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O iPhone é fabricado na China, não apenas para economizar custos: o verdadeiro motivo pelo qual Cook descartou o plano de Steve Jobs

Visão inicial de Steve Jobs colidiu com necessidade econômica e pragmatismo operacional de Tim Cook Escolha da Foxconn na China, ao mesmo tempo em que catapultou o iPhone, também prendeu a Apple a uma profunda dependência

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PH Mota

Redator

Jornalista há 15 anos, teve uma infância analógica cada vez mais conquistada pelos charmes das novas tecnologias. Do videocassete ao streaming, do Windows 3.1 aos celulares cada vez menores.

A história que liga a Apple e a China é, no mínimo, peculiar. Essa relação para a fabricação do iPhone é uma história de necessidade, ambição e consequências não intencionais. Embora hoje sua possível diversificação para driblar tensões geopolíticas e a acirrada competição local seja debatida, os fundamentos dessa dependência foram forjados anos atrás.

A China sempre foi um território a ser conquistado pela empresa californiana, além de um desafio árduo devido ao sigilo do gigante asiático: isso pode ser visto nesta história que destaca a diferença de ideias entre Jobs e o atual CEO, que determinou o que a empresa da maçã mordida é hoje.

Do sonho de um iPhone "Made in California" à dura realidade da sobrevivência

A filosofia inicial de Jobs era controlar todos os aspectos da fabricação do hardware da Apple: "Eu não confiava em nenhum fornecedor para ter o know-how necessário para fabricá-lo". Isso, segundo alguns funcionários que trabalharam com ele, que disseram que ele "permaneceu firme em sua crença original de que controlar o hardware significava fabricá-lo".

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Apesar disso, a empresa teve que sucumbir à terceirização tática, primeiro para os iMacs. Durante seu exílio na NeXT, a empresa que criou ao deixar a Apple, Jobs disse que sua coisa favorita sobre computadores era que "eles não eram feitos em Osaka", mais um exemplo de sua visão. No entanto, Robert Brunner (chefe de design) admitiu que o PowerBook 100 fabricado pela Sony japonesa era "um produto melhor" do que os modelos 140 e 160 fabricados pela Apple.

Tempestade perfeita

A crise financeira da Apple no final dos anos 90 trouxe mudanças importantes para o futuro que então se vislumbrava. Em março de 1996, a empresa da maçã anunciou prejuízos de 700 milhões de dólares (quase R$ 4 bi). Uma "espiral da morte" para o então CFO da Apple, Fred Anderson,que  só cessou com a chegada de Tim Cook em 1998. Isso foi fundamental para Jobs, pois ele buscava uma figura que "incorporasse todas as coisas em que ele não era bom e nas quais não se importava em pensar".

China no radar

A complexa cadeia de suprimentos do iMac G4, com componentes de até seis países asiáticos, mostrou-se "ineficiente, lenta e cara", levando a Apple a buscar consolidação. "Só havia um lugar para onde recorrer", diz o livro de Patrick McGee, "Apple in China". Mesmo antes do computador ser lançado, a Apple já incentivava seus parceiros, de Cingapura ao Japão, a estabelecer operações na China.

A Foxconn foi a aposta "kamikaze" que mudou tudo.

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Foi quando Terry Gou entrou em cena. O fundador da Foxconn assumiu o controle do problema da Apple e disse a Tim Cook: "Eu posso consertar isso". Gou estava incansavelmente focado em fazer o que fosse necessário para o sucesso da Apple.

"Velocidade chinesa" e sua flexibilidade, armas secretas

Os engenheiros da Apple ficaram perplexos com o que foi chamado de "velocidade da China": sua capacidade de fazer as coisas em um ritmo incompreensível para visitantes ocidentais. Gou prometeu ferramentas para o iMac em 25 dias, uma mudança substancial em relação às 12 semanas habituais. Jon Rubinstein, um importante designer do iPod, disse que Gou apontou para um terreno baldio enquanto transmitia uma mensagem poderosa: "aqui está sua fábrica". Meses depois, a fábrica estava em operação.

Medidas extremas da Apple

Na época, a Apple via na China "exércitos de mão de obra acessível e disponível" que permitiam um design irrestrito, intrincado e complexo, uma galinha dos ovos de ouro. No entanto, as semanas de trabalho de oitenta horas e a crescente necessidade de estar na Ásia colocaram enorme pressão sobre a saúde mental dos engenheiros e seus casamentos. Foi daí que surgiu o termo "viúvas da Apple". A resposta deles foi o DAP, ou Programa de Prevenção ao Divórcio.

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iPhone como ponto sem retorno

O principal produto da Apple foi seu primeiro celular, inicialmente chamado de "Purple Project", para o qual Chip Hills (executivo de operações da Apple) escolheu a Foxconn como parceira de fabricação: uma decisão fundamental e sem volta. Os esforços da empresa californiana para diversificar fora da China são custosos, ressaltando a profundidade dessa dependência original que Jobs não considerou.

O resto é história

A Apple, de mãos dadas com a Foxconn e a eficiência chinesa, conquistou o mundo com o iPhone. Mas essa simbiose, nascida da necessidade e da oportunidade, forjou uma dependência tão profunda que hoje qualquer tentativa de separação parece um

Utopia. A situação atual distancia a Apple do gigante asiático: como sugere McGee, um iPhone sem a Foxconn parece mais uma "fantasia do que uma realidade", apesar das pressões geopolíticas e dos cantos de sereia de uma produção totalmente ocidentalizada. Jobs também não tinha muita fé em um iPhone "Made in the USA", como não tinha em sua época na China. Ele se mostrou errado.

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