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A China conseguiu com seu trem-bala o que parecia impossível: tornar inviáveis financeiramente as companhias aéreas em viagens de 1.300 km

Pequim e Xangai estão separadas por 1.300 quilômetros, mas um trem-bala consegue ligar as duas em pouco mais de quatro horas. As companhias aéreas transportam seis vezes menos passageiros nesse trajeto do que o trem.

trem bala china é rápido. Imagem: Foto  |  N509FZ
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Sofia Bedeschi

Redatora

Jornalista com mais de 5 anos de experiência no ramo digital. Entusiasta pela cultura pop, games e claro: tecnologia, principalmente com novas experiências incluídas na rotina. 

Usain Bolt deixando sete adversários pra trás, desacelerando nos últimos 15 metros e, ainda assim, correndo mais rápido do que qualquer humano já correu. Existe metáfora melhor pra explicar o lançamento dos trens de alta velocidade chineses?

Naquele ano, enquanto Usain Bolt voava dentro do Ninho de Pássaro, o estádio dos Jogos Olímpicos de Pequim, a China aproveitava o momento pra mostrar ao mundo que já era um país moderno. E parte dessa modernidade, claro, passava por suas linhas de trem de alta velocidade, que entraram em operação justamente naquele ano.

Dezessete anos depois, a China é o país com a maior malha ferroviária de alta velocidade do mundo. Assim como Bolt em 2008, o crescimento foi tão insano que deixou pra trás potências como França e Japão.

Em menos de duas décadas, o impacto da alta velocidade na China foi enorme. Ter uma malha ferroviária bem estruturada num país do tamanho da China é essencial pra facilitar os deslocamentos de longa distância. E, por enquanto, eles estão conseguindo convencer a população. Tanto que as companhias aéreas já soaram o alarme: os trens estão roubando seus passageiros.


Melhor de trem

A chegada dos trens-bala na China mudou completamente a forma como os chineses encaram as viagens. No fim de 2024, o país apresentou seu trem mais avançado, capaz de atingir impressionantes 450 km/h. O CR450AF é só o exemplo mais recente do ritmo acelerado do desenvolvimento chinês. Ele deve começar a operar ainda este ano nas linhas de alta velocidade já existentes, o que significa que, por enquanto, vai circular a até 350 km/h. A meta, porém, é ter até 2027 as ferrovias prontas pra sustentar velocidades acima dos 400 km/h.

Com isso, os viajantes vão ter mais um bom motivo pra escolher o trem na rota entre Pequim e Xangai. Segundo o South China Morning Post, no ano passado esse trajeto foi feito por 52 milhões de passageiros de trem, contra apenas 8,6 milhões que optaram pelas companhias aéreas.

Esse volume de passageiros fez o serviço crescer 3,62% em receita, somando mais de 42 bilhões de yuans cerca de 5,8 bilhões de dólares. Já o lucro líquido disparou 10%, alcançando 12,8 bilhões de yuans, ou quase 1,8 bilhão de dólares. O tráfego é tão intenso que 100 trens circulam diariamente entre as duas cidades.

Pra entender por que o trem venceu o avião nessa rota, basta olhar os números. Pequim e Xangai estão separadas por pouco mais de 1.300 quilômetros, mas o trem-bala chinês atual consegue fazer esse trajeto em apenas quatro horas e dezoito minutos. No pior dos cenários, mesmo com todas as paradas, a viagem não passa de oito horas.

Além da alta frequência e do tempo reduzido de trajeto, tem outro fator que pesa bastante nessa equação. Segundo o South China Morning Post, pra muita gente é simplesmente indispensável continuar conectada enquanto viaja. E, enquanto no avião isso ainda é praticamente inviável, no trem essa conexão digital está praticamente garantida. Aliás, se os Jogos Olímpicos de Inverno de Pequim deixaram algo claro, foi justamente isso: garantir conectividade virou prioridade absoluta.

O South China Morning Post destaca que, segundo a Associação de Transporte Aéreo da China, a concorrência entre avião e trem já pode ser considerada "erosionada".

Até as classes mais altas estão migrando para os trilhos. Diante desse cenário, China Eastern Airlines e Air China decidiram unir forças recentemente, numa tentativa de conter a fuga constante de passageiros para os trens.

As duas companhias aéreas operam juntas 55 voos entre Pequim e Xangai e, por muito tempo, contaram com a classe alta como um dos públicos mais fiéis. Mas a realidade mudou. A facilidade de sair e chegar diretamente no centro da cidade, a pontualidade dos trens e a possibilidade de se manter conectado durante toda a viagem estão atraindo cada vez mais passageiros.

Tentando conter essa perda, as companhias passaram a oferecer facilidades como remarcação de voos mais flexível e até limusines para levar os clientes até o centro das cidades.

Ainda assim, as aéreas já avisam que, se essas medidas não surtirem efeito, não vai restar alternativa a não ser baixar os preços — uma solução que, a cada dia, se mostra menos sustentável. No outro lado dos trilhos, o South China Morning Post também lembra que o sucesso da linha entre Pequim e Xangai ainda é uma exceção. Muitas linhas no interior do país operam no vermelho e enfrentam dificuldades pra se manter.

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