A Ucrânia encontrou o antídoto para os drones kamikaze russos: uma ilusão de ótica

Além da sofisticação das armas modernas, a imaginação continua sendo uma arma tão poderosa quanto qualquer míssil

Guerra de ilusões / Imagem: Na Chasi, Apate, Back and Alive
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Victor Bianchin

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Victor Bianchin

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Victor Bianchin é jornalista.

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Durante a Segunda Guerra Mundial, um batalhão tornou-se “imortal” nos livros de história. Não eram soldados, mas artistas dedicados a criar para a campanha bélica dos Aliados. Desde a produção de gravações de sons militares até a construção de tanques, aviões e caminhões. Com uma ressalva: eram infláveis, para confundir os nazistas.

Agora, a Ucrânia lembrou dessa história.

A guerra das ilusões

Sim, na frente ucraniana, o que parece um campo de batalha carregado de artilharia, drones e veículos blindados pode esconder um elaborado cenário de enganos. Pelo menos desde 2023, têm se multiplicado os exemplos de como os dois lados usam tanques de madeira, canhões de compensado, soldados falsos e até drones infláveis para forçar o inimigo a gastar munições caras.

Um exemplo célebre foi o de um drone russo que difundiu imagens da destruição de um suposto tanque ucraniano, seguido de um vídeo de um soldado rindo ao lado dos restos de seu “carro de madeira”. Essa mistura de artesanato e tecnologia faz parte de uma estratégia que busca equilibrar forças em um conflito no qual cada míssil e cada drone têm um valor estratégico enorme.

Entre os engodos mais populares estão as réplicas dos obuses M777 de fabricação britânica, fundamentais na artilharia ucraniana. Grupos de voluntários, como Na Chasi ou Reaktyvna Poshta, fabricam modelos dobráveis de madeira que custam entre 500 e 600 dólares e podem ser montados em três minutos por duas pessoas, sem necessidade de ferramentas.

Contra eles, a Rússia lança seus drones kamikaze Lancet, avaliados em cerca de 35.000 dólares cada, o que torna os engodos um investimento barato, mas capaz de aumentar significativamente o desgaste do inimigo. Alguns desses falsos obuses, como um apelidado de Tolya, estão há mais de um ano na linha de frente, resistindo a ataques repetidos e sendo reparados diversas vezes com fita adesiva e parafusos.

Os obuses de imitação M777 são especialmente populares entre as tropas ucranianas Os obuses de imitação M777 são especialmente populares entre as tropas ucranianas

A eficácia de um engodo depende tanto de sua fabricação quanto do contexto. Não basta imitar a silhueta de uma arma: é necessário recriar o ambiente com marcas de rodas, caixas de munição e até latrinas para dar credibilidade.

Essa atenção aos detalhes conseguiu confundir até comandantes militares ucranianos em visitas. Além disso, é empregada uma tática que consiste em remover rapidamente os morteiros reais após um disparo e substituí-los por cópias, obrigando a Rússia a desperdiçar recursos em alvos inexistentes.

A estratégia russa

A Rússia, por sua vez, utiliza com a mesma intensidade técnicas de camuflagem e engano. Segundo a força aérea ucraniana, até metade dos drones em ataques recentes são imitações baratas, destinadas a saturar as defesas antiaéreas e forçar o disparo de mísseis caros contra alvos sem valor.

Os engodos infláveis, como esta imitação ucraniana do obus Acacia, são leves, rápidos e fáceis de instalar, mas podem ser destruídos com facilidade Os engodos infláveis, como esta imitação ucraniana do obus Acacia, são leves, rápidos e fáceis de instalar, mas podem ser destruídos com facilidade

Empresas como a Rusbal fabricam versões 2D visíveis por satélite, engodos que emitem calor semelhante ao de um motor ou simulam o tráfego de rádio militar. Chegaram até a produzir manequins vestidos com uniforme e aquecedores internos para enganar as câmeras térmicas ucranianas, mostrando a amplitude do recurso.

Embora a sofisticação tecnológica atual faça esses truques parecerem inovadores, eles fazem parte de uma longa tradição. Na Antiguidade, exércitos como o de Aníbal criavam acampamentos falsos para confundir os romanos.

Durante a Primeira Guerra Mundial, foram construídos tanques e aviões de madeira para enganar a observação aérea. Na Segunda Guerra Mundial, o célebre Exército Fantasma dos Aliados colocou tanques infláveis e aviões fictícios no sul da Inglaterra para ocultar os preparativos do desembarque da Normandia. O objetivo sempre foi o mesmo: fazer o inimigo disparar contra sombras e gastar suas forças com nada.

A economia de guerra

Na guerra da Ucrânia, onde os arsenais ocidentais de mísseis antiaéreos são limitados e cada unidade enviada dos EUA ou da Europa tem um custo político e econômico, os engodos tornam-se multiplicadores de eficiência. Fazer a Rússia desperdiçar um drone Lancet contra uma maquete de 500 dólares não tem apenas valor tático, mas também econômico, pois cada troca desfavorável corrói os recursos do agressor.

Da mesma forma, os drones baratos que a Rússia lança como falsos Shahed obrigam a Ucrânia a decidir se gasta em interceptadores caros ou arrisca a penetração de um ataque real. A guerra dos engodos é, em essência, um combate de orçamentos: quem consegue fazer o adversário consumir mais recursos do que pode repor.

Em resumo, o conflito na Ucrânia, mesmo sendo tecnologicamente um campo de inovação militar, transformou algo tão “clássico” quanto engodos e ilusões ópticas em uma ferramenta estratégica de primeira ordem.

Eles não apenas permitem economizar recursos diante de um inimigo com grande capacidade de fogo, mas também abrem espaço para que a inovação civil (grupos de voluntários, oficinas improvisadas) se integre à defesa nacional. Tanto em terra quanto no ar, a guerra de imitação demonstra que, além da sofisticação das armas modernas, a imaginação continua sendo uma arma tão poderosa quanto qualquer míssil.

Imagem | Na Chasi, Apate, Back and Alive

Este texto foi traduzido/adaptado do site Xataka Espanha.


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