Finlândia percebeu que o modelo de “welfare state” não é suficiente para evitar a crise de natalidade; agora, tenta contê-la

O país elaborou um estudo com 20 propostas para frear a queda de sua taxa de natalidade

Natalidade na Finlândia / Imagem:  Vladislav Vedenskii (Unsplash), Jennifer Kalenberg (Unsplash), Statista e Statistics Finland
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Victor Bianchin

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Victor Bianchin é jornalista.

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O mundo há décadas observa os países nórdicos com uma mistura de admiração e inveja por seu modelo de bem-estar social (ou “welfare state”). Um exemplo claro é a Finlândia, referência em educação, auxílio à maternidade e gastos com benefícios sociais. Nada disso, no entanto, impediu o país de ver sua natalidade diminuir aos poucos. Na verdade, a queda tem sido tão acentuada desde 2010, e sua taxa está em níveis tão baixos, que o governo decidiu agir.

A base estatística do Banco Mundial mostra que a taxa de natalidade finlandesa despencou ao longo das últimas seis décadas, passando de 2,7 durante o baby boom para 1,3 em 2023. A queda foi particularmente acentuada entre as décadas de 1960 e 1970, seguiu uma curva oscilante até a década passada e voltou a acelerar por volta de 2010. Os dados mais recentes da Macrotrends mostram uma leve recuperação, mas a taxa ainda está muito longe dos valores do passado.

Isso mostra que a Finlândia tem um problema, reconhecido pelo próprio governo. “A taxa de natalidade da Finlândia diminuiu rapidamente nos últimos 15 anos. Em 2024, a taxa de fecundidade total do país chegou a ser de 1,25”, reconheceu em março o Ministério dos Assuntos Sociais, que admite que, embora a Finlândia não seja o único país a lidar com esse desafio, ali o colapso tem sido “excepcionalmente rápido” na última década e meia e ameaça se tornar um desafio econômico e social.

“A taxa da Finlândia caiu a um mínimo histórico e o retrocesso tem sido mais acentuado do que nos outros países nórdicos. Existe uma lacuna considerável entre o número ideal e o número médio real de filhos. É fundamental encontrar soluções para reduzir essa diferença”, defendeu a ministra da Segurança Social, Sanni Grahm-Laasonen. Em 2023, os indicadores das vizinhas Noruega e Suécia giravam em torno de 1,4 filho por mulher em média, também longe da taxa de reposição que permite aos países manterem-se sem depender da imigração.

Por que a natalidade está caindo?

Essa é a pergunta de um milhão. Para respondê-la, em 2024 o governo encomendou um relatório que deveria esclarecer os fatores que travam o motor demográfico do país e explorar possíveis soluções. A tarefa era relevante porque, como afirma o governo, na Finlândia constata-se “uma grande diferença” entre o número de filhos que os casais desejam ter e o número que realmente têm.

“Os estudos demonstram que a política familiar finlandesa favoreceu tanto o bem-estar quanto a natalidade e continua tendo um papel importante. No entanto, a queda atual se deve principalmente à diminuição do número de primeiros nascimentos e ao aumento da proporção de pessoas sem filhos”, observa a professora Anna Rotkirch, da Väestöliitto (a Federação de Famílias da Finlândia), uma das especialistas que participaram da elaboração do relatório sobre natalidade.

Identificaram as causas? Sim e não. O governo cita algumas, mas também reconhece que não há nenhuma “razão clara” que, sozinha, explique o colapso da natalidade. “Portanto, também não há soluções fáceis para contê-lo”, admite o Ministério da Saúde antes de enumerar alguns fatores que entram em jogo, como mudanças culturais, relações instáveis, questões de saúde, a situação do mercado de trabalho e da renda, ou as dificuldades para conciliar a vida profissional e a criação dos filhos.

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Recentemente, a organização NPR foi um passo além e entrevistou especialistas e jovens finlandeses para entender como eles encaram a paternidade. Poa Pohjola e Wilhelm Bomberg, de 38 e 35 anos, são os primeiros mencionados em sua análise: o casal está junto há cerca de três anos e, em julho passado, teve seu primeiro bebê — embora Pohjola reconheça que, até pouco tempo atrás, acreditava que jamais teria filhos.

“Parecia-me algo impossível”, confessa a mulher. Seu caso é curioso porque coincide com um fenômeno constatado por pesquisadores finlandeses — e que se estende a muitos outros países: o adiamento da maternidade e o aumento do número de pessoas que simplesmente optam por não ter filhos. No caso da Finlândia, isso levou a uma taxa de fecundidade ligeiramente inferior à média da União Europeia e à de países como Islândia, Dinamarca, Suécia ou Noruega.

Como estudo de caso, a Finlândia é particularmente interessante. Como recorda Liisa Siika-aho, do grupo de trabalho do Ministério dos Assuntos Sociais e da Saúde, “na Finlândia, os benefícios e serviços para as famílias são relativamente bons”.

De fato, os países nórdicos costumam se destacar justamente pelas facilidades que oferecem para as pessoas terem filhos. Em particular, a Finlândia se sobressai em aspectos como incentivos, educação e licenças remuneradas. “Já não podemos afirmar que nossas boas políticas familiares explicam a boa taxa de fecundidade dos países nórdicos”, afirma à NPR Annelie Miettinen, da agência estatal Kela.

“O que intriga os pesquisadores é como isso pode ser verdade, porque todos esses países são relativamente bons em oferecer apoio às famílias”, acrescenta Miettinen. “Mas realmente não há boas explicações para as taxas de fecundidade tão baixas atualmente.” Assim como acontece na Espanha, se o país está conseguindo enfrentar a crise demográfica, é basicamente graças ao fluxo de imigração.

Como resolver?

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Há alguns meses, o governo tornou público um relatório sobre o tema que inclui cerca de vinte propostas centradas na família e na natalidade, todas baseadas na premissa de que o investimento em educação infantil, licenças familiares e apoio econômico impulsionará as taxas de natalidade. À espera de que isso se comprove, o próprio Ministério da Saúde mantém cautela.

“Na Finlândia, os benefícios e serviços para as famílias são relativamente bons. Isso significa que não há áreas em que possam ser feitas mudanças simples”, reconhece Sikka-aho. “No entanto, todos os sistemas precisam de manutenção, e é isso que muitas de nossas propostas abordam. É improvável que uma única medida consiga aumentar a natalidade. Isso não significa que não devamos tentar.”

O que dizem as 20 propostas? Basicamente defendem um maior “diálogo social” para entender o que a população mais jovem, entre 20 e 29 anos, espera, deseja e pensa. Uma questão fundamental se levarmos em conta que os especialistas relacionam a queda da natalidade mais com “mudanças nos valores, nos estilos de vida e nos relacionamentos” do que com alterações nas políticas sociais ou trabalhistas.

Outra de suas principais medidas é oferecer um “incentivo financeiro” às mulheres que tenham seu primeiro filho antes dos 30 anos, o que pode incluir desde hipotecas e empréstimos estudantis até vantagens fiscais ou previdenciárias.

Há mais medidas: com base nos dados disponíveis, os especialistas propõem elevar o nível educacional (há uma relação direta entre formação acadêmica e maternidade/paternidade), facilitar a conciliação entre trabalho e vida familiar e reduzir a dependência de contratos temporários, oferecer aconselhamento e orientação sobre fertilidade, melhorar os serviços de saúde sexual e reprodutiva e cuidar dos próprios casais para evitar separações. O governo já anunciou sua intenção de aumentar a compensação pelas doações de óvulos.

Imagens | Vladislav Vedenskii (Unsplash), Jennifer Kalenberg (Unsplash), Statista e Statistics Finland

Este texto foi traduzido/adaptado do site Xataka Espanha.


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