O campo magnético da Terra, nosso escudo invisível contra a radiação solar, está apresentando uma zona de fraqueza crescente sobre o Atlântico Sul. Conhecida como Anomalia do Atlântico Sul (AAS), essa falha no escudo se intensificou e expandiu na última década, aumentando os riscos para satélites, astronautas e infraestruturas espaciais.
Um novo estudo, baseado em dados da missão Swarm da Agência Espacial Europeia (ESA), mapeou com precisão o fenômeno. A pesquisa, liderada por Chris Finlay, da Universidade Técnica da Dinamarca, e publicada na Physics of the Earth and Planetary Interiors, mostra que o problema é real e está ligado a processos complexos no núcleo do planeta.
Uma anomalia em expansão
A missão Swarm, composta por três satélites lançados em 2013, revelou que, entre 2014 e 2025, a anomalia cresceu em cerca de 5 milhões de quilômetros quadrados — uma área equivalente à metade da superfície da Europa.
Nesta região, a intensidade do campo magnético despenca. O ponto mais fraco registrado atingiu 22.094 nanoteslas, muito abaixo da média global, que varia de 40.000 a 60.000 nanoteslas. Segundo os cientistas, essa fraqueza não é uniforme e tem se acelerado desde 2020, especialmente na parte oriental da anomalia, a sudoeste da África.
Embora instabilidades magnéticas sejam conhecidas nesta região há 11 milhões de anos, a velocidade da mudança atual é sem precedentes na escala humana.
O perigo para satélites e astronautas
A consequência mais direta desse enfraquecimento é o aumento da exposição à radiação cósmica e às partículas solares em órbitas baixas (entre 400 e 1000 km de altitude).
- Satélites: ao atravessar a AAS, os satélites ficam vulneráveis a doses críticas de radiação. Isso pode causar falhas eletrônicas, perda de dados e danos irreparáveis aos componentes. Instrumentos de comunicação e observação são os mais afetados, e falhas desse tipo já foram registradas.
- Astronautas: a Estação Espacial Internacional (ISS) atravessa regularmente a anomalia. Embora as missões sejam temporárias, a exposição repetida dos astronautas a esses níveis de radiação aumenta os riscos de danos celulares e de desenvolvimento de cânceres.
Para mitigar os riscos, as agências espaciais precisam "endurecer" seus equipamentos, tornando-os mais resistentes à radiação — um processo que tem um custo tecnológico e econômico elevado.
O que acontece nas profundezas da Terra
A anomalia na superfície é um reflexo do que ocorre a 3.000 km de profundidade, no núcleo externo da Terra. O campo magnético é gerado pelo movimento do ferro líquido nessa região, que funciona como um dínamo natural.
Na área da anomalia, os pesquisadores identificaram "manchas de fluxo reverso", onde o campo magnético, em vez de sair do núcleo, está retornando para ele. Essa perturbação local enfraquece o escudo global. Apesar desse enfraquecimento regional, os cientistas afirmam que não há sinais de uma inversão magnética global (quando os polos Norte e Sul trocam de lugar) acontecendo a curto prazo.
Os dados da missão Swarm também mostram que o campo magnético está se tornando mais assimétrico. Enquanto o "ponto forte" sobre o Canadá enfraqueceu, o ponto sobre a Sibéria se fortaleceu. Essa mudança ajuda a explicar por que o Polo Norte magnético está se movendo rapidamente em direção à Sibéria, um fenômeno que exige atualizações constantes em sistemas de navegação, como GPS e aviação.
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