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O roubo de túmulos já era um problema na Colômbia, mas agora há um pior: os violadores de túmulos influencers

A polícia recuperou 144 peças arqueológicas que estavam em posse de influenciadores que exibiam seus saques

Tesouros arqueológicos da Colômbia estão sendo saqueados por influencers violadores de tumbas / Imagem: Wikipedia
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Victor Bianchin

Redator

Victor Bianchin é jornalista.

Há um mês e meio, o Instituto Colombiano de Antropologia e História (ICANH) divulgou um comunicado para celebrar uma descoberta relevante para os pesquisadores que estudam a história do país: 114 peças arqueológicas, principalmente cerâmicas, encontradas no sul de Huila, na região andina. Até aí, nada de extraordinário. O curioso é que esses tesouros não foram encontrados por antropólogos nem arqueólogos, mas por agentes da Polícia Nacional e da Procuradoria-Geral da Nação. Tampouco foram extraídos de um antigo túmulo indígena, uma necrópole pré-hispânica ou uma caverna inexplorada. Não. As peças estavam nas casas de dois influenciadores.

Esse é o exemplo mais recente de um problema que preocupa as autoridades e os arqueólogos colombianos: a ascensão dos violadores de túmulos (chamados em espanhol de “guaqueros”) influenciadores.

De olho nas redes

O caso de Huila é apenas mais um exemplo de um fenômeno que chamou a atenção da imprensa colombiana e acendeu o alerta entre os defensores do patrimônio arqueológico do país: os saques de túmulo (“guaquería”) pelas redes sociais. Ou, dito de outra forma, pessoas que se dedicam a saquear jazidas e ostentam o processo e os resultados no TikTok ou em outras plataformas.

As autoridades se preocupam com o dano que esses criminosos podem causar ao patrimônio colombiano durante suas escavações, feitas de forma rudimentar e sem a supervisão de arqueólogos e antropólogos profissionais. Preocupam-se, sobretudo, com o alcance que eles encontram nas redes, o que lhes permite divulgar sua atividade e chamar a atenção de possíveis compradores ou seguidores dispostos a indicar a localização de outras jazidas.

A guaquería em si não é algo novo. O saque de túmulos indígenas em busca de tesouros pode remontar à época colonial, embora haja quem aponte que o auge da guaquería tenha ocorrido muito mais tarde, entre o final do século 19 e o início do século 20. Foi nesse período, aliás, que a busca por tesouros nas “guacas” (os túmulos dos antigos povos indígenas) se tornou uma atividade-chave para a economia de lugares como Quindío.

A história dos guaqueros é longa o suficiente para que seu enfoque, legado e repercussão tenham variado ao longo do tempo. Eles nem sempre buscavam o enriquecimento pessoal e, de certo modo, desempenharam um papel fundamental na história da arqueologia. “Se não tivessem existido no início do século 20, não teríamos San Agustín nem Teyuna”, afirmou recentemente ao El País Alhena Caicedo, do ICANH. “No começo, o que faziam era descobrir onde estavam os grandes sítios arqueológicos. No século 19, isso permitiu, entre outras coisas, o surgimento da arqueologia”.

O que é novo é que os guaqueros passem a utilizar plataformas como o TikTok para mostrar seu trabalho, compartilhar seus achados e divulgar uma atividade cujo impacto no patrimônio já vem sendo alertado por arqueólogos. O caso de Huila é um exemplo claro. Segundo o ICANH, os influenciadores dos quais foram apreendidas as 144 peças “promoviam o saque e o tráfico ilícito de bens arqueológicos” por meio de suas publicações. “Eles se gravavam danificando e saqueando os bens para depois divulgar o material publicamente”.

Em um artigo sobre o fenômeno publicado em março, o jornal El Tiempo fala em “centenas” de vídeos divulgados ao longo dos últimos anos, alguns com milhões de visualizações, o que mostra que o problema se espalhou por regiões como Antioquia, Huila, Caldas e Cundinamarca. E não para por aí. O jornal afirma que, entre 2020 e 2024, o ICANH identificou 13 contas (algumas com várias centenas de milhares de seguidores) relacionadas à guaquería.

“Um dano irreparável”

O fato de a imprensa e as autoridades estarem dando tanta atenção ao tema se explica por uma razão simples: os guaqueros ostentam as cerâmicas que encontram durante suas expedições, mas, ao extraí-las, costumam alterar uma fonte de informação valiosa para os especialistas. Afinal, os arqueólogos profissionais obtêm dados tanto das peças em si quanto do ambiente em que estão inseridas.

“O problema com a guaquería e a extração indevida é que as pessoas não sabem que, na verdade, o valor de cada peça não está apenas nela, mas principalmente no contexto em que se encontra”, destaca a diretora do ICANH.

“O saque de peças arqueológicas constitui um dano irreparável para a reconstrução e o entendimento do passado dos diferentes grupos humanos que ocuparam nosso território”, reforça o instituto colombiano. “Essa prática provoca perdas irreversíveis de informações únicas sobre os objetos arqueológicos e seus locais de origem”. A cada saque, ressaltam os especialistas, impõe-se um obstáculo ao estudo da sociedade, economia, religião e cultura dos povos indígenas.

Nos vídeos, é possível ver guaqueros manipulando vasos de barro, colares e até ossos — peças que podem perder parte de seu valor histórico se forem extraídas de forma rudimentar e sem a supervisão de profissionais. “Estamos perdendo dados sobre a história e os rituais dos povos indígenas que habitaram estas terras. Não se tratam apenas de objetos, mas de conhecimento sobre nossas raízes”, declarou Juan Pablo Ospina, coordenador do Grupo de Arqueologia do ICANH, em entrevista ao Diario del Huila.

Para além do impacto que possa ter para a história colombiana, o saque do patrimônio pode trazer consequências legais, como adverte o ICANH, que lembra que a Lei 397 de 1997 estabelece que as peças com valor arqueológico são “inalienáveis, imprescritíveis e inalienáveis”. “Sua alteração, manipulação indevida, comercialização ou exportação não autorizada pode gerar danos irreversíveis e acarretar sanções econômicas de até 500 salários mínimos legais mensais vigentes”, alerta o instituto colombiano.

Imagem | Wikipedia

Este texto foi traduzido/adaptado do site Xataka Espanha.

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