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55 mil ostras estão prestes a invadir o Mar Menor, na Espanha: são a última esperança de um ecossistema à beira do colapso

O Instituto Espanhol de Oceanografia lidera o projeto RemediOS-2 para recuperar a ostra plana na lagoa

Mar Menor / Imagem: IEO
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Victor Bianchin

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Victor Bianchin é jornalista.

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Sob as águas do Mar Menor (maior lagoa de água salgada da Espanha), um exército minúsculo acaba de se instalar sobre uma pirâmide de tijolos de argila biodegradável. São 55.000 ostras planas (Ostrea edulis) nascidas em um viveiro do Instituto Espanhol de Oceanografia (IEO-CSIC) e agora transformadas na esperança de filtrar e regenerar um sistema à beira do colapso.

A operação, realizada pela equipe do IEO e pela Associação de Naturalistas do Sudeste (ANSE), com apoio logístico do barco solar da WWF, constitui o primeiro recife experimental de ostras nativas do Mar Menor.

Um projeto de profundidade

O projeto se chama RemediOS-2 e não surgiu do nada. Sua primeira fase, RemediOS-1, demonstrou em 2022 que era possível produzir sementes de ostra a partir de exemplares autóctones do Mar Menor. Em apenas quatro meses, o viveiro do IEO em Lo Pagán conseguiu gerar 60 milhões de larvas a partir de apenas 36 reprodutoras. Agora, a segunda fase leva o projeto ao mar aberto.

A ideia é simples, mas ambiciosa: as ostras são biofiltros naturais. Uma única ostra pode filtrar entre cinco e dez litros de água por dia, removendo matéria orgânica e nutrientes. Os pesquisadores estimam que um cultivo bem estabelecido reteria até 20% do nitrogênio que entra anualmente na lagoa, e que toda a população de ostras seria capaz de filtrar todo o Mar Menor em apenas 23 dias.

O recife experimental está localizado próximo à Ilha do Barón, uma das áreas mais sensíveis do Mar Menor. Ali foram ancorados 175 blocos de argila biodegradável, projetados pela empresa Oyster Heaven. Neles, as larvas foram fixadas e agora crescem se alimentando do excesso de nutrientes da água.

Cada bloco funciona como uma “moradia temporária”: o material se degrada lentamente enquanto as ostras se fixam ao fundo e formam seu próprio recife natural. Ao todo, o sistema ocupa cerca de 12 metros quadrados de fundo marinho, mas representa um experimento crucial em restauração ecológica.

O monitoramento científico está a cargo da ANSE, sob a direção do IEO-CSIC. Os técnicos analisam a sobrevivência, o crescimento e o nível de estresse das ostras, além de medir sua maturação sexual e a acumulação de contaminantes, como bactérias E. coli ou biotoxinas marinhas.

Para monitorar todo esse processo, ainda são necessárias mais mãos. Por isso, o projeto conta também com o apoio tecnológico da Universidade Politécnica de Cartagena (UPCT). O pesquisador Francisco López Castejón utilizou um veículo submarino remoto (ROV) para inspecionar o recife e verificar como essa tecnologia pode monitorar habitats submarinos onde o mergulho é complicado.

Com ciência e tecnologia trabalhando juntas debaixo d’água, surge uma pergunta inevitável:

Por que ostras no Mar Menor?

Durante décadas, a lagoa sofreu acúmulo de nitratos e fosfatos provenientes da agricultura intensiva. Esses nutrientes alimentam um excesso de fitoplâncton, que turva a água e consome oxigênio, provocando episódios massivos de anóxia e morte da fauna.

O objetivo do RemediOS-2, nas palavras da Secretaria de Meio Ambiente da Região de Múrcia, é que a ostra plana atue como uma ferramenta natural de regeneração. Sua filtragem ajuda a reduzir a eutrofização, e suas conchas, ricas em carbonato de cálcio, contribuem para o armazenamento de carbono — um benefício adicional no combate às mudanças climáticas.

O projeto também funciona como um banco de testes para uma nova economia azul. Segundo o Programa Pleamar, a iniciativa busca envolver o setor pesqueiro local, organizar os espaços marinhos para futuras ações de restauração e demonstrar que a aquicultura regenerativa pode ser compatível com a recuperação ambiental.

A terceira fase do projeto incluirá estudos genéticos para verificar se as ostras locais estão melhor adaptadas às mudanças climáticas, com o objetivo de produzir “sementes” resistentes que possam ser reintroduzidas tanto na lagoa quanto no Mediterrâneo.

Por enquanto, as ostras continuam crescendo sob o olhar dos pesquisadores e dos robôs submarinos. A terceira fase do RemediOS já está em planejamento.

Talvez essas 55.000 ostras não consigam salvar sozinhas o Mar Menor, mas podem demonstrar que a restauração ambiental pode começar com um molusco, alguns tijolos biodegradáveis e uma ideia simples: deixar que a natureza se repare sozinha.

Imagem: IEO

Este texto foi traduzido/adaptado do site Xataka Espanha.


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