"Nem mesmo minha família entendeu": desenvolvedor trabalhou de graça por 10 anos; hoje, corporações e governos dependem de seu serviço

Hoje, recebe milhões em investimentos, mas o caminho até aqui não foi fácil

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PH Mota

Redator
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Jornalista há 15 anos, teve uma infância analógica cada vez mais conquistada pelos charmes das novas tecnologias. Do videocassete ao streaming, do Windows 3.1 aos celulares cada vez menores.

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Por mais de uma década, Ben Haynes dedicou suas noites e fins de semana a um projeto pessoal que poucos entendiam e (pior), que ninguém financiava: não havia investidores, nem usuários para pagar por licenças ou assinaturas, nem mesmo uma comunidade ativa de desenvolvedores para apoiá-lo.

Apenas ele, seu PC e uma ideia: construir uma ferramenta que facilitasse o gerenciamento de bancos de dados, sem a necessidade de depender de interfaces complicadas como o phpMyAdmin.

Hoje, esse projeto — o Directus — ultrapassou 30 mil estrelas no GitHub, já é usado por governos, grandes corporações e desenvolvedores em todo o mundo e conta com uma equipe global de mais de 50 pessoas. Mas o caminho até aqui não foi nada fácil.

Uma obsessão solitária: os primeiros 10 anos (2004–2014)

Em 2004, antes mesmo de o GitHub existir, Haynes começou a trabalhar no que ele descreve como um "experimento simples": uma ferramenta destinada exclusivamente a facilitar seu trabalho como desenvolvedor freelancer.

"Não era uma startup, eu nem chamava de projeto."

Por 10 anos, ele trabalhou sozinho, sem colaboradores, sem comunidade. Apenas ele mantendo o código, adicionando funcionalidades entre os trabalhos dos clientes e lidando com a pergunta que sua mãe repetia com preocupação:

"Por que você está investindo tanto tempo em algo que está doando de graça?"

Na falta de um roteiro, seu único sinal de progresso era um pequeno contador em sua mesa que marcava as estrelas que o projeto estava ganhando no GitHub.

O ponto de virada: quando alguém acredita no seu projeto (2015–2020)

A verdadeira transformação veio quando Rijk van Zanten se juntou ao projeto. Com a ajuda dele, o Directus passou de código improvisado para software estável, e eles migraram do PHP para o Node.js e do Backbone para o Vue, preparando a base para a escalabilidade. Foi aí que o reconhecimento público começou a chegar.

Mas, como costuma acontecer com o código aberto, com a fama veio também o caos: solicitações específicas, contribuições de qualidade variável e uma necessidade crescente de organização e moderação por parte da comunidade:

"A maioria das solicitações de pull eram soluções específicas, não projetadas para o bem comum. É preciso muito esforço para transformar isso em algo útil para todos."

Foi nessa fase que ele deixou definitivamente sua agência para se concentrar 100% no Directus. Não era mais apenas um experimento: havia se tornado seu grande projeto.

Transformando uma paixão em negócio: o desafio da sustentabilidade (2020–2023)

Com a maturação do projeto, chegou a hora de institucionalizá-lo: fundaram uma empresa, levantaram uma rodada inicial de 1 milhão de dólares e contrataram uma pequena equipe. Então, contra todas as probabilidades, outros 8 milhões chegaram.

Mas com o crescimento, veio o dilema clássico do software livre: como sustentar financeiramente um projeto aberto? Aqui, Haynes e sua equipe decidiram não comprometer seu compromisso com o código aberto.

Eles trabalharam com Bruce Perens, cofundador da Open Source Initiative, para criar uma licença que permitisse que o projeto permanecesse gratuito para a maioria, mas que exigisse uma contribuição justa das grandes empresas que lucravam com o software sem trazer nada em troca.

A comunidade participou do processo: "Não tomamos decisões em segredo. [...] Isso significava que, mesmo em tempos difíceis, a maioria dela permaneceu conosco." Diante das críticas que agora acusam a equipe de "se tornar outro Strapi" ou de "se vender ao capital", a resposta é contundente:

"Esta não é uma mudança ideológica, é uma tentativa de impedir que o projeto se torne um abandonware."

O presente: uma comunidade, uma empresa, uma força motriz

O Directus se tornou uma plataforma de gerenciamento de dados adotada globalmente. Eles estão no meio de uma grande reformulação da base de código, mas, mesmo tendo agora uma equipe, clientes renomados e uma posição sólida, Haynes não se esquece do que significa estar sozinho, acreditando em algo que só você vê:

"Os primeiros dez anos foram de trabalho gratuito. E sim, nem minha família entendia. Mas agora, quando olho para trás, entendo que isso foi necessário para chegar aqui."

Lições de uma jornada improvável

Ao longo de seus 21 anos no Directus, Ben Haynes acumulou lições valiosas para qualquer desenvolvedor, empreendedor ou entusiasta de software livre:

  • Desenvolva para si mesmo primeiro. Se não resolver o seu problema, não resolverá o de ninguém.
  • A simplicidade permite escalabilidade, mas o mesmo acontece com a dívida técnica. É por isso que saber quando dizer "não" é essencial para se manter no caminho certo.
  • Software livre não é trabalho gratuito. Modelos de negócios sustentáveis devem ser planejados.
  • A comunidade não é um canal de marketing. É o motor que move tudo.

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