Se a Rússia invadisse a Inglaterra, um exercício provou que a terra do rei não ia se dar bem

O exercício não foi simplesmente um treinamento: foi um espelho que mostrou que a guerra moderna mudou e que eles estão perigosamente atrasados.

Imagem | Departamento de Defesa dos EUA
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Igor Gomes

Subeditor

Subeditor do Xataka Brasil. Jornalista há 15 anos, já trabalhou em jornais diários, revistas semanais e podcasts. Quando criança, desmontava os brinquedos para tentar entender como eles funcionavam e nunca conseguia montar de volta.

As simulações são uma parte essencial da estrutura de defesa nacional. Temos uma grande quantidade de exemplos, desde o "jogo" usado durante a Guerra Fria pelos Estados Unidos e pela Rússia para chegar à conclusão de que não valia a pena testar suas armas nucleares, até outros mais recentes, como a simulação realizada pela China para testar seu último destróier contra Washington, ou os ativados por Taiwan recentemente "por precaução". O Reino Unido também realizou um teste que deveria confirmar que seu arsenal está pronto para a batalha.

As conclusões não foram exatamente essas.

Uma lição brutal

A história aconteceu há algum tempo. Como dissemos, o Reino Unido realizou uma simulação estratégica de grande importância: replicou em seu próprio território aéreo o padrão exato do primeiro ataque russo à Ucrânia, ocorrido em 24 de fevereiro de 2022. Fê-lo por meio do sistema de treinamento Gladiator, avaliado em 24 milhões de libras, e com o objetivo de avaliar como suas defesas responderiam se o mesmo tipo de ataque tivesse como alvo solo britânico.

A conclusão foi alarmante. Embora os resultados não tenham sido revelados em detalhes, o então comandante do Centro de Treinamento Aéreo de Batalha Espacial, Comodoro do Ar Blythe Crawford, foi direto ao dizer que "não era um quadro bonito". Para um país que durante décadas se sentiu protegido por sua localização no extremo ocidental da Europa (com a massa terrestre atuando como uma proteção natural contra ameaças), o exercício foi um choque estratégico que destruiu velhas suposições

Uma ameaça que não está mais longe

Mais informações surgiram depois, principalmente que o exercício revelou a vulnerabilidade do Reino Unido a um ataque aéreo massivo e moderno como o que a Rússia usou contra a Ucrânia, com uma combinação devastadora de mísseis, drones e tecnologias autônomas. Crawford também enfatizou que a Ucrânia fez todo o Ocidente acordar. O conflito não apenas expôs a brutalidade dos primeiros ataques russos, mas também destacou como a guerra moderna transformou as regras do domínio aéreo, como temos relatado.

Crawford explicou que não se trata mais de alcançar a superioridade aérea em termos amplos e sustentados em todo um teatro de operações, mas sim de assumir que a supremacia pode ser fragmentada, efêmera, mesmo localizada entre duas trincheiras ou a poucos metros do solo. A guerra na Ucrânia, disse ele, é um campo de batalha sem precedentes entre dois países com poderosos sistemas integrados de defesa aérea, mas nenhum deles alcançou o controle completo dos céus, em contraste com a doutrina aérea predominante nas últimas décadas.

O enxame que se aproxima

Um dos pontos mais reveladores da intervenção de Crawford foi sua análise do uso massivo de drones na Ucrânia. Para o alto comando, não se trata mais apenas de dispositivos individuais: eles agora enfrentam enxames de centenas de unidades, muitas delas equipadas com explosivos, outras projetadas como chamarizes e outras simplesmente kamikazes.

Essas ondas, combinadas com foguetes e mísseis balísticos intercontinentais, criam um tipo de ameaça múltipla, simultânea e heterogênea para a qual os sistemas defensivos tradicionais foram projetados em cenários muito mais previsíveis. O dilema tático, em sua visão, é claro: "Todos os vetores de ataque devem ser neutralizados ou os mais letais devem ser priorizados?" Uma questão sem solução definitiva, mas que afeta todas as forças aéreas ocidentais.

Da força à vulnerabilidade

Uma das mensagens mais poderosas da simulação do Reino Unido foi a necessidade de mudar a mentalidade defensiva da nação e de seus aliados. Durante décadas, as guerras modernas foram travadas longe de casa, levando a uma percepção equivocada da segurança interna.

Por isso, o Comodoro alertou que é hora de abandonar essa confiança e aceitar que até mesmo as bases britânicas estão agora sob ameaça direta. Em outras palavras, o Reino Unido não pode ser considerado simplesmente um ponto de partida seguro para operações estrangeiras, mas deve ser considerado um alvo potencial e preparado adequadamente. O risco, na sua opinião, não é hipotético: se a Rússia decidisse lançar um ataque contra solo britânico, poderia fazê-lo através da sua Frota do Norte a partir do Atlântico, evitando assim o espaço aéreo europeu.

Redesenhando doutrinas

A última das etapas para lidar com os resultados da simulação. O caso ucraniano está reescrevendo doutrinas militares que durante gerações foram consideradas inquestionáveis. A noção de controle aéreo total, pedra angular da estratégia da OTAN desde a Guerra do Golfo, parece estar se desgastando devido a uma nova geração de ameaças que combinam velocidade, volume, imprevisibilidade e autonomia.

Para Crawford e muitos outros estrategistas, a chave é aprender rápido, aceitar que a situação atual (neste caso, a britânica) não é mais imune e repensar os sistemas de defesa como se o próximo ataque não fosse ocorrer em um país distante, mas em "casa".

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