A fábrica é na Europa, mas os carros, as peças e os funcionários são da China: montadoras asiáticas viram problema para a União Europeia

Comissão Europeia reclama de montadoras chinesas que têm plantas na Europa só para montar um Lego gigante

Montadoras chinesas / Imagem: Ebro, BYD
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Victor Bianchin

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Victor Bianchin é jornalista.

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A indústria automobilística chinesa se propôs a conquistar a Europa. Além de levar carros diretamente da China e de criar parcerias com grupos europeus, está também abrindo fábricas no Velho Continente. É a forma ideal de evitar pacotes tarifários, mas há um problema: algumas empresas estão montando seus carros com kits de montagem rápida. E isso não está pegando bem.

Recentemente, Stéphane Séjourné, vice-presidente de Prosperidade e Estratégia Industrial da Comissão Europeia, comentou ao site italiano La Stampa que o órgão está acompanhando a situação de algumas fabricantes chinesas. O foco, na verdade, está nas que se estabeleceram na Espanha. “Atualmente, há fabricantes na Europa que montam carros chineses com componentes chineses e pessoal chinês. Isso está acontecendo na Espanha e na Hungria, e não está certo”. 

Há pouco mais de um ano, entraram em vigor as tarifas para carros elétricos vindos da China. Os veículos não precisam ser chineses (os Teslas da Gigafábrica de Xangai estão incluídos nessas tarifas, por exemplo). Com isso, o país asiático criou uma estratégia para montar os carros em países estrangeiros.

Esses kits “de desmontar e montar” são partes dos carros que são fabricadas e montadas na China para, depois, serem desmontadas (quando se comprova que tudo funciona), enviadas para o país de destino e, já no novo local, serem montadas novamente. Não é como fabricar um carro, e sim como reconstruir um Lego gigante. 

Fábrica de montagem ou fábrica de fabricação?

Em julho, o Ministério do Comércio da China realizou uma reunião com uma dúzia de fabricantes nacionais na qual foi deixado um recado claro: era preciso proteger ao máximo os segredos da indústria de veículos elétricos. Isso implica que os sistemas-chave dos veículos seriam produzidos na China, onde é mais fácil manter o controle.

Valdis Dombrovskis é o vice-presidente executivo da Comissão Europeia e já expressou suas dúvidas sobre o valor que será criado na União Europeia com esse método. “Que parte do conhecimento ficará armazenada aqui? Estamos falando de uma simples fábrica de montagem ou de uma fábrica de produção de automóveis? Há uma diferença substancial”, afirmou.

Voltando a Séjourné, ele garante que não acredita que as tarifas sejam a resposta, porque “destroem a cadeia de valor e criam tensões comerciais”. Ele não diz qual deveria ser a solução, mas comenta que os europeus “precisam ser menos ingênuos e voltar ao padrão das grandes economias do mundo”.

A fábrica da Chery em Barcelona, por exemplo, é uma das unidades chinesas que operaram no modelo SKD, ou Semi Knock Down. A China envia um carro parcialmente desmontado, sem itens como volante ou rodas, e depois ele é remontado em solo europeu. A ideia é que o processo avance para o modelo CKD, ou Completely Knock Down.

Isso significa que os veículos chegarão totalmente desmontados e, em Barcelona, serão montados por completo, incluindo soldagem, pintura e integração de fornecedores locais — o que deve melhorar a cadeia de valor e gerar riqueza ao redor da fábrica. O que está sendo criticado na Europa é que os operários são, em alguns casos, trabalhadores enviados diretamente da China.

Outro exemplo, também em território espanhol, é a gigafábrica da CATL em Zaragoza. Ela produzirá baterias para abastecer a planta da Stellantis em Figueruelas e deverá gerar 3.000 empregos diretos. Mas, na etapa de construção da fábrica, serão cerca de 2.000 trabalhadores vindos da China que executarão o trabalho.

Um olho nos kits de desmontar e montar, outro nos híbridos

O objetivo da União Europeia é que as marcas que chegam ao território gerem riqueza nos países onde se instalam. Há exemplos reveladores disso. A SEAT emprega diretamente mais de 15.000 pessoas entre as fábricas de Martorell, mas, indiretamente, gera outros milhares de empregos.

Algo semelhante ocorre com a Toyota em Valenciennes. A planta francesa emprega cerca de 4.000 pessoas, mas gera milhares de empregos indiretos ao redor devido à logística, indústria auxiliar, fornecedores locais etc. Estima-se que a Toyota empregue direta e indiretamente cerca de 94.000 pessoas na Europa.

Mas, embora o foco europeu para proteger os interesses do bloco esteja voltado para o carro elétrico, os híbridos e híbridos plug-in são as verdadeiras ameaças. Em maio de 2025, as marcas chinesas alcançaram 5,4% de participação de mercado, com mais de 60.000 carros vendidos, frente a 3% no período anterior. No mesmo período, o mercado europeu cresceu apenas 1,3%.

Esses números foram alcançados principalmente graças aos híbridos que marcas como MG e BYD trouxeram ao continente. E esse sucesso não surgiu do nada: os híbridos chineses oferecem uma boa relação entre preço, desempenho e design, com valores competitivos contra os quais fabricantes europeus e japoneses mal conseguem competir.

A solução? Complexa. Séjourné também comentou que a Europa é “o único continente que não tem um pensamento estratégico em relação à política industrial”, e talvez a solução seja aplicar algo semelhante ao que a própria China fez no passado. Quando marcas estrangeiras queriam se estabelecer no país, precisavam se associar a empresas locais para garantir transferência de conhecimento e geração de riqueza.

E talvez esse seja o caminho para que as marcas estrangeiras se fixem na Europa. Na verdade, é exatamente isso que defende Josep Maria Recasens, presidente da Renault Espanha, que também afirmou que a Europa “não pode permitir que façam quatro chapas com rodas”.

Imagens | Ebro, BYD

Este texto foi traduzido/adaptado do site Xataka Espanha.


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