A guerra na Ucrânia entrou num estágio de saturação tática, onde o volume, ao invés da sofisticação, tornou-se a arma decisiva. A Rússia aumentou consideravelmente o uso de enxames de drones Shahed em território ucraniano sob o nome Geran, conseguindo penetrar as defesas ucranianas a uma velocidade sem precedentes. Um vídeo revelou o que está prestes a acontecer.
Guerra de enxames
O Financial Times lembrou que, segundo dados oficiais, entre abril e junho de 2025, a porcentagem de drones que conseguiram atingir seus alvos chegou a 15%, triplicando a taxa de sucesso dos três meses anteriores. Aos números: na noite de 9 de julho, foi estabelecido um recorde quando a Rússia lançou 728 drones Shahed e iscas, juntamente com mísseis balísticos Kinzhal e Iskander, em uma tentativa clara de saturar e sobrecarregar as defesas aéreas ucranianas.
A tática demonstrou que o uso massivo de plataformas baratas pode superar sistemas de defesa caros e sofisticados, expondo um ponto crítico: o desequilíbrio entre custo e eficácia no combate moderno.
Geran-3 e uma máquina letal
Os aprimoramentos técnicos introduzidos por Moscou em seus drones aumentaram significativamente sua eficácia. Entre eles está o Geran-3, uma aeronave turboalimentada capaz de atingir velocidades de até 800 km/h em mergulho, o que a torna quase invulnerável ao armamento antiaéreo tradicional montado em caminhões, como metralhadoras pesadas.
Além disso, o Shahed atual pode voar em altitudes mais elevadas, evitando as zonas de impacto ideais das defesas terrestres. Essa mudança, em vez de refletir um enfraquecimento ucraniano, demonstra a capacidade da Rússia de adaptar rapidamente sua doutrina de ataque e explorar as fraquezas do adversário. As persistentes ondas noturnas, combinadas com mísseis mais sofisticados, buscam desgastar não apenas as defesas técnicas da Ucrânia, mas também a moral da população e forçar concessões políticas por meio da exaustão.
Fábrica de horrores
É aqui que surge o mais recente anúncio da Rússia. Moscou revelou ao mundo o que descreve como sua maior e mais secreta fábrica de drones: o complexo industrial de Alabuga, na região do Tartaristão, onde são montados drones suicidas Geran. A fábrica, localizada no parque industrial de Yelabuga e inaugurada oficialmente em 2023, aparece num vídeo do canal militar russo Zvezda, que não economiza em mostrar adolescentes operando estações de trabalho e manipulando componentes tecnológicos em linhas de montagem.
De acordo com Timur Shagivaliev, diretor executivo da Zona Econômica Especial de Alabuga, a instalação aumentou sua produção planejada, atingindo uma taxa mensal de 5,2 mil unidades entre drones de ataque e modelos chamariz, o que a torna, segundo ele, "a maior fábrica do gênero no mundo". A cena é, no mínimo, intrigante: adolescentes construindo armas projetadas para matar a grandes distâncias, enquanto o Kremlin se gaba de uma capacidade de fabricação implacável.
Geran-2, mais barato
Se a terceira versão é a mais avançada, seu antecessor, a versão direta do Shahed-136 iraniano, é o principal drone da fábrica. Trata-se de um dispositivo de 3,5 metros com uma ogiva de 50 kg, velocidade de cruzeiro de 300 km/h e alcance de 1,8 mil km. Seu custo estimado entre US$ 35 mil e US$ 49 mil (entre R$ 193 mil e R$ 270 mil) o torna uma ferramenta acessível de destruição em massa, ideal para saturar sistemas defensivos inimigos.
Comparado a interceptadores ocidentais como o míssil Patriot (avaliado em vários milhões de dólares por unidade), o Geran-2 representa uma disrupção assimétrica: barato, resistente, fácil de produzir em massa e com efeito psicológico devastador.
Novo limiar estratégico
A indústria russa de drones, liderada pela fábrica de Alabuga, recebeu notícias que colocaram a Ucrânia em alerta. A Rússia se prepara para atingir uma capacidade de ataque sem precedentes: o lançamento simultâneo de 2 mil drones contra Kiev, segundo o general alemão Christian Freuding, chefe da força-tarefa do Ministério da Defesa da Alemanha para a Ucrânia.
Esse número, que redefine completamente a escala da guerra não tripulada, faz parte de uma expansão colossal do programa de drones da Rússia, que prevê a fabricação de 2 milhões de FPVs e 30 mil drones de longo alcance ou chamarizes até 2025, de acordo com relatórios da inteligência estrangeira ucraniana (SZRU).
Defesa superada
A Ucrânia, por sua vez, respondeu a todo esse aparato com uma combinação de técnicas clássicas (como os sistemas antiaéreos Oerlikon Skynex ou o bloqueio eletrônico contra o GPS dos Shaheds) e um impulso acelerado no desenvolvimento de sistemas de interconexão. Drones interceptores. Zelensky anunciou recentemente um acordo com Eric Schmidt, ex-CEO do Google e atual líder da Swift Beat, para a coprodução de centenas de milhares de drones, incluindo interceptadores.
De acordo com o presidente ucraniano, esses dispositivos já estão derrubando dezenas de Shaheds em cada ataque e começam a apresentar bons resultados, com centenas de abates confirmados em apenas uma semana. De qualquer forma, para serem eficazes contra o novo perfil de voo dos drones russos, esses interceptadores devem atingir velocidades de pelo menos 200 km/h e altitudes de até 6 km, capacidades que permitem conter os ataques de saturação que facilmente sobrecarregam as unidades móveis ucranianas armadas com tecnologia de meados do século XX.
Adaptação implacável
O cenário faz parte de uma dinâmica de evolução contínua entre ofensiva e defensiva: um ciclo de inovação e contrainovação que se acelera exponencialmente. Andrew Turner, ex-marechal do ar da Força Aérea Real e atual diretor da Saibre Capital, resumiu essa dinâmica no Times como uma "escada persistente de medidas e contramedidas que, na Ucrânia, se renova a cada 14 dias".
Assim, o conflito se tornou um laboratório acelerado de guerra aérea não tripulada, onde o fator decisivo não é mais o número de caças ou tanques, mas a capacidade de produzir e adaptar enxames de máquinas autônomas a uma velocidade maior do que a capacidade de resposta do inimigo.
Em suma, a guerra de drones na Ucrânia atingiu um novo nível de complexidade. Por um lado, a Rússia conseguiu integrar com sucesso volume, velocidade e saturação para criar uma ameaça constante que escapa aos esquemas tradicionais de defesa aérea. Por outro, a Ucrânia, com ajuda estrangeira, está começando a construir uma camada defensiva igualmente descentralizada e reativa baseada em drones interceptadores.
Neste confronto de enxames, a balança não é simplesmente influenciada pelo número de armas, mas pela velocidade com que cada lado aprende, se adapta e escala sua produção. O campo de batalha aéreo se transformou em competição industrial e algorítmica, onde software, manufatura distribuída e IA estão substituindo canhões e mísseis como ferramentas decisivas do poder militar.
Imagem | Zvezda/Rutube
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