O Orion era a versão russa do drone mais letal dos EUA; a Ucrânia fica incrédula ao abri-lo: não é uma versão, é uma criação americana

A descoberta destaca a fragilidade dos mecanismos de controle de exportação

Imagem de capa | Boevaya mashina, Mike1979 Russia
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Fabrício Mainenti

Redator

Se algo ficou cristalino para o governo ucraniano nestes mais de três anos de guerra após a invasão russa, é que os mecanismos internacionais de sanções têm uma enorme brecha. As evidências falam por si, já que os serviços de inteligência de Kiev possuem centenas de relatórios revelando que os drones russos ignoraram completamente essas sanções. E não apenas drones, mas também tanques, mísseis de cruzeiro e balísticos.

A novidade: o drone mais sofisticado do Kremlin é, essencialmente, americano.

O Orion é ocidental

A inteligência ucraniana revelou que o Orion, o principal drone de ataque da Rússia, pesando uma tonelada e com aparência quase idêntica ao MQ-9 Reaper americano, depende fortemente de componentes eletrônicos fabricados nos Estados Unidos e em outros países ocidentais.

Construído pela empresa russa Kronstadt (já sancionada por seu envolvimento na máquina de guerra do Kremlin), o Orion foi concebido como a joia dos veículos aéreos não tripulados russos, capaz de transportar até 250 quilos de bombas guiadas e mísseis da série Kh, voar por trinta horas e operar a um alcance de aproximadamente 250 quilômetros, extensível a 300 quilômetros por meio de um sistema de retransmissão.

A pegadinha

No entanto, sua sofisticação tecnológica reside em uma rede opaca de fornecedores internacionais: sensores, módulos de navegação e microchips de empresas como Motorola, AMD, Texas Instruments, Analog Devices e Maxim são integrados aos seus principais sistemas de controle e reconhecimento.

Imagem | Boevaya mashina, Mike1979 Russia

Dependência tecnológica e brechas

O relatório da Diretoria Principal de Inteligência da Ucrânia (HUR), publicado em 5 de novembro em seu portal War&Sanctions, inclui uma análise técnica completa do drone, com um modelo 3D e uma lista de 43 empresas russas envolvidas em sua produção. Destas, quase um terço não está sujeito a sanções dos países da coalizão internacional, o que permitiu um fluxo constante de componentes críticos por meio de intermediários e países vizinhos.

Embora as exportações diretas de microchips para a Rússia tenham caído drasticamente após a invasão de 2022, as vendas para a Turquia dobraram, as para a Geórgia aumentaram 35 vezes e as para o Cazaquistão, mil vezes, no que analistas interpretam como uma rede de triangulação projetada para burlar os controles de exportação. Para Kiev, a única maneira de conter esse fluxo é impor um rastreamento rigoroso de cada componente, obrigando as empresas a marcar seus produtos com números únicos que permitam rastrear seu trajeto até o usuário final.

A faca de dois gumes do rearme russo

O Orion foi anunciado como a resposta russa ao Reaper americano, mas sua trajetória tem sido bastante irregular. Embora Moscou o tenha apresentado como operacional na Síria, sua produção em série só começou em 2022, coincidindo com a invasão em larga escala da Ucrânia. A proeminência da aeronave foi rapidamente ofuscada pelos drones Shahed, de projeto iraniano, cuja produção local na fábrica de Alabuga substituiu em grande parte o projeto russo original.

Apesar disso, o Orion permanece um símbolo da tentativa da Rússia de desenvolver capacidades de alta tecnologia nacionais, ao mesmo tempo que demonstra sua incapacidade estrutural de operar independentemente do ecossistema industrial ocidental. O paradoxo, sem dúvida, reside no fato de que o próprio drone usado para bombardear o território ucraniano depende de componentes eletrônicos de empresas americanas que operam sob um regime de sanções concebido precisamente para impedi-las de fazê-lo.

Implicações e riscos

A descoberta de componentes estrangeiros em armamentos russos vai além da guerra na Ucrânia: ela destaca a fragilidade dos mecanismos de controle de exportação e a natureza transnacional do mercado de tecnologia de dupla utilização, que pode servir tanto a fins civis, quanto militares. A HUR alertou que essas brechas permitem que a Rússia sustente seu esforço de guerra apesar das restrições, prolongando o conflito e ameaçando a segurança global.

Especialistas apontam que o desafio reside não apenas em impedir remessas ilegais, mas também em redesenhar um sistema de monitoramento que rastreie de forma abrangente o destino de cada microchip e módulo eletrônico, algo que atualmente parece inviável, dada a complexidade das cadeias de suprimentos globais. 

Assim, o caso Orion torna-se uma metáfora apropriada para a nova face da guerra tecnológica: uma guerra travada não apenas nos campos de batalha, mas também nos circuitos de silício silenciosos que cruzam fronteiras disfarçados de comércio legítimo.

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