Jamie Lamb/ GettyImages
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Laura Vieira

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Laura Vieira

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Jornalista recém-formada, com experiência no Tribunal de Justiça, Alerj, jornal O Dia e como redatora em sites sobre pets e gastronomia. Gosta de ler, assistir filmes e séries e já passou boas horas construindo casas no The Sims.

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Uma guerra biológica, causada pela disseminação de agentes biológicos como vírus e bactérias, é uma das maiores preocupações globais. Por isso, o uso de armas químicas e biológicas foi proibido após a Primeira Guerra Mundial, em um acordo internacional conhecido como Protocolo de Genebra de 1925.

Mas e se te dissessem que o Brasil pode ter contribuído, ainda que indiretamente, para o desenvolvimento desse tipo de armamento? Uma investigação conduzida pela historiadora Laura de Oliveira Sangiovanni, da Universidade de Brasília, aponta que o país pode ter servido de base para testes norte-americanos com aves infectadas por vírus durante a Guerra Fria, em um projeto que transformou Belém, atual sede da COP30, em um possível laboratório biológico clandestino.

Pesquisadora descobre por acaso que aves brasileiras já foram testadas para serem armas biológicas

Em 2017, a historiadora Laura recebeu um convite para visitar o Museu Nacional de História Natural do Smithsonian, em Washington, D.C, Estados Unidos. Mas ao chegar lá, o que parecia uma simples pesquisa de campo se transformou em uma descoberta chocante: centenas de aves amazônicas empalhadas, armazenadas em gavetas metálicas, faziam parte de um acervo de mais de quatro mil exemplares brasileiros coletados durante a ditadura militar.

O convite surgiu a partir de uma conversa com a diretora do museu, que a alertou sobre um programa polêmico da instituição. Ela revelou que o ornitólogo Philip Strong Humphrey coordenou o Pacific Ocean Biological Survey Program (POBSP), um projeto acusado de realizar testes de armas biológicas em aves, em parceria com o Exército dos Estados Unidos e o centro de guerra química Fort Detrick, em Maryland, entre os anos de 1963 e 1970. Ao investigar as informações compartilhadas pela diretora, Laura descobriu que o ornitólogo também liderava um projeto parecido no Brasil: o Belém Ecological Project (BEP). O projeto, no entanto, além de carecer de documentos e quase não ser conhecido pela historiografia brasileira, apresenta algumas inconsistências burocráticas. 

Projeto Ecológico Belém: entenda qual era o objetivo 

O Projeto Ecológico Belém funcionava sob a fachada de ser uma pesquisa ecológica, mas há indícios de que ele tenha sido uma operação militar americana, bem na floresta amazônica. Durante os quase 8 anos de duração do projeto, Phillip e sua equipe atuaram na Área de Pesquisas Ecológicas do Guamá (APEG), em Belém, com apoio do Instituto Evandro Chagas e da Fundação Rockefeller, que já tinha um laboratório de vírus na região. 

Após estudar os documentos do projeto, Laura passou a acreditar que a fundação servia como uma espécie de “blindagem institucional”, permitindo a entrada de pesquisadores estrangeiros sem a necessidade de autorização oficial do governo brasileiro. Os relatórios e correspondências revelam que Phillip chegou ao país com bisturis, formol, armas e munição, e que o projeto passou a se interessar por virologia, especialmente pelo papel das aves como vetores de vírus.

Estima-se que mais de 4500 aves tenha sido coletadas e retiradas do Brasil

De acordo com o banco de dados do Museu Nacional de História Natural do Smithsonian, foram enviadas 4.426 aves brasileiras para o seu acervo. Contudo, não foi encontrado nenhum registro da saída dessas aves na Alfândega de Belém. Também não existem menções ao projeto nos arquivos do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico ou do Serviço Nacional de Informações, .

Devido a falta de registros, tudo indica que o programa tenha operado bem no limite da burocracia brasileira, sem deixar rastros. Ao cruzar fontes e documentos, Laura acredita que Belém pode ter sido usada como uma espécie de “campo de testes” para entender o comportamento de vírus em aves e transformá-las em vetores de armas biológicas.


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