Tendências do dia

Pesquisadores descobrem restos mortais de episódio de violência extrema na Inglaterra; há até indícios de canibalismo

Evidências raras de violência extrema na Idade do Bronze britânica desafiam a visão pacífica do passado

Sinais encontrados em ossos de ao menos 37 indivíduos sugerem que eles foram barbaramente assassinados, desmembrados e canibalizados — Foto: Antiquity/Cover Images/picture alliance
Sem comentários Facebook Twitter Flipboard E-mail
sofia-bedeschi

Sofia Bedeschi

Redatora

Jornalista com mais de 5 anos de experiência no ramo digital. Entusiasta pela cultura pop, games e claro: tecnologia, principalmente com novas experiências incluídas na rotina. 

No início da Idade do Bronze, um trágico e violento evento marcou uma comunidade no sudeste da Inglaterra. Em Charterhouse Warren, no condado de Somerset, um abismo natural de 15 metros revelou ossos de pelo menos 37 pessoas – homens, mulheres e crianças – brutalmente assassinadas, desmembradas e, possivelmente, consumidas. Pesquisadores apontam que o massacre, ocorrido há cerca de 4 mil anos, representa uma escala de violência sem precedentes na pré-história britânica.

A descoberta foi inicialmente feita na década de 1970, mas apenas agora, com o avanço das tecnologias de análise forense, detalhes aterrorizantes foram confirmados. Os ossos apresentam marcas de cortes e fraturas realizadas no momento da morte, indicando práticas de descarnamento e possível canibalismo.

Um episódio único e brutal

O estudo, publicado na revista científica Antiquity por pesquisadores da Universidade de Oxford, descreve o evento como algo esporádico e incomum. "As evidências sugerem que os corpos foram tratados de forma intencional para humilhar e desumanizar as vítimas", afirma Rick Schulting, autor principal da pesquisa. Os restos humanos foram descartados no abismo junto com ossos de animais, como se os indivíduos fossem reduzidos à condição de presas.

A análise revelou que as vítimas provavelmente foram surpreendidas, sem sinais de resistência. "Isso indica que elas foram apanhadas de surpresa, resultando em uma carnificina conduzida por inimigos que podem ter buscado não apenas matar, mas destruir simbolicamente a identidade dessas pessoas", explicou Teresa Fernández-Crespo, coautora do estudo.

Por que tamanha violência?

Embora existam registros de canibalismo em sítios como a caverna de Gough, no desfiladeiro de Cheddar, esses casos, ocorridos 10 mil anos antes, são geralmente associados a rituais funerários. Charterhouse Warren, no entanto, conta uma história diferente.

Os pesquisadores acreditam que o canibalismo praticado nesse evento foi uma forma deliberada de desumanizar os mortos. "Misturar ossos humanos aos de animais e consumir a carne das vítimas era uma forma de reduzi-los à condição de animais", afirmou Fernández-Crespo.

As razões para tamanha violência permanecem um mistério. Não foram encontradas evidências genéticas ou isotópicas que apontem para diferenças étnicas ou culturais entre os envolvidos.

A principal hipótese sugere tensões entre comunidades vizinhas, talvez agravadas por ofensas ou desavenças que resultaram em uma retaliação desproporcional.

"Charterhouse Warren nos lembra que as pessoas na pré-história eram capazes de atrocidades tão brutais quanto aquelas vistas em tempos mais recentes", disse Schulting.

Contexto histórico e social

O massacre ocorreu entre 2.210 e 2.010 a.C., período marcado pelo surgimento de novas práticas sociais na Idade do Bronze. Embora os registros arqueológicos dessa época raramente mostrem evidências de conflitos violentos, Charterhouse Warren destaca-se como uma exceção sombria.

"Embora tenhamos encontrado indícios de violência em períodos neolíticos, a Idade do Bronze costuma apresentar registros mais pacíficos", ressalta Schulting. Essa discrepância torna o sítio de Charterhouse Warren uma peça crucial para compreender as dinâmicas de conflito em sociedades pré-históricas.

Pesquisadores supõem que atos violentos teriam por objetivo humilhar e desumanizar as vítimas — Foto: Antiquity/Cover Images/picture alliance

Charterhouse Warren no contexto da história britânica

O caso de Charterhouse Warren ecoa outros eventos de canibalismo já registrados, mas destaca-se pelo contexto de extrema violência. Ele oferece uma janela para o passado que desafia a visão romantizada de uma sociedade pré-histórica pacífica, revelando o lado mais sombrio das relações humanas.

A descoberta continua a intrigar os cientistas e, com isso, Charterhouse Warren permanece como um dos sítios arqueológicos mais perturbadores do Reino Unido. Ele nos força a reavaliar o passado, lembrando que as atrocidades humanas têm raízes profundas na história.

Inicio