Eles queriam comédias, mas a tela mostra trincheiras: como a guerra "sequestrou" a cultura da Ucrânia

A guerra transformou a produção cultural da Ucrânia que, agora, é marcada pela dor, pela mobilização e resistência nacional

Cartazes na Ucrânia. Créditos: 	Artem Hvozdkov//gettyImages
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Laura Vieira

Redatora
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Laura Vieira

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Jornalista recém-formada, com experiência no Tribunal de Justiça, Alerj, jornal O Dia e como redatora em sites sobre pets e gastronomia. Gosta de ler, assistir filmes e séries e já passou boas horas construindo casas no The Sims.

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Existem vários serviços essenciais para o funcionamento de uma sociedade, como saúde, educação e trabalho. Mas no meio disso tudo, muitas vezes se esquece que a cultura também é fundamental. Ela entretém, constrói identidades, transmite valores e ajuda as pessoas a lidar com suas próprias histórias. Em tempos de paz, espera-se que a cultura ofereça um respiro, seja com uma comédia leve, uma música para aliviar o dia ou uma peça para distrair o pensamento. Na Ucrânia, porém, quatro anos após a invasão da Rússia à seu território, essa expectativa se transformou. A guerra invadiu a produção artística, agora marcada por narrativas de conflitos que documentam a difícil realidade enfrentada pela população.

Entenda como a guerra redefiniu a produção cultural ucraniana

Quando a guerra entre Ucrânia e Rússia começou em 2022, todo o setor cultural do país foi interrompido. Cinemas fecharam, teatros foram usados como abrigos e muitos profissionais da área se tornaram voluntários, deslocados de guerra ou soldados. A retomada das produções artísticas ocorreu meses depois, mas em condições totalmente diferentes das anteriores à invasão.

Em Kiev, capital e cidade mais populosa da Ucrânia, essa mudança é nítida nas ruas. Os muros da cidade abrigam tanto cartazes pedindo doações para unidades militares, quanto cartazes com divulgações de filmes, peças e exposições da guerra. Produções que antes buscavam entretenimento, agora tratam diretamente sobre o conflito.

Cemitério com bandeiras ucranianas. Estima-se que a guerra tenha vitimado entre 60 e 100 mil soldados ucranianos, de acordo com o Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais. Créditos: Iryna Olkhova/GettyImages

O documentário “2000 metros até Andriivka”, de 2025,  é um exemplo disso. Dirigido por Mstyslav Chernov, o filme coloca o telespectador dentro das trincheiras, ao lado de soldados ucranianos que lutam para recuperar o território. As sessões terminam em silêncio, reflexo de espectadores que reconhecem no filme histórias de amigos mortos ou de familiares ainda no front. Para muitas famílias, esses filmes funcionam como registro histórico e forma de manter viva a memória de parentes mortos. Mas, por outro lado, Mas, por outro lado, o cenário de guerra reduz o espaço para produções leves, como comédias, romances e filmes com final feliz.

Do cinema ao teatro: por que a arte virou espaço de memória e mobilização?

Musicais, óperas e outros formatos ligados ao entretenimento também foram adaptados devido à guerra. A Ópera de Kiev lançou Patriot, uma ópera rock que revisita eventos recentes, da Revolução de Maidan aos combates atuais. O espetáculo inclui gestos simbólicos, como uma personagem rasgando o retrato de Vladimir Putin, o presidente da Rússia, reforçando o uso do palco e da cultura como um espaço de posicionamento político. Nas artes visuais, o foco também está no registro do conflito. Exposições fotográficas mostram destruição, deslocamentos e mortes.

Essas produções que retratam o cenário de guerra vivido pela Ucrânia reforçam a identidade nacional e lembram que o país permanece sob ataque russo. A pressão para incluir finais otimistas é frequente, mas muitos diretores rejeitam essa saída, argumentando que uma narrativa leve não condiz com a realidade do país.

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