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O café enfrenta um futuro incerto. Então, uma empresa teve uma ideia: criar "café" sem um único grão de café

Há empresas ao redor do mundo criando café sem uma única pitada de café real.

Também estão experimentando com café molecular criado em laboratório.

Empresa tenta criar café sem grãos de café
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Sofia Bedeschi

Redatora

Jornalista com mais de 5 anos de experiência no ramo digital. Entusiasta pela cultura pop, games e claro: tecnologia, principalmente com novas experiências incluídas na rotina. 

Existem muitos motivos para beber café. Por um lado, temos o impulso de energia que uma xícara de café nos proporciona devido ao seu conteúdo de cafeína. Por outro, os benefícios para a saúde, algo que está sendo cada vez mais estudado e, ao derrubar mitos, nos permite entender sua influência em órgãos como os rins. E, evidentemente, há também o ritual de preparar o café — aqueles cinco ou dez minutos de paz mental em que estamos focados apenas na preparação.

No entanto, aos cafés tradicionais e às variedades especiais, em breve pode ser necessário adicionar um novo tipo de café: o café sem... café.

O motivo é que há empresas desenvolvendo esse café sem o grão, o que pode não apenas revolucionar a xícara diária, mas também impactar o meio ambiente e a própria indústria cafeeira.

Café alternativo

Nos últimos anos, alternativas aos alimentos tradicionais se tornaram populares. Temos o peixe sem peixe e a carne sem carne, ideais tanto para dietas veganas e vegetarianas quanto para aqueles com alergias ou intolerâncias. E, nesse mesmo cenário, está o café. A Atomo Coffee, uma startup, está há alguns anos tentando criar um café que, na verdade, não é café.

Em uma entrevista à Bloomberg em 2001, seus cofundadores afirmaram que gostavam de se ver como "a Tesla do café" e, basicamente, o que eles combinavam eram cascas de sementes de girassol e sementes de melancia, submetidas a um processo químico para produzir moléculas que imitam tanto o sabor quanto a sensação do café na boca. E com cafeína adicionada, claro.

Café em risco de extinção?

É fácil entender por que existem substitutos para produtos de origem animal, adoçantes alternativos e produtos lácteos sem lactose, mas... por que criar um café sem café?

Há alguns anos, surgiram relatórios que indicavam que 60% das variedades de café estavam em risco de extinção. Embora essa informação seja verdadeira, também foi alarmista. Isso porque esses 60% se referem ao café silvestre, que não é o que normalmente consumimos.

As variedades arábica e robusta são as mais populares (e por uma larga margem), sendo as mais cultivadas e não estão em extinção. Embora seja verdade que as mudanças climáticas podem deslocar as áreas de cultivo de café (como já estamos vendo na Europa), o café "tradicional" não está em risco de extinção. Pelo menos, por enquanto.

Preocupação com o meio ambiente

Embora a Atomo defenda motivos ambientais para o seu produto, como a economia de água e a redução das emissões poluentes na indústria do café, existe um problema inerente ao café: o desmatamento. Atualmente, isso é algo mais regulamentado —em alguns países—, mas em algumas grandes plantações, especialmente nas que não são de café de especialidade, o desmatamento tem avançado para dar lugar às plantações.

Um relatório da ONU concluiu que, desde 1990, o mundo perdeu 178 milhões de hectares de floresta, o equivalente a 3,5 vezes a área da Espanha, com um ritmo de perda de cerca de 10 milhões de hectares por ano. Esse desmatamento não ocorre apenas por causa do cultivo de café, mas o café está contribuindo para essa perda de florestas. Nas plantações de especialidade, onde o café cresce à sombra das árvores, isso não é um problema, mas no cultivo de café mais comercial, sim, é uma preocupação.

O processo

Andy Kleitsch e Jarret Stopforth (cofundadores da Atomo) afirmam que o resultado final é uma xícara de café comum, indistinguível de um café verdadeiro a olho nu. Isso é uma vantagem, claro. Outra é que, segundo a Atomo Coffee, a produção desse café sem grão gerou 93% menos emissões de poluentes e utilizou 94% menos água do que a produção de café tradicional. A receita não é algo simples de replicar em casa:

  1. As sementes de azofaito (uma fruta espanhola) são moídas em pedaços bem pequenos.
  2. Depois, elas ficam de molho em uma mistura secreta com frutose, sementes de girassol, sementes de ramão, proteína de ervilha, limão, goiaba, sementes de feno-grego e bicarbonato de sódio, entre outros ingredientes. Sim, são muitos ingredientes.
  3. Após algum tempo, a mistura é seca e diferentes níveis de calor são aplicados para criar sabores e aromas variados, como no processo de torrefação.
  4. Ingredientes adicionais são misturados —eles não especificam quais— e, por fim, é adicionada a cafeína sintética para que o teor de cafeína seja semelhante ao do café convencional.

Mas e o sabor?

Como a ciência não acontece sozinha, a equipe da BBC experimentou esse café sem café. Na fórmula mais atual, a Atomo usa sementes de azofaito, extrato de sementes de girassol e a onipresente proteína de ervilha. O resultado, segundo a jornalista Joey Corbin, que provou essa versão de café, é que "o sabor se assemelha ao de um bom café, no geral."

Isso, na verdade, não nos diz muito, mas uma coisa é evidente: não se trata de uma ideia maluca de dois empresários, e sim de uma indústria em crescimento. E o melhor é que não é necessário ter uma máquina especial, já que o café foi pensado para funcionar em máquinas com pressão entre 9 e 12 bares.

Uma indústria em ascensão

Na Europa, também há entusiastas do café sem café. Um exemplo é a startup holandesa Northern Wonder, que já comercializa seu produto em supermercados na Holanda e na Suíça. Eles usam ingredientes como tremoço, grão-de-bico, cevada e chicória, entre outros, embora a receita exata ainda seja mantida em segredo.

Além disso, as matérias-primas podem variar à medida que experimentam novos sabores. Outras empresas, como a Prefer, de Singapura, e a Minus, de São Francisco, também utilizam diferentes ingredientes e métodos. Inclusive, há uma possibilidade aberta para o café cultivado em laboratório. Nesse processo, células extraídas das plantas de café são cultivadas, fermentadas e torradas para produzir diretamente uma bebida pronta. No entanto, o "café celular" ainda está em fase de pesquisa e desenvolvimento.

Críticas e desafios

Atomo, com suas instalações na Califórnia e Seattle, produz cerca de 1.800 toneladas por ano.

Em comparação, a Starbucks compra aproximadamente 362.873.896 toneladas anualmente. Se o café de laboratório ou o café sem café se popularizar, há um temor de que as grandes e pequenas plantações sofram uma crise devido à diminuição da demanda. No entanto, tudo vai depender de como a população aceitará essa nova versão de café, já que não se trata apenas do sabor, mas também das suas propriedades para a saúde.

Além disso, o aroma do café recém-passado, algo tão característico, ainda não foi completamente reproduzido, conforme observado pela repórter da BBC. Atomo e Northern Wonder estão em busca de parceiros e investidores na indústria do café, já que sua produção ainda é limitada e comercializada em locais exclusivos.

Por exemplo, o café de Atomo pode ser encontrado em algumas cafeterias, ao preço de 20,99 dólares por meio quilo, valor um pouco superior aos 10-14 dólares cobrados pela mesma quantidade de café em uma cafeteria comum nos Estados Unidos.

A Atomo está otimista

Diante das mudanças climáticas, a empresa afirma que "todos os grandes produtores de café enfrentarão problemas de disponibilidade nos próximos 20 ou 30 anos". Por isso, eles estão tentando se antecipar à demanda futura das grandes empresas de café. Agora, só nos resta acompanhar e ver se essa nova mistura realmente vai ganhar espaço no mercado.

Imagem | Atomo

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