Mais recente tática da Ucrânia começa com uma canção capaz de “enviar” mísseis russos para o Peru

Parece inacreditável, mas é verdade: uma canção está “enviando” mísseis de Moscou para Lima

Imagem | Administração Estatal da Cidade de Kiev
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PH Mota

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Jornalista há 15 anos, teve uma infância analógica cada vez mais conquistada pelos charmes das novas tecnologias. Do videocassete ao streaming, do Windows 3.1 aos celulares cada vez menores.

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O Kinzhal, apresentado pelo Kremlin como um míssil hipersônico “invencível” capaz de superar qualquer defesa ocidental, passou por uma série de melhorias técnicas com o objetivo de aumentar ainda mais sua letalidade e reduzir as possibilidades de interceptação. Na verdade, até três meses atrás, era uma verdadeira dor de cabeça para as defesas ucranianas.

Até que uma ideia lhes ocorreu... juntamente com uma canção.

Evolução de um míssil

Derivado do Iskander-M e lançado de plataformas aéreas como o MiG-31K ou o Tu-22M3, o míssil combina velocidades que podem atingir Mach 10 com um perfil terminal altamente manobrável, capaz de executar descidas abruptas, mudanças laterais repentinas e trajetórias projetadas para romper a barreira de radar dos mísseis Patriot ucranianos.

Sua capacidade de se camuflar em meio a salvas mistas, misturando-se a mísseis mais lentos, reduziu drasticamente as taxas de interceptação: de 37% em agosto para apenas 6% em setembro. Isso significa que, em teoria, mísseis antes interceptáveis ​​se tornaram ameaças muito difíceis de deter, especialmente quando usados ​​em ataques massivos que combinam centenas de drones e dezenas de mísseis balísticos ou de cruzeiro.

Fraqueza oculta

Contudo, apesar de sua velocidade e manobrabilidade, o Kinzhal possui um calcanhar de Aquiles técnico: depende do sistema de navegação por satélite GLONASS para corrigir erros naturais do sistema inercial, cuja precisão tende a se degradar com o tempo. Diferentemente do INS, o enlace via satélite pode ser manipulado, sofrer interferências ou ser falsificado. E é aqui que reside o avanço ucraniano.

Embora o míssil incorpore antenas receptoras com controle de padrão (aumentando seu número de 4 para 8, 12 e agora 16 elementos em uma tentativa russa de neutralizar interferências), essas defesas eletrônicas se mostraram insuficientes contra sistemas projetados especificamente para as condições da linha de frente. A unidade ucraniana de vigilância noturna demonstrou que, apesar das melhorias russas, os receptores Kometa ainda se baseiam em tecnologia herdada da era soviética, incapazes de resistir a uma falsificação bem executada. Essa combinação entre alta complexidade cinemática e vulnerabilidade eletrônica cria um paradoxo tático: o míssil mais rápido e teoricamente mais avançado da Rússia pode ser desviado por sinais digitais manipulados, caso consigam infiltrar seu ciclo de navegação. Uma espécie de ilusão de ótica eletrônica.

Mísseis

Música como arma de precisão

Diante da queda da eficácia do Patriot, a Ucrânia optou por uma arma completamente diferente: Lima, um sistema de guerra eletrônica que não apenas bloqueia as comunicações via satélite do Kinzhal, mas também substitui seu fluxo de navegação por dados falsos. Este sistema cria uma ampla zona de negação eletrônica na qual os mísseis perdem sua referência espacial, mas o faz com precisão suficiente para induzir erros altamente controlados.

Sua técnica de falsificação é mais sofisticada do que uma simples interferência: ela não desativa a navegação, mas a manipula. O Lima envia um sinal em formato binário que pode incluir qualquer conteúdo, mas os operadores optaram por inserir o hino ucraniano "Nosso Pai é Bandera", tanto por razões técnicas quanto simbólicas. Este sinal enganoso, uma vez recebido pelos receptores do míssil, faz com que ele acredite estar a milhares de quilômetros a oeste, especificamente em Lima (Peru), forçando-o a corrigir abruptamente sua trajetória. A velocidades acima de Mach 5, essas mudanças geram tensões estruturais que superam a resistência da fuselagem, fazendo com que o míssil se parta em pleno voo ou caia sem detonar. Dessa forma, a Ucrânia conseguiu desviar ou destruir mais de vinte Kinzhales em poucas semanas, uma conquista muito mais significativa considerando sua escassez e o custo para a Rússia.

Desvio controlado

Os resultados do sistema Lima são visíveis nos padrões de impacto: crateras que aparecem a dezenas ou mesmo centenas de quilômetros dos alvos planejados, às vezes até 200 km fora da rota. A mudança na precisão é drástica. Embora a Rússia assegure que o CEP (erro crítico de trajetória) do míssil Kinzhal seja de cerca de 10 metros, imagens vazadas por analistas militares mostram mísseis caindo com erros de mais de 140 metros, mesmo em ataques recentes.

Não há dúvida de que, quando uma arma projetada para atravessar bunkers subterrâneos acaba atingindo um campo aberto, a eficácia da falsificação de trajetória fica demonstrada. Em muitos casos, o míssil sequer aciona a carga explosiva, pois a sequência de impacto depende de parâmetros que são alterados pelo míssil.

Os operadores do Night Watch enfatizam que Lima não atua em um único receptor, mas em todos simultaneamente, o que anula a estratégia russa de multiplicar antenas para "saltar" entre as fontes de sinal. Cada receptor do míssil, ao entrar na área afetada, interpreta os dados falsos como válidos, o que transforma a falsificação em uma espécie de "armadilha de cerco" impossível de evitar.

Evolução constante

Esse confronto entre mísseis hipersônicos e técnicas de falsificação ilustra o caráter de "gato e rato" que define a guerra eletrônica contemporânea. A Rússia ajusta o software, redesenha os perfis dos terminais e multiplica as antenas, e a Ucrânia responde criando sistemas que substituem toda a constelação de dados de satélite por um fluxo corrompido impossível de filtrar. Estados Unidos e empresas ocidentais já estão trabalhando em tecnologias capazes de detectar ou neutralizar a falsificação, enquanto a Rússia explora sistemas de orientação mais resilientes.

Por ora, porém, a vantagem eletrônica é ucraniana: a arma que Putin chamou de “invencível” e “capaz de superar qualquer defesa ocidental” está caindo em campos vazios, se desintegrando em pleno voo ou se tornando inofensiva. Ao mesmo tempo, a técnica também afeta outros mísseis russos que atravessam a zona de interferência, ampliando o alcance defensivo sem a necessidade de interceptá-los um a um. A lição estratégica é clara: num conflito onde a indústria russa produz apenas de 10 a 15 Kinzhals por mês, perdê-los para manipulação eletrônica representa um golpe desproporcional para as capacidades ofensivas do Kremlin.

Velocidade versus informação

Em resumo, o confronto entre o Kinzhal e o sistema de guerra eletrônica Lima é um lembrete de que a superioridade militar não depende mais apenas de velocidade, blindagem ou poder explosivo, mas de quem controla o fluxo de informações. O míssil pode voar a Mach 10 e ser quase impossível de interceptar fisicamente, mas se o seu sistema de guiamento interpretar que ele foi “teletransportado” para o Peru, toda a sua energia cinética se volta contra ele.

Para a Ucrânia, essa conquista representa a abertura de um caminho defensivo barato, adaptável e profundamente disruptivo. Para a Rússia, demonstra que mesmo seus sistemas mais avançados permanecem ancorados em subsistemas vulneráveis. Para o resto do mundo, mostra que o futuro da guerra será decidido na eletrônica e no software, bem como no aço e nos explosivos, com a falsificação de sinais como ferramenta central nos conflitos da próxima década.

Imagem | Administração Estatal da Cidade de Kiev, Comando da Força Aérea das Forças Armadas da Ucrânia

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