Pode um bloco de pedra do tamanho de um ônibus escolar “caminhar”? Pode uma rocha que pesa toneladas e mede vários metros de comprimento se deslocar sozinha? A resposta mais lógica é (evidentemente) não. Mas a história é outra quando falando dos moai da Ilha de Páscoa, as inconfundíveis esculturas esculpidas e espalhadas pela ilha polinésia há vários séculos pelo antigo povo Rapa Nui.
Além de seu significado, características e design, os arqueólogos sempre se perguntaram como diabos os nativos conseguiram transportar aquelas massas de várias toneladas das pedreiras até os ahu, as plataformas cerimoniais onde eram erguidas. A resposta era exatamente essa: nada mais, nada menos que “caminhando”.
Um mistério antigo
Poucas esculturas no mundo são tão icônicas, inconfundíveis e fascinantes quanto os moai da Ilha de Páscoa, as enormes cabeças de pedra que parecem brotar da terra nessa distante ilha oceânica. Desde que Jacob Roggeveen e sua tripulação chegaram ali, em 1722, o mundo se pergunta para que serviam, o que representam e, claro, como seus criadores, o povo Rapa Nui, conseguiram transportá-los das encostas vulcânicas até seus destinos.
As estátuas foram esculpidas principalmente em toba vulcânica do vulcão inativo Rano Raraku, medem vários metros de comprimento e pesam toneladas. De fato, estima-se que, em média, tenham cerca de 4,5 metros e 10 toneladas, embora existam exemplares maiores. Considerando isso e o fato de precisarem ser transportadas das pedreiras até suas plataformas, como os ilhéus conseguiam movê-las?
Não é uma pergunta trivial se lembrarmos que, na ilha, existem centenas e centenas de estátuas, algumas com o torso enterrado, fabricadas principalmente entre os séculos 13 e 16. O transporte dessas esculturas despertou tanta curiosidade que, ao longo das últimas décadas, surgiram diversas teorias — como a de que as figuras eram deitadas em uma espécie de trenó de madeira com cordas. Agora, um grupo de pesquisadores acredita ter resolvido o debate de uma vez por todas. E a resposta tem pouco a ver com reboques, cargas horizontais ou troncos.
Esculturas “andantes”
As antigas lendas de Rapa Nui afirmavam que os moai chegavam “caminhando” até suas plataformas cerimoniais, os ahu. E, embora essa possibilidade sempre tenha parecido pura fábula, parece que não estava tão longe da realidade. Graças a um estudo que combina física, modelagem 3D e experimentos de campo, uma equipe liderada por especialistas das universidades de Binghamton e Arizona confirmou que “as estátuas realmente caminhavam”. E o mais interessante é que esse processo tinha muito pouco de misterioso. Era física e engenharia simples.
Bastavam apenas cordas, pessoas, trilhas e um design especial.
“Após estudar cerca de mil moai, o professor Carl Lipo e Terry Hunt descobriram que os habitantes de Rapa Nui provavelmente utilizavam cordas e faziam as gigantescas estátuas ‘caminharem’ em zigue-zague por caminhos cuidadosamente planejados”, esclarece um comunicado divulgado pela Universidade de Binghamton.
A teoria em si não é nova. Nos anos 1980, um engenheiro tcheco (Pavel Pavel) já sugeria que os moai se deslocavam eretos graças a um sistema que os impulsionava a partir de dois pontos. O próprio Carl Lipo e seus colegas já haviam defendido, anos atrás, que as estátuas “caminhavam” com movimentos verticais e oscilantes, contrariando a hipótese de que os habitantes de Rapa Nui as transportavam deitadas com a ajuda de troncos. Para demonstrar isso, eles chegaram a fazer uma demonstração prática que chamou a atenção da National Geographic.
Apesar desses esforços, ainda surgiam vozes críticas que questionavam a teoria. E é justamente isso que Lipo e Hunt quiseram resolver agora, utilizando todo o seu arsenal.
Da teoria para os fatos
Para comprovar a validade da teoria e entender melhor o movimento das esculturas, Lipo e seus colegas recorreram a modelos 3D de alta resolução e estudaram minuciosamente o formato dos moai, tanto os que permanecem eretos quanto as dezenas que ficaram pelo caminho quando seus criadores tentavam tirá-las da pedreira. E não parou por aí: a equipe também incorporou evidências práticas ao seu conjunto de argumentos.
Evidências práticas? Sim. Os pesquisadores construíram um moai de 4,35 toneladas e se dedicaram a movê-lo com a ajuda de cordas. O resultado é fascinante e a própria Universidade de Binghamton divulgou o experimento no YouTube.
A equipe precisou de apenas 18 pessoas para deslocar o moai por 100 metros em 40 minutos. “Uma vez que ele entra em movimento, não é difícil. As pessoas puxam usando apenas um braço. Economiza-se energia e ele se move muito rápido”, comenta o professor Carl Lipo. “O complicado é fazê-lo balançar em primeiro lugar”.
Essa experiência, somada aos modelos 3D e demais análises, demonstra, na opinião dos arqueólogos, que suas teorias “realmente funcionam”. E, para calar os críticos, eles registraram tudo em um artigo publicado no Journal of Archaeological Science, com um título tão revelador quanto provocador: “A hipótese do moai andante”.
Outras descobertas
Os pesquisadores também identificaram certas “características distintivas” no design dos moai que, a princípio, tornavam mais viável que eles avançassem com um movimento oscilante e em zigue-zague com a ajuda das cordas. Quais características? Os arqueólogos citam duas em particular: “bases largas em forma de ‘D’ e certa inclinação para frente” (entre 5 e 15º).
Para ser mais preciso, os especialistas notaram bases largas e arredondadas, sobretudo nos moai que ficaram pelo caminho, o que sugere que os ilhéus as utilizavam para deslocá-los (o design ajudava a baixar o centro de gravidade). Depois, quando as figuras alcançavam seu destino, eram esculpidas para assentá-las.
Outra pista encontrada está nos próprios caminhos usados pelos habitantes de Rapa Nui. Sua largura (4,5 metros) e a seção transversal côncava levam os especialistas a pensar que as estradas eram “ideais” para estabilizar as estátuas. “Cada vez que movem uma, parece que estão construindo um caminho”, reflete Lipo. “Na verdade, vemos que eles se sobrepõem e que existem muitas versões paralelas. Provavelmente, o que faziam era limpar um caminho, mover a estátua, limpar outro, limpar mais e mover novamente, seguindo uma sequência”.
Para Lipo e seus colegas, suas conclusões são interessantes por várias razões. Primeiro, porque estão convencidos de que é a melhor teoria para explicar o deslocamento dos moai. De fato, eles desafiam os críticos e defensores de outras hipóteses a provar que estão errados. “Tudo o que vimos e pensamos até agora reforça o argumento”, insistem.
A segunda razão é que, na opinião deles, o estudo valoriza os habitantes da ilha. “Demonstra que o povo de Rapa Nui era incrivelmente inteligente”.
Imagens | Hal Cooks (Unsplash) e Binghamton University – Carl Lipo
Este texto foi traduzido/adaptado do site Xataka Espanha.
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