Em 2025, vimos mudanças e adaptações nas ofensivas de Moscou. Os drones Shahed continuaram sendo a ponta de lança da invasão, mas novas táticas passaram a ser empregadas, e de Kiev vieram denúncias de métodos “implacáveis”, como a bomba indetectável que atua via celulares de adolescentes ucranianos.
A mais recente: as ofensivas de “duplo impacto”.
Terror calculado
Nos últimos meses, a Ucrânia tem sido alvo de uma tática russa especialmente brutal: os chamados ataques de “duplo impacto”, uma estratégia que consiste em atingir uma área específica — frequentemente um alvo civil — e lançar um segundo ataque logo após a chegada de equipes de emergência, voluntários e socorristas.
Essa técnica, descrita pela ONU como “desumana”, vem sendo monitorada em várias frentes por defensores aéreos e profissionais de resgate ucranianos.
Eles relatam que os drones são usados inicialmente para causar os primeiros danos e, minutos depois, mísseis de cruzeiro atingem exatamente o mesmo ponto, já com a presença de equipes médicas e civis no local.
Implacável
O resultado dessa estratégia não apenas multiplica o número de vítimas, como também busca quebrar o moral da população e paralisar a capacidade de resposta das autoridades ucranianas. Segundo relatos, esse tipo de ataque já foi registrado em regiões próximas a Kyiv, Bila Tserkva, Kharkiv e Kherson, atingindo infraestruturas recreativas, residenciais e estratégicas.
Adaptação ao cenário
A doutrina por trás desses ataques não é nova. A Rússia já havia sido acusada de empregar a mesma técnica durante sua intervenção na Síria, em apoio ao regime de Bashar al-Assad. O que diferencia o cenário ucraniano é a combinação entre drones e mísseis: os primeiros funcionam como iscas, atraindo socorristas, enquanto os segundos garantem a destruição total.
Oleksiy, subcomandante de uma unidade de defesa aérea móvel da Ucrânia, descreve a prática como um uso intencional de múltiplas armas “para intimidar a população” e neutralizar qualquer resposta imediata.
Em alguns casos, os ataques ocorreram apenas com drones, mas em outros a combinação dos dois vetores foi letal.
Um exemplo claro ocorreu em junho, quando um complexo recreativo nos arredores de Kyiv foi atingido pela segunda explosão justamente no momento em que as equipes de emergência tentavam conter um incêndio.
O silêncio de Moscou
A Rússia não respondeu aos pedidos de esclarecimento sobre os episódios. O Ministério da Defesa se limitou a remeter às declarações genéricas da porta-voz da chancelaria, Maria Zakharova.
Enquanto isso, imagens de câmeras de segurança e testemunhos no local reforçam a percepção de que há um padrão recorrente. Em uma gravação feita nos arredores de Kyiv, é possível ouvir o zumbido de um drone, seguido por uma explosão no exato momento em que socorristas estavam na área.
Embora a frequência total desse tipo de ataque ainda seja difícil de estimar, o acúmulo de casos sugere que não se trata de algo acidental, e sim de uma estratégia sistemática.
Analistas do Instituto para o Estudo da Guerra afirmam que as forças russas “muito provavelmente estão mirando intencionalmente em civis ucranianos e equipes de resgate”, como parte de um esforço para desmoralizar a população e paralisar a resposta institucional.
Situação defensiva
Essa tendência acontece em meio a um cenário geral de enfraquecimento das defesas ucranianas, agravado pela suspensão temporária no envio de armamentos críticos por parte dos Estados Unidos, incluindo munições antiaéreas e outros equipamentos essenciais.
A decisão, tomada dentro da política de contenção das reservas estratégicas norte-americanas sob a presidência de Trump, pode ter consequências graves para a capacidade da Ucrânia de proteger suas cidades e posições na linha de frente diante da ofensiva russa.
Na semana passada, Moscou lançou cerca de 550 munições em uma única noite contra o território ucraniano, refletindo uma campanha aérea cada vez mais intensa.
O Ministério das Relações Exteriores da Ucrânia alertou que qualquer atraso no apoio ocidental só encorajará ainda mais o Kremlin, enquanto especialistas chamam atenção para o risco de que a falta de suporte acelere o avanço russo em solo ucraniano.
Resiliência sob fogo
Como já relatamos, diante desse cenário de vulnerabilidade, o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky tem mantido conversas com seu homólogo norte-americano na tentativa de restabelecer os envios de sistemas de defesa aérea.
Segundo ele, os dois países “trabalharão juntos para reforçar a proteção dos nossos céus”. Ainda assim, a incerteza permanece, e cada dia sem assistência aumenta o risco de colapso defensivo em algumas regiões.
Enquanto isso, a comunidade internacional acompanha com preocupação o uso de táticas proibidas ou moralmente condenáveis por parte da Rússia, como os ataques contra zonas civis seguidos por um segundo golpe letal.
Mais do que uma questão de campo de batalha, esses métodos colocam em xeque o compromisso da ordem internacional com o direito humanitário e exigem uma resposta antes que o excepcional se torne regra.
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