Kim Kardashian tornou isso uma moda, uma influenciadora tornou isso viral e a ciência continua dizendo a mesma coisa: não coma placenta.

  • Enquanto a medicina trata isso como lixo biológico, alguns influenciadores o transformam em conteúdo viral.

  • Pesquisas não descobriram que a placentofagia tenha sido um costume comum entre culturas tradicionais.

Influenciador comeu a placenta após esposa dar à luz sua filha. Médicos não recomendam | Imagem: Unsplash e Instagram
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Igor Gomes

Subeditor

Subeditor do Xataka Brasil. Jornalista há 15 anos, já trabalhou em jornais diários, revistas semanais e podcasts. Quando criança, desmontava os brinquedos para tentar entender como eles funcionavam e nunca conseguia montar de volta.

Qualquer um que tenha assistido Game of Thrones — alerta de pequeno spoiler — vai se lembrar daquela cena icônica em que Daenerys Targaryen devora um coração cru na frente de uma multidão. Para esta sequência, eles usaram um coração feito de geleia solidificada, que a atriz relembrou assim: "Tinha gosto de água sanitária e macarrão cru. Comi uns 28 corações durante os dias em que filmamos aquela cena. Por sorte, me deram uma escarradeira porque eu vomitava nela com muita frequência." Uma cena brutal que agora ganhou vida, mais ou menos: um influenciador argentino , Lucas Gago, viralizou após postar um vídeo em que literalmente come a placenta de sua filha recém-nascida.

O ato, registrado após um parto domiciliar, gerou uma onda de reações nas redes sociais, que foram do espanto à rejeição total. Embora para muitos tenha sido apenas mais uma provocação na internet, o vídeo reacendeu um debate que mistura biologia, crenças pessoais, celebridades e pseudociência.

Do viral à origem

Embora o caso de Gago pareça extremo, a ideia de comer placenta não é nova. Nos últimos anos, essa prática, conhecida como placentofagia , ganhou notoriedade, principalmente depois que celebridades como Kim Kardashian revelaram publicamente que a consumiram encapsulada após o parto, na esperança de evitar a depressão pós-parto. Desde então, diversas figuras públicas seguiram esse caminho, apresentando-o como uma forma de se reconectar com a natureza ou de "reutilizar" o que o corpo produz.

Um ritual ancestral?

Embora essa premissa seja repetida, a história não a sustenta. Um estudo etnográfico que analisou 179 culturas contemporâneas não encontrou evidências de que comer a placenta após o parto fosse comum.

Agora, no mundo animal a situação é diferente. Um estudo, publicado em Ecology of Food and Nutrition , observou que muitos mamíferos, como primatas, roedores e carnívoros, comem a placenta. Segundo os pesquisadores, essa prática pode ajudar a reduzir a dor e ativar instintos de cuidado em relação aos filhotes.

O que dizem os especialistas?

De acordo com a Clínica Mayo, não há evidências científicas conclusivas que comprovem benefícios como aumento de energia, melhora na produção de leite materno ou prevenção de transtornos de humor. Nos últimos anos, mais e mais pessoas começaram a tomar cápsulas de placenta, acreditando que isso seria benéfico. No entanto, a Cleveland Clinic alertou sobre os riscos envolvidos.

Em um artigo recente, ela explicou que a placenta pode conter bactérias ou toxinas acumuladas durante a gravidez, o que pode causar infecções. O especialista em doenças infecciosas Dr. Oluwatosin Goje explicou que consumi-lo, seja cru, cozido ou em cápsulas, pode reintroduzir esses agentes nocivos no corpo, representando um risco tanto para a mãe quanto para o bebê que ela amamenta.

Outros usos da placenta

Na maioria dos partos hospitalares, a placenta é considerada resíduo biológico e é descartada de acordo com protocolos de saúde. Somente em casos específicos e com autorização médica os pais podem solicitar a guarda, algo que nem sempre é permitido ou regulamentado em todos os países. No entanto, há quem decida mantê-lo, como é o caso de artistas e cineastas que abordaram este órgão a partir de uma perspectiva simbólica e performática. Por exemplo, o chef Eddie Lin fez o documentário American Afterbirth , que investiga o uso de placentas em contextos artísticos, culinários e sociais, propondo uma abordagem culturalmente provocativa ao tema.

O caso mais recente é o da influenciadora espanhola Violeta Mangriñán, que decidiu plantar uma árvore usando a placenta de sua filha Gala, em um gesto que ela considerou espiritual e ecológico.

Tendência ou perigo?

O que começou como um gesto chamativo nas redes sociais acabou gerando uma discussão muito mais ampla sobre os limites entre o que é natural, o que é simbólico e o que é seguro. Embora algumas figuras públicas tenham ajudado a popularizar a ideia de consumir a placenta por seus supostos benefícios, a ciência ainda não respalda essas práticas e, em vez disso, alerta para possíveis riscos.

Em uma época em que conteúdos íntimos se tornam virais e conteúdos alternativos são travestidos de saudáveis, vale lembrar que nem tudo o que vemos na internet é uma boa ideia replicar. E embora o corpo humano seja um milagre biológico, nem tudo que sai dele deve ir direto para o prato.

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