Desde o final de 2023, atravessar o mar Vermelho e o canal de Suez é um risco que muitas companhias de navegação não estão dispostas a correr. A milícia houthi do Iêmen, apoiada pelo Irã, tem atacado e afundado navios comerciais em represália a alvos ligados direta ou indiretamente a Israel, obrigando milhares de embarcações a desviarem suas rotas marítimas para o cabo da Boa Esperança.
Entre as consequências mais importantes estão os atrasos nas entregas e custos adicionais de milhões. No entanto, desde este verão (no Hemisfério Norte), um tipo muito específico de navio começou a cruzar a zona sem problemas: os que transportam apenas carros chineses. Nenhum ataque, nenhum sequestro, nenhum único incidente. E isso, nesse contexto, não parece coincidência.
O mar Vermelho, um atalho que vale milhões
A economia obtida ao atravessar o canal de Suez em vez de contornar a África é colossal: entre 14 e 18 dias a menos de navegação e várias centenas de dólares a menos por cada carro transportado. Se um navio pode levar 5.000 veículos, estamos falando de milhões de dólares de diferença em cada viagem, além de menos emissões e menor desgaste da frota.
Não é de se estranhar que, para fabricantes como a BYD ou a SAIC Motor, recuperar essa rota seja uma prioridade. Segundo a Lloyd’s List Intelligence, apenas em junho e julho, pelo menos 14 navios transportadores de veículos partiram da China rumo à Europa pelo mar Vermelho, todos carregados com automóveis chineses. No mesmo período, outras companhias de navegação do Japão, Coreia e Europa continuaram evitando a zona.
Pacto tácito entre a China e os houthis?
Nem a China, nem o Irã, nem os houthis confirmam um acordo, mas os fatos estão aí. O Irã vende quase todo o seu petróleo para a China e essa relação comercial representa cerca de 6% da economia iraniana. Em troca, Pequim tem uma influência na região difícil de igualar.
Analistas como Daniel Nash (Veson Nautical) apontam que os rebeldes poderiam ter recebido instruções para não atacar navios chineses que transportem automóveis. Até mesmo navios de propriedade não chinesa, mas que carregam carros fabricados na China, passaram sem incidentes, enquanto outros navios chineses que não transportam carros continuam evitando a zona.
Concorrência feroz na Europa

Em abril, os carros chineses representavam quase 5% das vendas na Europa, o dobro de um ano antes. A S&P Global estima que esse número possa chegar a 10% até 2034. A União Europeia reagiu impondo tarifas de até 35% aos veículos que recebem subsídios estatais na China, o que obriga os fabricantes a buscar fórmulas para manter preços competitivos.
Recuperar a rota do mar Vermelho é uma delas. As economias logísticas podem ajudar a compensar parte do impacto das tarifas e reforçar a ofensiva comercial frente a marcas japonesas, coreanas e europeias, que continuam pagando a conta do desvio pela África.
Enquanto outros freiam, a China acelera

O contraste é evidente. Nos últimos anos, fabricantes como Tesla, Volvo, Suzuki e Michelin sofreram paralisações e atrasos na Europa devido às interrupções na cadeia logística provocadas pela insegurança no mar Vermelho. Algumas fábricas interromperam a produção por dias ou semanas.
Enquanto isso, estaleiros chineses estão entregando à BYD e à SAIC alguns dos maiores navios Ro-Ro do mundo, projetados para cruzar justamente por essa rota. São verdadeiras cidades flutuantes com uma dúzia de conveses e capacidade para no mínimo 5.000 carros, avaliados em mais de 100 milhões de dólares por viagem.
Este texto foi traduzido/adaptado do site Motorpasión.
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