Em pleno auge da IA generativa e dos agentes de IA que automatizam tarefas, algumas histórias ainda surpreendem pela ousadia. Um bom exemplo é este caso do programador que, muito antes de ferramentas como o ChatGPT surgirem no mundo do trabalho, conseguiu automatizar completamente sua função e viver seis anos sem mover um dedo.
Seu exemplo viralizou na época e, agora, pode servir de aviso sobre o que está por vir.
50 horas trabalhadas em 6 anos
Tudo começou em 2016, quando um usuário anônimo do Reddit, conhecido como FiletOfFish1066, confessou em um fórum que acabara de ser demitido de seu emprego como testador de software em uma grande empresa de tecnologia da área da Baía de São Francisco. O motivo: ele havia passado seis anos recebendo 95 mil dólares anuais sem fazer absolutamente nada.
Em sua publicação, relatava que, após conseguir o cargo de controle de qualidade, passou os primeiros oito meses programando um sistema capaz de executar automaticamente todos os seus testes e relatórios. O software era tão eficiente que, uma vez em funcionamento, não precisava mais de supervisão humana.
O usuário contou:
“Há uns seis anos, não faço nada no trabalho. Não estou brincando. Durante 40 horas por semana, eu ia trabalhar, jogava League of Legends, navegava no Reddit e fazia o que queria. Nos últimos seis anos, talvez eu tenha trabalhado 50 horas de verdade. Ninguém percebeu: todos os testes eram executados perfeitamente.”
Seis anos de ócio... e um problema imprevisto
Por mais de meia década, o algoritmo de FiletOfFish1066 realizou seu trabalho sem falhas. Sua produtividade aparente era impecável. Ele, enquanto isso, preenchia suas jornadas com lazer digital. A empresa, satisfeita com os resultados, nunca suspeitou de nada.
Na verdade, ele poderia ter continuado assim por vários anos mais se outro técnico não tivesse descoberto a manobra e o denunciado aos superiores. A demissão foi, claro, imediata.
Mas, àquela altura, ele já havia ganhado mais de meio milhão de dólares e economizado cerca de 200 mil, vivendo com os pais e levando um estilo de vida frugal. O que não previu foi o custo a longo prazo: havia esquecido completamente como programar. Ele admitiu isso com certa amargura:
“Percebi que já não sei escrever código. Vou tentar recuperar minhas habilidades, deixar a cerveja e o League of Legends e recomeçar.”
Gênio ou fraude?
Sua história provocou um debate global. Teria sido ele um gênio da eficiência ou um estelionatário moderno? De certo modo, as duas coisas: automatizar tarefas repetitivas é um dos objetivos mais comuns da informática.
Mas automatizar o próprio trabalho sem comunicar isso à empresa abre um dilema moral e profissional. Onde termina a inovação e onde começa o engano?
Agora, em 2025, o debate que nos interessa é outro bem diferente: o da substituição do trabalho manual e rotineiro pela IA.
Um prenúncio do mundo pós-ChatGPT
Hoje, quase uma década depois, a história de FiletOfFish1066 ganha uma nova interpretação. Atualmente, com o ChatGPT, o Copilot, o Gemini e outras inteligências artificiais generativas capazes de escrever código, redigir relatórios e até analisar dados, a ideia de automatizar tarefas inteiras soa bastante comum.
A diferença é que, agora, a automação não depende do engenho solitário de um funcionário, mas de ferramentas ao alcance de qualquer pessoa. O que antes era um segredo guardado na mesa de um programador entediado, hoje, já se tornou uma estratégia empresarial.
Naquela época, a empresa não foi afetada negativamente e tudo funcionou bem enquanto a máquina substituía o programador (embora ele continuasse recebendo salário). Agora, quando são os próprios executivos que “sabem o truque” — e, além disso, as ferramentas de IA são muito mais poderosas do que antes, o que pode acontecer?
A parábola do programador ocioso
Por outro lado, a história de FiletOfFish1066 é, no fundo, uma parábola moderna sobre a preguiça e o progresso. Ele automatizou seu trabalho para se libertar do tédio, mas, ao fazer isso, perdeu aquilo que lhe dava valor profissional.
E o risco ao qual estamos expostos agora é o mesmo que FOF experimentou: delegar tanto à máquina a ponto de esquecer como fazer as coisas por conta própria. Os desenvolvedores que apostam no vibe coding já estão, na verdade, sofrendo efeitos semelhantes.
FiletOfFish1066 desapareceu da internet pouco depois de sua história se tornar viral. Após aquela última mensagem em que anunciava que queria “reaprender” a programar (e parar de se viciar em LoL), ele apagou sua conta no Reddit. Não se sabe o que aconteceu com ele.
Seria irônico se, seis anos depois, tivesse se tornado o protagonista de uma daquelas frequentes histórias de “eu treinei a IA que me substituiu”.
Imagem | Marcos Merino por meio de IA
Este texto foi traduzido/adaptado do site Genbeta.
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