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Em sua obsessão pelo futuro dos filhos, sul-coreanos estão começando a comprar ações da Tesla para eles

Como muitos desses pais "visionários" insinuam, nunca é cedo demais para aprender a investir no futuro

Imagem | Pexels
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PH Mota

Redator

Jornalista há 15 anos, teve uma infância analógica cada vez mais conquistada pelos charmes das novas tecnologias. Do videocassete ao streaming, do Windows 3.1 aos celulares cada vez menores.

Em janeiro, uma das notícias mais aguardadas da Coreia do Sul foi divulgada. Um pequeno vislumbre de esperança após anos de crise demográfica, ao ver como o país viu um número crescente, quebrando assim uma sequência de quase dez anos. Então, soubemos de ideias que buscavam aumentar ainda mais essa taxa de natalidade, como a oferta de carne "premium" para novas mães. Agora também sabemos que as crianças estão recebendo presentes dos pais. Mas não são brinquedos, são ações.

De bichos de pelúcia a pastas

Na Coreia do Sul, os presentes tradicionais para crianças (bonecas, consoles ou jogos) estão sendo substituídos por ações, uma tendência cada vez mais popular entre os pais que buscam plantar as sementes da educação financeira desde a infância. O que antes era território exclusivo de adultos experientes, hoje, segundo a imprensa local, está se espalhando entre menores que, com o consentimento dos pais, já possuem mais de 1,2 milhão de contas de investimento no país.

O Korean Times explicou casos como o de Lee, um funcionário de escritório de 45 anos que, há sete anos, presenteia o filho com ações no aniversário e no Dia das Crianças, personificando assim essa nova filosofia: construir um patrimônio desde cedo e transmitir conhecimento econômico por meio do exemplo. Embora a criança ainda prefira os cards de Pokémon dados pela mãe, a intenção do pai não é imediata, mas sim de longo prazo: familiarizá-la com conceitos como dividendos, propriedade de ações e crescimento composto, mesmo que por enquanto ela não os compreenda totalmente (ou nada).

Instrumentos e benefícios fiscais

Esse tipo de distopia tem muito mais a oferecer, já que os instrumentos favoritos dessa geração de investidores infantis são ETFs com altos dividendos, fundos que replicam índices como o S&P 500 e ações conhecidas como as da Samsung Electronics, Tesla, Nvidia ou Apple. Porque a estratégia não é apenas um interesse educacional, mas também uma vantagem fiscal: os pais podem transferir até 20 milhões de wons (cerca de R$ 89 mil) isentos de impostos por filho a cada década, o que torna esses presentes veículos eficientes para a transferência de ativos.

De acordo com um exemplo citado na mídia por um pai, um investimento inicial de 20 milhões de wons com retorno anual de 7% pode ser transformado em 70 milhões após 20 anos, sem tributar um único won. Essa previsão se alinha com uma visão cada vez mais arraigada de que o futuro econômico começa a ser construído não na idade adulta, mas nos primeiros anos de vida.

Adolescência e o despertar do mercado de ações

A tendência aparentemente começou a se espalhar até mesmo entre crianças e adolescentes, especialmente na faixa etária de 17 a 19 anos. Em uma pesquisa recente realizada pela Samsung Securities, 43% dos jovens afirmaram já possuir uma conta de investimento em seu nome e 58% afirmaram que planejam investir em ações em um futuro próximo.

Esse interesse juvenil contrasta com a tradicional falta de educação financeira entre os jovens de outros países e revela uma sociedade que, por meio da prática e do apoio dos pais, está reformulando sua relação com o dinheiro desde a base. Segundo Hwang Sei-woon, pesquisador do Instituto de Mercado de Capitais da Coreia, esse fenômeno apresenta baixo risco devido aos pequenos valores iniciais e à orientação de adultos, mas pode ter um alto impacto na educação financeira a longo prazo.

Seduzindo a infância

Diante desse surgimento de investidores precoces, corretoras de valores estão implementando campanhas voltadas diretamente para crianças e adolescentes. Como parte do Dia das Crianças, empresas como Mirae Asset Securities, Samsung Securities e Kiwoom Securities ofereceram recompensas financeiras, vales-presente e comissões reduzidas para menores que abrissem suas primeiras contas online.

A Kiwoom, que concentra mais de meio milhão dessas contas infantis, lançou até um canal educacional no YouTube para ensinar finanças básicas de forma didática. Todo um ecossistema que visa um objetivo estratégico: atrair o investidor desde o início para consolidar um relacionamento de longo prazo com o mercado.

Transcendendo o dinheiro. O KT afirmou que, em segundo plano, e para além da acumulação de riqueza, esse movimento representa uma transformação sociocultural: o dinheiro deixa de ser um assunto tabu entre pais e filhos e passa a fazer parte do diálogo diário. Numa distopia que poucos poderiam prever, dizer a uma criança que ela é acionista da Tesla ou que possui uma fração do S&P 500 não só a introduz à linguagem do capital, como aparentemente lhe oferece uma nova maneira de compreender seu lugar no mundo econômico.

Em uma sociedade historicamente orientada para a poupança e o esforço educacional, a Coreia do Sul parece estar encontrando novas maneiras de traduzir esses valores para o século XXI. O que costumava ser um envelope com notas agora pode ser uma fração de uma empresa, e o que antes era um brinquedo efêmero agora se torna uma ferramenta de treinamento financeiro.

A infância, perdendo parte de seu caráter lúdico ao longo do caminho, está, portanto, ligada a uma noção mais ampla de previsão. Porque, como esses pais "visionários" sugerem, nunca é cedo demais para aprender a investir no futuro.

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