Ver o interior de um reator de fusão nuclear é, por razões óbvias, complicado. Estamos falando de temperaturas de milhões de graus Celsius, mais quentes que o núcleo do Sol. No entanto, a empresa britânica Tokamak Energy acaba de nos presentear com imagens inéditas do que acontece dentro do seu reator esférico ST40: um vídeo em cores na incrível velocidade de 16 mil quadros por segundo.
O que vemos no vídeo é, em essência, a coreografia dos elementos dentro do tokamak. O ST40, como a maioria desses reatores, usa isótopos de hidrogênio (deutério, neste caso) como combustível. Quando esse gás se transforma em plasma, emite uma luz rosa característica, que domina a cena. Mas o interessante começa quando os pesquisadores introduzem lítio, que brilha em vermelho.
E isso tudo não se resume a apenas um espetáculo visual. Cada cor, cada filamento brilhante nas imagens é uma mina de ouro de informações que está ajudando os cientistas a resolver um dos maiores desafios no longo caminho para a energia de fusão comercial: como controlar o plasma para que ele não degrade os materiais do reator.
O que exatamente estamos vendo?
Nas imagens, vemos pequenos grânulos de lítio sendo injetados na câmara do reator. Ao entrar nas áreas externas e mais frias do plasma, o lítio neutro se excita e emite uma intensa luz vermelho-carmesim. Ao penetrarem nas regiões mais quentes e densas, os átomos de lítio perdem um elétron, ionizam-se (tornando-se íons de lítio) e começam a emitir uma luz esverdeada.
Uma vez ionizado, o lítio deixa de se mover livremente. Ele é forçado a seguir as linhas invisíveis, porém muito poderosas, do campo magnético que confina o plasma. Os filamentos verdes que vemos se movimentando no vídeo são, literalmente, o lítio atraindo a gaiola magnética do reator.
O lítio atua como um escudo protetor para o reator. Registrar o que acontece em cores não é fácil, mas ajuda a identificar se as impurezas que a Totakak Energy está introduzindo no equipamento irradiam no local esperado e se os pós de lítio penetram até o núcleo do plasma.
Este experimento faz parte de uma pesquisa sobre um modo de operação chamado "radiador de ponto X" (XPR), que utiliza elementos como o lítio para fazer com que a borda do plasma irradie e perca uma grande quantidade de calor antes de atingir as paredes do reator. Trata-se de uma "atmosfera" protetora que resfria o plasma no último instante, reduzindo o desgaste dos componentes sem comprometer o desempenho do núcleo.
O progresso da energia Tokamak
Essa abordagem é a peça central do programa de modernização do Dell ST40, que recebeu financiamento dos departamentos de energia dos EUA e do Reino Unido. O objetivo é revestir todos os componentes que entram em contato com o plasma com lítio, uma técnica já demonstrada em outros laboratórios, como o de Princeton, para melhorar o desempenho do plasma.
Esse tipo de diagnóstico visual complementa os sistemas incrivelmente complexos que estão sendo instalados em reatores como o JT-60SA no Japão, o tokamak mais avançado do mundo atualmente, que utiliza lasers para medir indiretamente a temperatura e a densidade do plasma.
Enquanto projetos colossais e institucionais como o ITER traçam um caminho de longo prazo, prevendo seus primeiros experimentos com deutério-trítio até 2039, empresas mais ágeis como a Tokamak Energy exploram novos designs e tecnologias, como tokamaks esféricos e ímãs supercondutores de alta temperatura, para acelerar a chegada da fusão nuclear comercial.
O fechamento do histórico reator JET no Reino Unido, que se despediu com um recorde de energia, marcou o fim de uma era, mas seu legado é a base sobre a qual todos esses novos avanços são construídos. Essa nova janela para o coração do plasma não é apenas visualmente deslumbrante, é um pequeno passo que nos aproxima um pouco mais do objetivo de replicar a energia das estrelas na Terra. A fusão nuclear ficou muito mais interessante, e isso é uma ótima notícia.
Imagem | Tokamak Energy
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