Um estudo publicado este ano na revista Nature Communications mostra que a circulação de águas do Atlântico, conhecida como Amoc (Atlantic Meridional Overturning Circulation), pode sofrer um enfraquecimento até 2100. A mudança, causada pelo aquecimento global, teria impactos graves no clima de diferentes regiões tropicais, incluindo a Amazônia, que pode enfrentar uma redução significativa no regime de chuvas. A pesquisa foi conduzida por cientistas do Brasil, da Alemanha e da Suíça, e levou em consideração dados de pesquisa de campo com projeções de modelos climáticos avançados Mas o que isso significa na prática? A seguir, entenda quais podem ser os impactos dessa alteração na floresta Amazônica.
Amoc: o que é e qual sua importância para o planeta
A Amoc (Circulação Meridional do Atlântico) é um sistema de correntes oceânicas essencial para regular o clima da Terra. Ela funciona como uma espécie de “esteira” no Atlântico, transportando águas quentes da região tropical para o norte e devolvendo águas frias das altas latitudes para o sul, o que permite equilibrar o clima do planeta. É por isso que, quando essa circulação se altera, o sistema climático pode ser afetado, desencadeando secas, alterações nos padrões de vento e elevação do nível do mar em algumas regiões. Durante a última era glacial, por exemplo, mudanças na Amoc estiveram ligadas a episódios de resfriamento abrupto.
Para entender como a Amoc se comportou ao longo do tempo, os cientistas analisaram testemunhos de sedimentos marinhos em vários pontos do Atlântico Norte. Os testemunhos são extraídos de geleiras e calotas polares, e contém amostras do clima passado da Terra. Neles, os cientistas mediram elementos radioativos, como o tório-230 e protactínio-231, que funcionam como indicadores da intensidade da circulação da Amoc. Os dados foram combinados com o modelo climático Bern3D, desenvolvido na Universidade de Berna, que simula a interação entre oceanos, atmosfera e ciclos biogeoquímicos.
Entenda o que a história do clima revela sobre o futuro do planeta
Os registros mostraram que, após o fim da última era glacial, ocorrida há 650 mil anos atrás, a Amoc demorou cerca de dois mil anos para se recuperar. O cenário projetado para o futuro, porém, não é o dos melhores. Até 2100, os modelos climáticos indicam que a circulação vai perder força rapidamente, ou seja, o transporte de águas quentes para o norte e frias para o sul ficará mais lento. Esse enfraquecimento da Amoc não foi detectado em nenhum momento dos últimos 6.500 anos e pode afetar os padrões de chuva em várias regiões tropicais do planeta, incluindo América do Sul, África e o sistema de monções da Índia e do Sudeste Asiático.
Quais são os impactos diretos na Amazônia?
Um dos efeitos mais graves da mudança nos oceanos deve atingir o norte da Amazônia, a região mais preservada da floresta. Com o enfraquecimento da circulação da Amoc no Atlântico, a tendência é que as chuvas equatoriais se desloquem para o sul, reduzindo a pluviosidade dessa área.
Essa alteração no clima é algo preocupante porque pode comprometer a biodiversidade dessa porção da floresta que ainda não sofreu impactos intensos do desmatamento. Estudos anteriores já haviam mostrado que, em períodos passados de enfraquecimento da Amoc, o norte amazônico sofreu mudanças na vegetação, com avanço de formações sazonais no lugar da floresta úmida. Agora, os modelos sugerem que os impactos podem ser ainda mais graves, já que se somaria aos problemas atuais do desmatamento e das queimadas em outras áreas da bacia. A grande preocupação dos especialistas é que a mudança configure um ponto de não retorno no sistema climático global, com a Amazônia perdendo parte da sua capacidade de se regenerar e de manter o equilíbrio do ciclo das chuvas em escala continental.
Ver 0 Comentários