A psicologia do doomscrolling: a armadilha na qual nosso cérebro está programado para cair repetidamente

  • Somos programados para buscar informações úteis, mas às vezes encontramos algo completamente diferente.

  • A psicologia do hábito de rolar a tela sem parar para notícias ruins apresenta alguns paralelos com a de qualquer outro vício.

"Doomscrolling" pode levar à depressão | Imagem: Eddy Billard
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Igor Gomes

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Igor Gomes

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Subeditor do Xataka Brasil. Jornalista há 15 anos, já trabalhou em jornais diários, revistas semanais e podcasts. Quando criança, desmontava os brinquedos para tentar entender como eles funcionavam e nunca conseguia montar de volta.

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Rolar a tela tornou-se parte da nossa rotina à medida que as redes sociais se tornaram mais presentes no nosso dia a dia. Tornou-se tão automático que até inventamos um segundo termo para quando passamos horas absortos a percorrer publicações: "doomscrolling".

A própria expressão já indica o problema: o termo "condenação" geralmente se refere à fada madrinha, a um destino fatal. Vagar sem rumo entre publicações muitas vezes gera uma sensação de desconforto causada pelo tempo perdido, pela condenação.

Mas o que exatamente acontece em nossas cabeças e cérebros quando rolamos a tela? Ouvimos frequentemente que os aplicativos são projetados para serem viciantes e nos fazer passar mais horas navegando em seu conteúdo, então deve haver alguma ciência por trás disso.

Tudo pode ter começado com uma predisposição evolutiva.

Como Ariane Ling, da Universidade NYU Langone, explicou à BBC, nós, seres humanos, somos naturalmente curiosos sobre o que acontece ao nosso redor. Isso se manifesta de várias maneiras, desde o nosso interesse pelas notícias até a atenção que damos aos acidentes de trânsito que presenciamos, destaca ela. Tudo isso faz parte de nossas estratégias de sobrevivência. Os celulares nos conectam a essas informações; na verdade, eles nos oferecem um fluxo avassalador de estímulos informativos.

Em outro artigo da BBC, Pamela Rutledge, diretora do Centro de Pesquisa em Psicologia da Mídia, acrescentou uma ligação entre o hábito de rolar a tela incessantemente em busca de notícias ruins e o medo que frequentemente associamos a esse tipo de estímulo informativo. Para Rutledge, o ato de ficar absorto em nossos celulares "realmente descreve a necessidade compulsiva de tentar obter respostas quando estamos com medo".

Existem fatores que influenciam o nosso nível de envolvimento em cada situação. Em 2021, dois pesquisadores da Universidade Cornell e da Wharton School publicaram os resultados de uma série de estudos realizados com mais de 6.000 participantes.

Um dos experimentos consistia em mostrar aos participantes vários videoclipes e, em seguida, perguntar se eles preferiam assistir a outro vídeo ou iniciar uma tarefa específica. Os pesquisadores observaram que aqueles que assistiram a apenas um vídeo estavam mais propensos a realizar a tarefa do que aqueles que assistiram a cinco vídeos. Além de não se cansarem de assistir aos vídeos, quanto mais assistiam, mais queriam ver.

O segundo estudo focou na homogeneidade dos vídeos. Desta vez, todos assistiram aos mesmos vídeos, mas a equipe alterou a classificação. Assim, aqueles que assistiram a mais vídeos "homogêneos" (mesmo que não fossem de fato homogêneos) apresentaram maior probabilidade de assistir a mais vídeos.

O terceiro estudo focou na intensidade. Desta vez, um grupo de participantes alternava tarefas com vídeos, enquanto o outro assistia aos vídeos continuamente e completava as tarefas em um único bloco. Nesse caso, aqueles que assistiram aos vídeos sem interrupção demonstraram maior disposição para continuar.

E quanto ao nosso cérebro?

Mas se quisermos entender o que acontece em nossos cérebros quando estamos vidrados em nossos celulares, precisamos investigar os centros neurais onde as sensações de prazer são processadas. Nesse sentido, o hábito de rolar a tela sem parar não é muito diferente do uso de drogas ou outros vícios.

A forma como nosso cérebro nos "guia" na busca por informações é através de seu sistema de recompensa. Um dos componentes-chave desse sistema é a dopamina. Esse hormônio também é liberado pelos nossos neurônios quando usamos nossos celulares, proporcionando-nos essa recompensa.

Nosso cérebro não consegue distinguir entre coletar informações úteis sobre o ambiente ao nosso redor e observar fotos de animais ou ler notícias alarmantes sobre a situação mundial. Em todos esses casos, o processo de liberação de neurotransmissores é o mesmo, e o resultado é idêntico: queremos mais.

Mas essa facilidade de acesso à informação tem um preço. O hábito de rolar a tela sem parar (doomscrolling) tem sido associado a impactos negativos na nossa saúde mental. Existem diversos mecanismos pelos quais esse dano pode ocorrer. De uma perspectiva bioquímica, uma hipótese sugere que, quando mais dopamina é secretada do que o cérebro consegue reabsorver, ele perde a capacidade de "reconfigurar", o que pode levar à ansiedade ou depressão.

Outro problema surge da falta de sono. O uso de telas à noite pode interferir nos nossos padrões de sono, portanto, perder a noção do tempo olhando para o celular antes de dormir pode causar problemas de sono.

Por fim, certos tipos de conteúdo, como notícias pessimistas, também podem gerar ansiedade. Outros conteúdos que podem causar confusão incluem relatos contraditórios de diferentes fontes, que podem "nos enlouquecer", observou a psicóloga Susan Albers, da Cleveland Clinic.

Quais são algumas dicas para evitar o hábito de rolar a tela sem parar? Primeiro, podemos tentar identificar o problema. Para isso, podemos tomar medidas drásticas, como guardar o celular, deixá-lo em outro cômodo enquanto trabalhamos ou tentar dormir. Uma estratégia mais inteligente é tomar consciência do momento em que começamos a rolar a tela automaticamente.

A introspecção é necessária. Outra recomendação comum é também tomar consciência dos nossos sentimentos, procurando sintomas de fadiga mental ou cansaço.

Outras estratégias que podemos usar incluem redirecionar nossa curiosidade para outro lugar ou focar no momento presente. Também podemos evitar nos deter demais nas notícias, tentando não cair no catastrofismo e buscando ativamente histórias positivas.


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