Você sabe quando, onde e com quem são os seus três próximos compromissos? E o número do telefone de quem mora com você? Se você perdesse o seu celular e tivesse que ligar para um dos seus pais, você conseguiria? Pode parecer um pouco bobo, mas esse tipo de vazio da memória é culpa do seu celular. Para a neurocientista Virgínia Chagas, o uso dos aparelhos está “atrofiando” a nossa memória. Ela explicou como a falta de uso desliga os circuitos do nosso cérebro na palestra S.O.S. Habilidade Memória e Aprendizagem no Rio2C na última quinta-feira (29/5) e que para evitar que a sua memória escorra como o feed de uma rede social basta alguns exercícios simples.
Aprender dá trabalho
Assim como os músculos, o cérebro também acaba se deteriorando caso não seja usado frequentemente. E desde a invenção do smartfone, nós temos exercitado cada vez menos a nossa memória. Isso faz com que sejamos cada vez menos capazes de lembrar conforme o tempo vai passando. Como uma doença degenerativa, mas com menos intensidade. Segundo Virgínia Chagas, isso se dá por culpa de como funciona o nosso cérebro. “As informações que nós aprendemos durante a vida precisam ser manipuladas de forma trabalhosa. Elas precisam ser repetidas várias vezes. Se o nosso cérebro não repete as informações, ele entende que ela não é relevante e as descarta”, afirmou.
Um estudo de 2008 apontou que alunos que tentavam lembrar a matéria sem consultar nenhum livro ou caderno antes de testes tinham desempenho melhor do que os que revisavam anotações sem tentar lembrar de cabeça antes. “Quanto mais a gente tenta lembrar, melhor o nosso cérebro fica”, explica Virgínia.
Uma falso alívio
Uma das causas para esse excesso de dependência de memórias externas, é o falso alívio tecnológico. Ter à nossa disposição aparelhos que podem lidar com a quantidade imensa de informação com as quais somos bombardeados o tempo todo faz com que os usemos e nosso cérebro fica estagnado. Isso faz com que entremos em um ciclo que colabora para diminuirmos o uso da nossa memória. “O cérebro não entende isso como um alívio, e sim como desuso. Consultar virou o padrão e lembrar, a excessão. Isso faz com que os nossos circuitos de memória se silenciem por falta de uso”, aponta a neurocientista.
Só basta ele estar presente
Nós já chegamos a um ponto em que não é necessário usar o celular para que ele afete a nossa memória. A simples presença do aparelho já é suficiente para que nosso desempenho em relembrar informações seja prejudicado. Em 2017, o pesquisador Andrew F. Ward, da Universidade do Texas, realizou um experimento para saber como o celular influenciava na memória dos usuários. Os participantes foram divididos em três grupos: quem deixou o celular na entrada do laboratório, quem levou o celular para a sala de testes e o manteve virado com a tela para baixo e o grupo que deixou a tela virada para cima. Os resultados mostraram que quem não levou o celular para o laboratório teve mais capacidade de se concentrar e resolver tarefas do que os grupos que mantiveram os aparelhos à vista, seja com a tela virada pra cima ou não.
Reserva Cognitiva
Mas nem tudo são más notícias. Mesmo com todo o estrago feito pelos aparelhos, ainda dá tempo de fazer a sua memória voltar a funcionar. O jeito é exercitar a memória para que ela não fique em desuso. Confira as quatro dicas que a A neurocientista dá para exercitar o cérebro:
- Evocar: se esforce para lembrar das coisas, principalmente das que você usaria o celular para não esquecer;
- Repetir: repetir é consolidar os circuitos do cérebro, é refinamento;
- Conectar: faça associações, relacione informações. Virgínia questiona: “hoje delegamos a associação de ideias para o ChatGPT. Mas se a gente delega à inteligência generativa a associação de ideias, e deixa de treinar nosso cérebro para isso, quem garante que a gente terá a capacidade de analisar bem as respostas que esse chat nos dá?”
- Aprender: incorporar o novo. “Isso deixa as conexões ativas para fazer novas associações”, explicou Virgínia
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