EUA e a China compartilham mesma ambição industrial, a diferença é que o gigante asiático tem uma vantagem fundamental

  • Gigante asiático não compete mais apenas com mão de obra: está implantando robôs e sistemas de IA.

  • EUA estão tentando reconstruir sua capacidade de produção, mas enfrentam inúmeros desafios

Imagens | Homa Appliances, Xataka com Gemini 3
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PH Mota

Redator
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Jornalista há 15 anos, teve uma infância analógica cada vez mais conquistada pelos charmes das novas tecnologias. Do videocassete ao streaming, do Windows 3.1 aos celulares cada vez menores.

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Durante anos, verificar a etiqueta de qualquer dispositivo, peça de roupa ou carregador era quase uma formalidade. A resposta era geralmente a mesma: “Made in China”. Essa frase tornou-se a prova silenciosa de que o gigante asiático havia conseguido se estabelecer como a fábrica do mundo.

De celulares de marcas americanas a pequenos componentes de eletrodomésticos europeus, grande parte do que usamos diariamente vem de linhas de produção chinesas, mas essa realidade está começando a mudar. A liderança industrial da China não se sustenta mais apenas na abundância de mão de obra e nos baixos custos, e o modelo que dominou as últimas décadas precisa ser transformado.

A mudança não é apenas econômica, mas também social. Cada vez menos jovens chineses querem trabalhar em fábricas, um fenômeno que segue padrões semelhantes nos Estados Unidos: trabalhos fisicamente exigentes, longas jornadas e perspectivas de carreira limitadas. Em ambos os casos, a indústria deixou de ser sinônimo de progresso para muitos e é vista mais como um destino do qual se deve escapar.

Mesmo assim, tanto a China quanto os Estados Unidos consideram a indústria manufatureira estratégica, seja para manter a influência global ou para reduzir a dependência de países estrangeiros. Tudo indica que nenhum dos dois países está tentando reviver o modelo antigo, mas sim construir um novo baseado em automação e inteligência artificial.

Robôs e fábricas para evitar a perda do "Made in China"

Quando o vice-ministro da Indústria da China, Zhang Yunming, afirmou que a adoção da inteligência artificial é uma tarefa necessária, e não opcional, ele não se referia apenas a termos tecnológicos. Ele estava falando sobre a proteção de um dos maiores ativos do país: sua indústria manufatureira, que representa cerca de 25% da economia nacional, bem acima da média global.

A China continua sendo o maior produtor mundial, mas não pode mais depender apenas do volume ou da mão de obra. O desafio agora é manter essa liderança produzindo com menos pessoas e mais inteligência artificial.

Nesse contexto, o país está respondendo de forma decisiva. O ritmo com que está implantando robôs industriais é incomparável. Somente no ano passado, instalou 295 mil unidades, quase nove vezes mais do que os Estados Unidos e mais do que o resto do mundo combinado, segundo a Federação Internacional de Robótica. Algumas instalações já estão sendo chamadas de "fábricas escuras" — operações tão automatizadas que as fábricas podem funcionar com mínima intervenção humana.

O Wall Street Journal cita o caso da Baosteel, uma das maiores siderúrgicas do país, onde os operadores intervêm apenas a cada meia hora, em comparação com a intervenção a cada três minutos anteriormente.

A automação não se resume mais a braços robóticos repetindo movimentos, mas sim a fábricas interconectadas capazes de tomar decisões. O jornal destaca como a Midea utiliza um sistema de IA que coordena robôs, sensores e agentes virtuais para detectar falhas, atribuir tarefas e ajustar processos sem intervenção humana. Na indústria têxtil, a Bosideng emprega modelos de IA desenvolvidos em parceria com a Universidade de Zhejiang para conceber e desenhar peças de vestuário, reduzindo o tempo de desenvolvimento e os custos.

Esses tipos de soluções não apenas aceleram a produção, como também criam uma vantagem competitiva sobre os fabricantes ocidentais, que implementam mudanças mais lentamente.

Fábrica

A ambição industrial da China também é claramente evidente em seus portos. Em Tianjin, uma frota de caminhões autônomos movimenta contêineres sem qualquer presença humana visível, enquanto a inteligência artificial otimiza variáveis ​​como horários de chegada de navios e capacidade de guindastes. O sistema, chamado OptVerse AI Solver, reduziu tarefas de planejamento que antes levavam 24 horas para cerca de dez minutos. O PortGPT, um sistema desenvolvido em conjunto com a Huawei para analisar imagens e monitorar operações de segurança, também foi implantado.

O discurso americano se baseia na ideia de soberania: produzir mais internamente para reduzir a dependência de países estrangeiros. O governo Trump seguiu essa estratégia por meio de tarifas sobre a China, o Vietnã e outras economias asiáticas, visando atrair fábricas e reconstruir as cadeias de suprimentos.

O Secretário de Comércio, Howard Lutnick, argumenta que a automação não é incompatível com o emprego, mas pode, ao contrário, gerar profissões técnicas mais bem remuneradas. Em uma entrevista, ele afirmou que "é hora de treinar pessoas para os empregos do futuro, não para os empregos do passado" e assegurou que essas fábricas poderiam sustentar famílias por gerações.

A diferença entre os dois modelos é claramente visível nos portos. Enquanto a China implementou caminhões autônomos, sistemas de planejamento baseados em IA e ferramentas como o PortGPT sem grande oposição dos sindicatos, nos Estados Unidos a automação está sujeita à negociação coletiva. A Associação Internacional de Estivadores e as operadoras portuárias concordaram em proibir novos terminais automatizados até o final de 2030, limitando também o uso de inteligência artificial em tarefas administrativas. Para os sindicatos, a automação significa perda de empregos e poder de negociação. Para a China, é uma estratégia nacional.

Não se trata mais de mão de obra barata, mas de fábricas capazes de produzir mais com menos pessoas e mais inteligência artificial. Os Estados Unidos estão trilhando seu próprio caminho, com regulamentações trabalhistas mais rigorosas e um ritmo diferente, mas com o mesmo objetivo de não depender de outros países.

O que está em jogo não é apenas onde a manufatura acontece, mas como ela acontece. É possível que, daqui a alguns anos, o rótulo que veremos não seja apenas "Made in China", mas sim uma forma diferente de produção, onde os robôs não sejam mais acessórios, mas sim peças-chave.

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