Por que Vale do Silício está copiando a China? Modelo 996 está surgindo como nova tendência em empresas de tecnologia

Uma "cultura da correria" e do trabalho duro

Trabalhador cansado | Fonte: Getty Images
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Vika Rosa

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Vika Rosa

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Jornalista com mais de 5 anos de experiência, cobrindo os mais diversos temas. Apaixonada por ciência, tecnologia e games.


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O "996" não é uma fórmula matemática, mas a abreviação de um modelo de trabalho brutal: trabalhar das 9h da manhã às 21h da noite, seis dias por semana. Esse sistema nasceu no coração das gigantes de tecnologia da China, visto por anos como um símbolo de disciplina e produtividade extrema, mas que também levou a protestos, exaustão e até mortes. 

Embora a Suprema Corte chinesa tenha declarado o "996" ilegal em 2021, o modelo não desapareceu; ele apenas mudou de endereço.

Quatro anos após sua proibição na China, o fenômeno reapareceu com força no Vale do Silício. Impulsionadas pela acirrada corrida da inteligência artificial (IA) e por uma cultura de desempenho extremo, startups e executivos americanos começaram a adotar o "996" como um novo estilo de vida profissional, reacendendo o debate sobre os limites do trabalho na era digital.

A obsessão pela produtividade extrema

Segundo o The New York Times, empresas do setor de IA nos EUA já incluem jornadas superiores a 70 horas semanais em seus contratos. Publicações no LinkedIn glorificam a ideia de "trabalhar arduamente" como o único caminho para o sucesso. O que se vê é uma versão turbinada de algo que o Vale do Silício sempre teve: uma devoção quase religiosa ao trabalho, agora adaptada ao boom da IA.

Elon Musk, com seu lema de "trabalhar extremamente duro", tornou-se um símbolo desse novo ecossistema pós-pandemia, onde a autoexploração se disfarça de vocação.

Em um mercado onde cada avanço pode revolucionar a indústria, trabalhar mais horas virou sinônimo de comprometimento, e jornadas de doze horas com trabalho aos fins de semana estão se tornando a norma.

O lado sombrio da "cultura da correria"

Esse modelo, no entanto, não é para todos. A "cultura da correria" (ou hustle culture) inevitavelmente exclui pessoas com outras responsabilidades, como cuidados familiares, ou condições de vida diferentes. 

Ela reforça uma homogeneidade que a indústria de tecnologia carrega desde sua origem: um ambiente dominado por homens jovens e com disponibilidade total.

A ironia é evidente: o mesmo setor que promete automatizar tarefas e nos "liberar" tempo é o que agora normaliza jornadas de trabalho impossíveis. Enquanto a IA domina o discurso, o Vale do Silício parece ter adotado uma premissa antiga para competir: para vencer as máquinas, é preciso trabalhar como elas.

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